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Sempre tem algo que você possa fazer para aumentar sua envergadura de conhecimentos. Maneja e cortar bambu pode ser uma grande experiência nesse sentido. Os japoneses são em grande parte muito bons em conservação de solo. Fim de semana passada estive em um sítio o de o bambu mossa, foi utilizado para conter erosão e manter a água preservada.
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O trabalho da agrofloresta continua no Sítio Terra Viva de Gaia, cada dia um desafio, cada dia uma novidade. O tempo da agroecologia muda numa dinamica quase imprevisível.
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Em tempos frios e secos a geada que queima as folhas e amarela o verde, trás um aperto e também a serenidade de confiar na natureza. A de se recuperar. E só esperar. E confia.
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Essa semana foi difícil por aqui. Registramos -5°C em Vacaria, na paisagem fica lindo. Mas as coisas do dia a dia ficam mais difíceis.
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😁Asa Agroflorestal seguindo com os trabalhos de "construção" de solo, aumentando a biodiversidade e capacidade de retenção de água e resfriado nossa atmosfera com o auxílio da fotossíntese.
ASA - Agricultura Sintrópica e Agroflorestal 🌳🌱🌳
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Cozinha de cob e quarto com sala, banheiro de adobe com laje. Saneamento com BET e círculo de bananeiras
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URUCUMACUÃ BY H.H.ENTRINGER PEREIRA - LIVRO 2 CAP. 57
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FINAL DA HISTÓRIA DA MULA TÁ Enquanto o bruxo proclamava suas intenções de fidelidade ao Rei Mor, Mago Natu se afastou para recuperar a joia de camafeus da Rainha Gônia, ao passo que o imperador, Rei Médium, dirigindo-se ao Salão da Rainha, encontrou a mulher e amiga Rainha Alimpa, ouvindo Rainha Araci concluir a história do enforcamento do seu tio-avô, Rei Albe, o Rico. Polidamente, o Imperador Médium interferiu na conversa: — Desculpai-me se vos interrompo — e justificou-se —, julguei que já tivésseis concluído. — Não te preocupes – tranquilizou-o a Imperatriz – estávamos mesmo querendo chamar-te para escutar o final do caso. Lembro-me de que disseste que ainda não conhecias a história completa... — Verdade – aquiesceu o imperador. — Então – atalhou, eufórica, a Rainha Alimpa – aproveitemos para ouvir juntos. Continue, Araci... falávamos de quando o Rei Albe se surpreendeu com a transformação da Mula Tá numa mulher encantadora... — Bem — prosseguiu Rainha Araci —, a Rainha Alzira chegou de viagem mais ou menos um ano após o acontecimento no Bosque do Iludido, lá no Claro da Gemedeira, debaixo da figueira-do-inferno. — Ah, conta... Conta essa parte. Eu já conheço alguma coisa da história, depois, quando Calico, rapazote, engravidou a moça Alba, filha da criação do Rei Albe, mãe do menino Mulato. É mesmo verdade que ele nasceu com os pés tortos, arredondados, sem dedinhos, iguais aos da mãe Alba, que logo após o parto morreu e se encantou na ave Albatroz? – quis saber o imperador, Rei Médium. — Para mim, de toda a história, essa parte é a mais dolorosa e comovente — acrescentou a Rainha Araci. – Tenho muito afeto pelo menino Mulato e sinto que ele parece muito feliz e alegre, embora seja mudo também igual à sua mãe. É bem-afeiçoado a mim, porque me casei com o Rei Naldo, seu pai. O Rei Naldo também tem por ele muita estima, trata-o como filho legítimo, ainda que a gente desconfie de que talvez ele nem seja filho de Calico, mas do Conde Rasku, por alguns traços de sua fisionomia. — Quantos anos tem Mulato atualmente? – interrompeu Rainha Alimpa. — Mulato está agora com sete anos, trabalha como um serviçal qualquer, apesar de garoto. É muito dedicado no cuidado dos animais e parece ter um jeito diferente de entendê-los. A Rainha Alzira também o quer muito bem e sempre o protege. Trata o Mulato como a um neto legítimo, apesar de ele ser mudo ... igualzinho à mãe dele, a Alba, que não conheci pessoalmente. Rainha Alzira pintou um retrato dela, que está na galeria do Palácio das Esmeraldas, antes que se transformasse na ave Albatroz. Rainha Alimpa, não se contendo, implorou: — Por favor, conte logo o que ainda falta, porque daqui a pouco a Rainha Gônia deverá se preparar para o banquete e nós também. Essa história é realmente extraordinária. 232H. H. Entringer Pereira Rainha Araci descreveu ainda tudo o que conhecia da sequência dos fatos. Porém deteve-se na parte do nascimento do Conde Rasku, pois o assunto da segunda gravidez da Rainha Alzira era mais que reservado e ela mesma nunca falava do nascimento do menino, que ocorrera exatamente nove meses após o enforcamento do Rei Albe, o Rico. Circulavam rumores levantando suspeitas de que o menino Rasku, talvez, não fosse filho legítimo. Rei Naldo também questionara a mãe sobre a real paternidade de Rasku. Ela ratificava o que sempre afirmara antes: ele era seu irmão e ponto final. Desde pequeno, o menino Rasku demonstrava inclinações para a perversidade, muitas vezes comparadas às atrocidades dos algozes. De temperamento odiento, caráter extremamente vaidoso, sórdido e de malíssima índole, despertava, em contrapartida, o muito da admiração que atraía sobre si pela incomparável beleza do rosto e de sua compleição física. Homem de pele amorenada, de grande porte, farta cabeleira de cachos castanho-dourado, penteados para trás, à moda dos heroicos cavaleiros, barba por fazer e bigodes aparados, olhos da cor de mel, amendoados, sob espessas sobrancelhas, era o mais belo exemplar masculino que pontuava pelos salões reais nas habituais festas e comemorações. Ao lado do Príncipe Naldo, que se destacava pelas virtudes de bom moço, em Rasku era a beleza que se notabilizava, da qual ele galantemente usufruía na conquista fortuita de muitas e nobres damas, a maioria mais velhas que ele, pois as virgens casadouras afastavam-se prudentemente de sua lábia sedutora, advertidas de suas históricas tendências de conquistador incorrigível e das suspeitas de que estuprava donzelas com o mesmo prazer com que caçava coelhos. Ainda que muitos de seus atos sinistros e criminosos ficassem irremediavelmente impunes pela astúcia e sagacidade com que os encobria, sempre arrumava terceiros a quem impingir a culpa. Sua mais notória e conhecida proeza desde que estuprou a moçoila Alba Esmeralda, criada pela Rainha Alzira cuidadosamente tal como sua irmã, foi simular a autoria do violento abuso ao irmão Calico, porque Alba era muda, não se expressava, e seu irmão, Príncipe Naldo, o Calico, ingenuamente se deixou flagrar deitado nos aposentos junto de Alba, resultando, nove luas após, no nascimento do menino que creditaram a paternidade a Calico, ainda que quem tenha estuprado Alba, em verdade, tenha sido o sedutor, sagaz e abominável Rasku. Atrocidades com animais pequenos, gatos e cães, principalmente, eram suas diversões favoritas. Aos gatos, se comprazia furar-lhes os olhos, e aos cães castrá-los, quando os encontrava naturalmente atrelados às cadelas, no ato da procriação. Gostava de ele mesmo aplicar os castigos aos serviçais do Palácio, comprazendo-se em açoitá-los por alguma desobediência ou descumprimento às ordens da Rainha Alzira. Não raro era chamado a atenção pela mãe sobre os excessos com que manuseava o látego, ultrapassando os limites da correção prescrita. Ao simples chamado de sua pessoa para aplicar algum corretivo, era motivo suficiente a que o supliciado ao açoite implorasse: — Por piedade, não venha cá, Rasku! Sua impiedade alcançava extremos que, à repetida menção de não venha cá, Rasku, atribuíram-lhe o epíteto de Carrasco. 233H. H. Entringer Pereira No dia do casamento do Príncipe Calico, na mesma oportunidade em que a Rainha Alzira abdicou em seu favor o Trono do Reinado de Avilhanas, presenteou o Príncipe Rasku, como herdade, com uma grande extensão de terras, entregando-lhe o título de Conde, criando assim o Condado de Rasku. Insatisfeito por se achar merecedor de mais do que estava recebendo, pelo ódio que nutria ao irmão e pelo desejo de desonrar sua noiva, a Princesa Araci, futura rainha, antes do cerimonial do casamento, Rasku se ausentou. Sem que percebessem, escondeu-se nos aposentos da futura rainha. Quando subiu à sua alcova para preparar-se ao cerimonial do casamento, sorrateiramente foi agarrada por Conde Rasku, que tentou estuprá-la, a fim de que, desonrada, fosse rejeitada como esposa pelo irmão Naldo, o futuro rei. A Princesa Araci, moça forte e destemida, aplicou-lhe uma joelhada certeira nas partes baixas, cravando-lhe tão profundamente as unhas nas faces que lhe produziu uma cicatriz, que o acompanharia até a morte. Maculando a beleza de seu jovem rosto com os vincos perpétuos, ficou com o rosto marcado pela lembrança de sua desumana e cruel lascívia. Foi a única vez em que não conseguiu perpetrar seu intento criminoso, flagrado no quarto pelos gritos desesperados da futura rainha, ficando daí por diante apelidado de Rasku-unhado, ou Ku-unhado da Rainha Araci, depois, denominado por ela mesma de Conde Rasku-unho
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URUCUMACUÃ BY H.H.ENTRINGER PEREIRA LIVRO 2 CAPÍTULO 56
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O FEITIÇO DAS TRANSFORMAÇÕES Minutos depois que o Imperador, a Imperatriz e o Mago Natu entraram no grande salão de diversões do Palácio Fortaleza, onde a Rainha Alimpa e o Grande Rei jogavam animada partida de gamão, sobre um luxuoso estojo tabuleiro, ornamentado de madrepérola e jade, ouviu-se um estrondoso burburinho vindo do pátio externo. Rainha Alimpa se desconcentrou e o Grande Rei, num lance magistral, retirou todas as peças do tabuleiro. Inconformada com suas constantes e fragorosas derrotas para o Grande Rei, seu melhor e mais poderoso adversário, levantou-se, inconformada, voltou as costas ao tabuleiro e disse, desconcertada: — Revoltante! Esse jogo sempre conspira contra quem estava com mais sorte! O Grande Rei sorriu de seu amadorismo, emendando: — Não é o jogo que conspira contra quem estava com sorte. É a sorte que conspira contra quem estava jogando! Colocando uma a uma as peças de volta ao estojo, dobrou o tabuleiro, fechou-o e devolveu ao Rei Médium. O tumulto instantaneamente formado pela aglomeração dos convidados fez com que o Grande Rei, a Rainha Alimpa, o Imperador, a Imperatriz e o Mago Natu saíssem para saber o que ocorria. Não se admiraram, porque imaginavam que o burburinho e a desordem aparente fossem remanescentes das comemorações pela vitória dos príncipes da corrida Numpésó. Todavia, em meio à algazarra, alguns reis, rainhas e filhos estavam aos prantos. O arauto real, abrindo caminho em meio a aglomeração, adiantou-se, chegando aflito e ofegante ao Imperador: — Senhor Imperador, uma desgraça inusitada aconteceu. Peço-vos que convoque Rei Kórnio e Rainha Bisca, Rei Mende e Rainha Trapa, Rei Boio e Rainha Ália, Rei Negro Norato e Rainha Zomba. Eles deverão relatar pessoalmente o ocorrido. — Assim farei – disse o Imperador – fiquem tranquilos. Grande Rei, Mago Natu, por gentileza, me aguardem na Sala da Rainha. Dirigindo-se aos hóspedes, o Imperador os conclamou: — Por gentileza, amigos, acalmem-se. Depois de mencionar os nomes citados pelo arauto real, chamou-os à Sala da Rainha: — Acompanhem-me ao Salão da Imperatriz. Precisamos ver Gônia. No salão da Imperatriz, os quatro reis e as quatro rainhas, emudecidos, cabisbaixos, muito aflitos, pareciam desnorteados. O Imperador e sua mulher, assistidos pelo Grande Rei e pelo Mago Natu, mantinham-se serenos, até que o Rei Médium perguntou: — Quem deseja falar primeiro? — Eu, senhor Imperador – pronunciou-se Rei Kórnio. — O que aconteceu? – quis saber a Imperatriz. — Meu filho, Príncipe Surubim, o Ur, virou um peixe. — Um peixe? – falaram juntos o Imperador e a Imperatriz. – Como assim? 216H. H. Entringer Pereira — E o meu filho também, senhor Imperador – adiantou-se Rei Boio – meu filho, o Príncipe Pintado, também virou um peixe. — E também a minha filha, a Princesa Kachara – lamentou-se a Rainha Zomba, banhada de lágrimas. Perdendo a calma, o Rei Negro Norato, marido da Rainha Zomba, muito enfurecido, acusava o Príncipe Andy, o “Y”, por toda aquela tragédia: — Tudo por causa daquele maldito. Tudo por causa da joia da tua Tia Ara, Rainha Gônia! Foi ele, o “Y” quem roubou aquela maldita joia e levou para o Bruxo Neno enfeitiçar. Tudo por causa também daqueles malditos sabonetes. Ouvindo as acusações do Rei Negro Norato, a Imperatriz interessou-se e pediu que o ele prosseguisse relatando o que sabia. — Depois que os prêmios foram entregues aos vencedores da Corrida Numpéssó – prosseguiu o Rei Negro Norato, suando frio, espumando pelo canto da boca, enquanto os outros ouviam calados – o Príncipe Surubim, o “Ur”, e o Príncipe Pintado chamaram minha filha Kachara para ir ao Poço dos Desejos e das Transformações. Queriam se banhar e usar as Barra Alimpa presentadas pela Rainha de Sabom. Princesa Kachara foi com nossa permissão. Mas ficamos vigiando e acompanhando de longe o que eles fariam. Vimos quando se molharam e começaram a passar os sabonetes uns nos outros. Começaram a gostar da brincadeira e, inocentemente, tiraram as roupas para esfregar as Barra Alimpa no corpo todo... Enquanto se ensaboavam, avistaram Príncipe Andy Suruba, o filho do Rei Mende e da Rainha Trapa, cavando a areia e desenterrando um objeto escondido. — Era a joia de camafeus? – interrompeu o Imperador. — Era – continuou Rei Negro Norato – mas ele tentou escondê-la dos três. Por curiosidade, os três foram ao seu encontro. Para disfarçar o que fazia, o Príncipe “Y” propôs-lhes uma brincadeira. A brincadeira do Suruba. Pegou a joia da Tia Ara, colocando-a sobre a cabeça deles, cada um de uma vez, pronunciando palavras de magia e esfregando-os ainda mais com os sabonetes. Pareciam praticar um ritual. Até que mandou que rolassem pela areia até chegar dentro d´água, enquanto dizia bem alto: “Esta é a magia do Suruba. Quem a tiara usou, caiu n’água, sendo gente, peixe virou ...”. Assim que os três tocaram na água, transformaram-se imediatamente em peixes. Um, o Príncipe Pintado, ficou cheio de manchas pequenas e pretas por conta das pedrinhas redondas que colaram em seu corpo enquanto rolara na areia. O outro, o Príncipe Surubim, o “Ur”, ficou com as marcas dos gravetos secos que colaram na pele ensaboada. E a outra, minha filha Kachara, ficou marcada com as folhas secas que grudaram em sua pele. Perplexos, os que ouviram o relatório nada disseram. Também não compreendiam como que a brincadeira do Suruba pudesse resultar numa magia daquele porte. Muito sérios, o Grande Rei e o Mago Natu entreolharam-se, como se soubessem de tudo antecipadamente. Rainha Zomba, desesperada, sacodiu Mago Natu pelos ombros, pedindo: — Mago Natu, eles foram enfeitiçados. Por misericórdia, faça qualquer coisa, uma mágica, um feitiço, um enguiromanço, mas faça minha filha voltar a ser gente! 217H. H. Entringer Pereira Rainha Bisca, também descontrolada, puxando os cabelos nervosamente, bradava: — Eu quero o meu filho Ur gente! Eu quero meu Príncipe Ur gente! Rainha Trapa, mãe do Príncipe “Y”, presenciando o desespero das outras mães, diante da passividade do Mago Natu e do Grande Rei, arrependida, resolveu confessar parte do seu envolvimento no sumiço e no enfeitiçamento da joia da Tia Ara. Além de mandar o filho furtar a tiara de camafeus que a Imperatriz usaria na cerimônia lunar do casamento, também admitiu o furto dos talheres e de uma taça, enquanto ceava, para atender ao pedido do Bruxo Neno: — Eu mesma pedi ao Andy Suruba que levasse a joia de camafeus da noiva para que o Bruxo Neno a enfeitiçasse. Queria entregá-la depois à minha irmã, Rainha Sissu, para que conseguisse engravidar. A joia da Tia Ara estava enfeitiçada para isso... Bastava que minha irmã a colocasse na cabeça por alguns minutos que ela haveria de ter o filho que há tanto tempo desejava. Eu iria devolvê-la secretamente. Não sabia que os meninos iriam usá-la como brinquedo. Mago Natu, calado até então, pronunciou-se: — Senhora Imperatriz, a joia da Tia Ara está mesmo enfeitiçada! Não a tome de volta. Quanto ao encantamento perpetrado pelo Príncipe Andy Suruba, o “Y”, só ele poderá desfazê-lo... Bem, quem sabe... Por favor, chamem o rapaz aqui. Rei Mende, pai do Príncipe “Y”, temeroso pelas consequências do pesadelo provocado inadvertidamente pelo filho, tentando protegê-lo, adiantou-se: — “Y” não sabe de nada. Não tem conhecimento do que fez. Nem como fez. “Y” não sente. O responsável por tudo isto é o Bruxo Neno. Ele é quem deve desfazer o feitiço. Tragam-no aqui. Rainha Trapa interveio, desfazendo a esperança de reverter o acontecido: — Bruxo Neno se foi. Vi quando subiu o rio com o Rei Mor e a Rainha Sissu. — Alguma coisa está errada – interrompeu o Mago Natu – Bruxo Neno não mora naquela direção, nem o Rei Mor e a Rainha Sissu foram embora. Seus pertences e acompanhantes ainda estão na casa de hóspedes. Certamente o Príncipe Andy Suruba, o “Y”, já lhes entregou a tiara. O Grande Rei a tudo assistia, sem interferências. Pediu licença, retirou-se discretamente, dirigiu-se aos compartimentos secretos do Palácio Fortaleza, onde se encontrava hospedado, na Câmara do GRAU. O Imperador Médium, a Imperatriz Gônia e o Mago Natu empenhavam-se juntos, buscando a solução, não para reverter o encantamento dos príncipes, porque sabiam ser impossível, mas para reaver a preciosa joia da Imperatriz Gônia e impedir que fosse utilizada para perpetrar outros encantamentos e malefícios ainda piores. Da casa de hóspedes, onde a Rainha Sissu e o Rei Mor estavam, ouviam-se vozes diversas. Rei Médium e Mago Natu julgaram que fossem os hóspedes procurados. Chamaram à porta. O Príncipe Andy Suruba veio atendê-los. Antes que perguntassem pela Rainha Sissu e o Rei Mor, explicou: — Minha tia saiu e está com a joia da Tia Ara! Se é isso que os senhores vieram buscar. Rei Mor, Bruxo Neno e ela passeiam rio acima. 218H. H. Entringer Pereira — Hum, a situação é pior do que imaginava – resmungou Mago Natu. – E quem está aí, conversando contigo, se não é a Rainha Sissu? — É o meu amigo, o Príncipe Putho, filho do Rei Inci e da Rainha Régia. Estamos jogando xadrez. — Venha comigo ao meu Santuário, imediatamente! – decidiu-se Mago Natu, convidando também o Imperador Médium para saírem juntos. Príncipe Andy Suruba, hesitante, perguntou ao Mago Natu: — Por que eu teria de ir com o senhor? Não quero sair daqui agora. Peguei a coisa da Tia Ara porque minha mãe mandou e já entreguei à minha tia, a Rainha Sissu. Ela me disse que devolveria hoje ainda! — Você não sabe, nem faz ideia do que está acontecendo. Você também foi enfeitiçado pela joia da Tia Ara. Por favor, não vá se banhar no rio. Não antes que eu me encontre com o Bruxo Neno – recomendou Mago Natu. Rainha Zomba, Rei Negro Norato, Rainha Bisca e Rei Boio vieram ao encontro do Mago Natu, exigindo a solução para desfazer o encantamento: — Não é justo, Mago Natu – ponderou Rei Negro Norato – que nossos filhos tenham sido encantados em peixes, e ao Príncipe “Y” nada aconteça! — Queremos que ele seja castigado pelo que fez – assentiu Rainha Zomba. — Exatamente – disse Rei Boio – por onde andam Rei Mor e a Rainha Sissu? Cadê o Bruxo Neno? — Acalmem-se, por favor – solicitou polidamente o Imperador Médium. – Já estávamos de saída para buscá-los. Resolveremos esta situação todos juntos. Do alto da janela da Câmara do GRAU, o Grande Rei observava a movimentação das pessoas, o burburinho causado pelo despropositado encantamento dos príncipes Surubim, Pintado e Kachara, e pela indiferença do Príncipe Andy Suruba, o “Y”, por toda a infelicidade que provocara com sua intemperança. A Rainha Trapa também não aparentava preocupação com a desventura dos príncipes, porque alimentava a esperança de que a joia da Tia Ara estivesse mesmo enfeitiçada e, finalmente, sua irmã, a Rainha Sissu, poderia se beneficiar com o encantamento para trazer a este mundo o desejado herdeiro do trono de Trindade. Rei Mende, entretanto, olhou para o alto e viu o Grande Rei à janela. Voltou-lhe contrito o pensamento, formulando o desejo de que o G. R., com todo poder e superioridade, desfizesse aquele terrível feitiço, pondo termo ao horror de que logo alguém pudesse pescar aqueles peixes para comê-los, sem jamais desconfiar de que, há menos de um dia, eram belos e garbosos potenciais herdeiros de tronos reais. O Grande Rei haveria certamente de restabelecer tudo à ordem, voltando até o tempo se preciso fosse, assim como era no princípio, agora e para sempre. Retirando o tecido que cobria o Espelho Universal, o EU, na Câmara do Grande Reflexo Auto Unificado, o Grande Rei viu se projetar uma imagem prevista: Bruxo Neno, Rainha Sissu e o Rei Mor estavam parados à frente do Portal do Santuário do Mago Natu, tentando eliminar o cão Philos, que lhes obstaculizava o ingresso àquele sagrado lugar. — Estão querendo entrar – pensou o Grande Rei – para pegar as mandrágoras que entreguei ao Mago Natu. Desta vez, vou impedi-los. 219H. H. Entringer Pereira Observado pelo cão Philos, um grande animal negro que ficava em frente à esquerda do misterioso portal, Bruxo Neno já havia pronunciado todas as palavras mágicas que conhecia e, que julgava, serviriam de senha para adentrar o Santuário do Mago Natu. Numa derradeira tentativa, voltou-se ao Rei Mor e pediu: — Senhor Rei Mor, não estou encontrando o jeito de eliminar o cão... pelo menos por enquanto. Já pronunciei todas as palavras de ação que conheço e nada... está difícil de fazer o cão dormir. — Você ao menos sabe o nome dele? – perguntou Rei Mor, mostrando interesse e desejando ser útil. — Acho que é Zilos, Pilos, Milos... sei lá, algo parecido com isto. Não é o nome dele a senha? Tenho certeza, mas já falei e não adiantou... Diga lá, Senhor Rei, alguma coisa. Quem sabe acerte a pronúncia e a gente consiga entrar? Daí usaremos o próprio cão para pegar pelo menos uma das três mandrágoras. — Bruxo Neno — disse Rei Mor —, se vós que se dizeis conhecedor de tantos feitiços e magias não estais dando conta, eu que pouco ou quase nada entendo destas ciências, muito menos de palavras secretas com poderes para encantar cães... mas vamos lá... façamos uma última tentativa, se é que vós ainda não bloqueastes a senha... – riu, debochado. — Hum – titubeou Bruxo Neno. – ‘tava me esquecendo de um detalhe: se a gente conseguir entrar, também precisa da senha pra sair... eu não sei, tampouco vós. Ficar preso lá dentro será a mesma coisa que fazer força sem conseguir cagar... Acho melhor a gente abortar essa parte do plano! Rainha Sissu não conteve o ataque de riso com a observação pouco conveniente e vulgar do Bruxo Neno. Lembrou-se do quanto a Rainha Zomba ria de tudo e de todos. Conteve-se, entretanto, quando se sentiu vingada sabendo que a filha da Rainha Zomba, a Princesa Kachara, transformara-se para sempre num enorme peixe liso, gosmento e rajado de preto. Dirigindo-se ao marido, o Rei Mor, falou baixinho: — Penso que conheço a senha... posso tentar? — Pois fale de uma vez... estamos correndo perigo e perdendo muito tempo neste lugar impenetrável – encorajou-a o marido. Postando-se de frente ao Portal do Santuário, evitando prudentemente se aproximar, preferindo distância de segurança do indomável cão negro, Philos, que a encarava, Rainha Sissu puxou fôlego. Ao abrir a boca, Bruxo Neno interrompeu-a abruptamente, ordenando: — Cale-se! Algo me diz que devemos dar o fora logo, imediatamente. Vamos para o barco. As mandrágoras que esperem... daqui a três anos voltarei para apanhá-las. Vamos, rápido! Deixaram o lugar tão apressadamente que a Rainha Sissu se esqueceu da joia de camafeus da Tia Ara pendurada na forquilha de um galho de árvore seca. Quis voltar, mas já estavam dentro da embarcação. Bruxo Neno, pressentindo o perigo a que se expunham, disse: — Deixe que continuem pensando que “Y” ‘tá co’a tiara. A gente pode sair daquele Palácio sem ver Gônia! 220H. H. Entringer Pereira Chegando ao Palácio Fortaleza, inconformada pelo esquecimento da tiara pendurada na forquilha da árvore seca, no portal, fora do Santuário do Mago Natu, Rainha Sissu implorou ao Bruxo Neno que retornasse lá para buscá-la. Percebendo, porém, que seria flagrado com o objeto furtado, caso obedecesse ao desejo da rainha, o Bruxo expôs-lhe os perigos a que se sujeitavam: — Meu coração não me engana. Sinto que o Magnético já sabe que viemos de lá e está procurando pela gente. O Grande Rei, tenho certeza, já avisou para ele que tentamos nos apoderar de suas mandrágoras. Com o Grande Rei na área, se passar do ponto, o doce azeda! Convencendo a Rainha Sissu de que esquecesse a tiara de camafeus e rubis e esperasse a oportunidade certa para se concretizar o encantamento com as mandrágoras, Bruxo Neno continuava relatando ao Rei Mor suas aptidões, prometendo-lhe realizar a segunda alternativa das suas receitas: — Sabe os ovos que Taruga Quelônia enterrou na areia, está lembrado? — Evidentemente – respondeu Rei Mor. — Pois é, estão todos prontos para usar. Posso fazer um excelente feitiço com eles. Garanto ao Senhor Rei engravidar sua rainha logo, logo... — Com os ovos? – indagou ingenuamente a Rainha Sissu. — Claro que não, com o instrumento próximo deles... – divertiu-se Bruxo Neno. Rei Mor não achou a menor graça na piada, porque já havia se submetido a um ritual com aquele propósito, celebrado pela Feiticeira Zuzu, a Sacerdotisa das Sombras, tão logo ela se mudara para o Reinado de Trindade. No entanto, o feitiço funcionara em parte: devolveu-lhe a potência, mas não a fertilidade. Trazendo seriedade ao assunto, proclamou: — Se usares aqueles ovos e, ainda assim, a rainha não engravidar, antes da próxima lua cheia, penduro-te no forcado de uma árvore, tal-qualmente fez Rei Albe, o Rico. — Juro e esconjuro, Senhor Rei Mor, que não carecerá. Vossa mulher haverá de engravidar. Quem já mostrou capacidade de fazer até gente virar bicho... engravidar vossa rainha vai ser mais fácil do que pensais... pode acreditar! Raciocinando nestes termos, Rei Mor demonstrava cada vez mais interesse pelas ciências ocultas, notadamente pelas artes da feitiçaria e seus encantamentos, dos quais o Bruxo Neno se vangloriava, não perdendo oportunidade de jactar-se, preconizando suas superlativas qualidades, suas práticas, maestria nos feitiços e os prodigiosos recursos nos mistérios de transformar até gente em bicho. Para impressionar o Rei Mor ainda mais, Bruxo Neno narrou-lhe particularidades de seu nascimento, dando ênfase ao que aconteceu na noite de sua concepção, por obra das forças ocultas, numa ritualística em que sua avó, a Bruxa Bizarra, celebrava a iniciação de sua mãe, a feiticeira Zureta, a qual recebeu naquela sessão sabática o cognome de Sacerdotisa das Sombras. Explicou-lhe também que a mãe, Feiticeira Zuzu, a despeito de ser extremamente competente naquelas artes e ofícios, não poderia mais adquirir o superlativo grau de Bruxa, porque não muito remotamente, no entrevero com o Rei 221H. H. Entringer Pereira Albe, o Rico, naquele momento de vulnerabilidade do qual o rei soube se aproveitar, tosou-lhe os cabelos rentes à nuca com sua adaga de prata, sentenciando-a, destarte, a jamais poder transformar criaturas em outros seres, criar seus próprios gênios ou transportar-se no forcado até os locais para os rituais sabáticos. E, talvez, por aquilo ainda não tivesse conseguido êxito completo na magia para devolver totalmente ao rei suas forças viris e fecundantes. — E o senhor tem capacidade para fazer tudo isto? – quis saber o Rei Mor. — Tudo isso e ainda mais. Sou especialista mesmo é em transformar gente em animais, sejam da água, sejam da terra ou do ar. Mas esta é uma história que eu levaria uma noite inteira pra lhe contar, Senhor Rei Mor! – atalhou o assunto e voltou-se para a Rainha Sissu: — Posso lhe garantir, Rainha Sissu, que mais ou menos no mesmo tempo em que a rainha Gonha parir os filhos gêmeos, os tais anunciados pelo Magnético durante o casamento, lembra? Um grande pássaro também visitará seus aposentos e a senhora vai parir um filho, ou uma filha... não importa o sexo, não é mesmo? Na noite em que conceberes, sentirás que o vosso rei parecerá diferente. Não se assuste, nem pronuncie uma palavra sequer. Entregue-se a ele totalmente e verá que ele também não pronunciará palavra alguma. Logo, então, te sentirás grávida. Deverão colocar o nome do que nascer, se for homem, Marmito, Príncipe Marmito. Se for mulher, Ana Conda, Princesa Ana Conda! — Não foi este primeiro nome que a Rainha Olinda e o Rei Pay colocaram no menino deles? – interrogou Rainha Sissu. — Aquele que viveu só um dia, está lembrada? Afinal, a senhora e o Senhor Rei Mor queriam mesmo que a Rainha Olinda morresse, não é? Atendi-lhes o pedido. Agora, ouçam o que estou lhes dizendo... – continuou o Bruxo Neno. — Por que teremos que colocar estes nomes horrorosos nos nossos filhos? – observou, contrariado, Rei Mor. — O porquê é segredo do Bruxo Neno – desdenhou. – Não posso explicar no momento. Mas se puserem qualquer outro nome no menino ou na menina, a senhora, Rainha Sissu, também morrerá de parto. Igualzinho ao que sucedeu com a Rainha Olinda, lembra? Desconfiado, um tanto cético a respeito dos saberes ocultos e da ponderabilidade dos efeitos provocados pelas manipulações das indecifráveis forças secretas subjugadas pelos feiticeiros, bruxos ou magos, Rei Mor oscilava entre acreditar nas façanhas mágicas do Bruxo Neno ou se render à evidência pura e simples de que a bruxaria constituía-se mesmo num conjunto sistemático de saberes, crenças e práticas que alcançavam resultados, independentemente do que a lógica ou a ordem natural das coisas prescrevessem. Abandonando momentaneamente sua racionalidade porque desejava fervorosamente que a Rainha Sissu lhe presenteasse com um ou dois herdeiros, deixou de lado suas inabaláveis convicções racionalistas, calando-se diante da enxurrada de questionamentos que gostaria de dirigir ao Bruxo Neno: — Essa questão de nome... Rainha Sissu é quem decide – disse Rei Mor, colocando ponto final na questão. 222H. H. Entringer Pereira — Prefiro não arriscar – consentiu Rainha Sissu – a mim, basta que seja um filho ou uma filha... não me importa que nome tenham! Depois que atracaram a embarcação, subiram as escadarias do porto, rumo ao Palácio Fortaleza, como se voltassem de um agradável e animado passeio vespertino. Rainha Trapa, avistando primeiro a irmã, por quem já procurava há horas, correu em sua direção e, muito afoita, quis logo saber: — Cadê a joia da Tia Ara, Sissu? Onde guardaste a peça de camafeus da Imperatriz Gônia? Surpresa com a afobação e o inesperado questionamento da irmã, Rainha Sissu respondeu, sem pensar: — Não vi, nem sei de Tia Ara de Imperatriz nenhuma... Nunca estive com a joia da Tia Ara! — Como? Não sabes da joia da Tia Ara? Teu sobrinho acaba de nos dizer que te entregou – admirou-se Rainha Zomba. – Disseram-me que o Príncipe Andy só roubou a peça da Tia Ara por tua causa, Rainha Trapa... para tua própria irmã, Rainha Sissu... — Já disse, repito, não estou com nenhuma joia da Tia Ara. Se “Y” roubou a tiara, ele é que preste contas. Virou as costas, cinicamente, deixando atordoadas Rainha Trapa, Rainha Zomba, Rainha Bisca e Rainha Ália. Enquanto discutiam entre si, esbravejando, acusando-se mutuamente em altos brados pela maldição do encantamento da tiara, seus maridos, Rei Mende, Rei Negro Norato, Rei Kórnio e Rei Boio, foram se avistar com o Imperador Médium, que se encontrava com a Imperatriz Gônia, o Mago Natu e o Grande Rei, buscando solucionar o inusitado caso. — Quero a minha princesa de volta! – gritava e esperneava Rainha Zomba. — Também quero meu Príncipe Ur de novo virado gente, quero Ur gente, Ur gente, ouviram? – vindicava Rainha Bisca, mãe do Príncipe Surubim. — Quero meu filho Príncipe Pintado de novo! – esbravejava Rainha Ália. — Tudo culpa tua, Trapa, megera! – insultava acusando-a, a Rainha Zomba. – E você, Rainha Sissu, fingida, falsa, hipócrita... estou uma arara contigo! Não saio daqui se não for junto com minha Princesa Kachara! Rainha Trapa não se conteve diante da indiferença da irmã, Rainha Sissu, que parecia alheia àquela mixórdia, sem esboçar qualquer intenção de defendê-la das injúrias da Rainha Zomba ou propor alguma solução ao dilema. Arrebatada pela sensação de ódio e desprezo, atirou-se sobre a Rainha Zomba, agredindo-a e vociferando: — Agora verás o que é virar uma arara! – disse, agarrando-a pelos cabelos. Rainha Trapa passou-lhe a perna, derrubando-a. Rolaram no chão, engalfinhando-se, até que Rainha Trapa, no esperneio, conseguiu empurrar Rainha Zomba, que bufava feito um boi raivoso para dentro do fosso, precipitando-a no canal que contornava o Palácio Fortaleza, ligando-o ao rio Aguaporé. A Rainha Zomba afundou-se nas águas escuras e profundas do canal. Diante dos olhos estupefatos dos outros reis e rainhas, que não conseguiram evitar o embate, viram um animal no formato de um excêntrico peixe vir à tona, emitindo um sopro 223H. H. Entringer Pereira muito forte, semelhante a bufados assustadores... Era Rainha Zomba, definitivamente e para sempre transformada no peixe arara, a Pirarara. — Nunca mais, Zomba, ria! – disse para si Bruxo Neno, assistindo de longe o embate entre as duas rainhas, Trapa e Zomba, satisfazendo-se ao ver o peixe de formato asqueroso, cascudo e da boca enorme, bem do jeito que ele imaginara transformar Rainha Zomba, na Pirarara. Ao ser avisado de que sua mulher também se transformara no pirarara, e que viesse vê-la, o Rei Negro Norato teve um súbito ataque de ódio. Saiu correndo em direção ao pátio onde estava o Bruxo Neno e, num golpe repentino, atracou-se a ele, enroscando-se, atraindo-o também para próximo do canal. Enquanto os dois rolavam, arrastando-se no chão, Bruxo Neno conseguiu sacar sua adaga de prata escondida sob as vestes, que sempre trazia na bainha, amarrada à cintura, atingindo num golpe certeiro o coração do Rei Negro Norato, atirando-o mortalmente ferido também para dentro do fosso. Nas águas turvas do canal, o sangue do Rei Negro Norato esguichou, contaminando-as, disseminando-se, tornando-as totalmente negras. Seu corpo foi se alongando e espichando até se metamorfosear numa imensa cobra negra, de olhos esbugalhados e vermelhos como tochas. Bruxo Neno, presenciando passivamente a cena, com ares de desprezo, exultou-se pelo resultado de mais uma de suas façanhas. Fez um sinal ao Rei Mor, acenando com um gesto de escárnio, e disse para consigo: Isto acontece com quem cobra do Bruxo Neno. Pode voltar para o seu reinado, Negro Norato. Aproveita e leva junto sua Rainha Pirarara e sua filha Kaxara! Mago Natu já estava ao seu lado quando ordenou: — Bruxo Neno, faça com que as águas negras com que o enfeitiçaste acompanhem a Cobra Norato para bem longe daqui. Que voltem lá para o distante reinado do Negro. Que elas não se misturem com as outras águas dos rios por onde passarem, principalmente com as do Grande Rio. Bruxo Neno sabia das sinistras consequências caso não atendesse ao que Mago Natu ordenava. Meio hesitante, mas forçado a obedecer, com alguns gestos e algumas palavras que pronunciou em voz baixa, fez com que a Cobra Norato se afastasse de vez, deixando limpo o canal do Palácio Fortaleza. Movendo-se com a correnteza para o rio Aguaporé, levou consigo a enorme mancha negra das más águas. A Cobra Grande retirou-se lentamente. Retornava e subia em direção ao Norte, para as longínquas terras do Rei Negro Norato, tingindo de negro o imenso rio que cortava aquele reinado para sempre, perpetuando-se a correr até se limpar quando se encontra com o Grande Rio. Mago Natu disse-lhe no ouvido: — Resolvido o problema das más águas! Porém o que ficou na história do Negro Norato não são as mágoas, mas a grande Cobra criada. O Imperador Médium consultou o Mago Natu sobre a possibilidade de reverter toda situação, com seus poderes de Mago. Mago Natu suspirou profundamente. Com olhar desalentador, desfez-lhe as esperanças: 224H. H. Entringer Pereira — Não há como desvirar encantamentos. Eles mesmos se desfarão, mas daqui a muitos, muitos anos, talvez milhares ... – conformou-o Mago Natu, convidando-o para acalmar apenas aos reis Kórnio e Boio e às rainhas Bisca e Ália. — Não me parece prudente fazer qualquer coisa contrária ao movimento – observou Mago Natu. — Mas podemos minimizar os efeitos, pelo menos? – arguiu o Imperador Médium. — É melhor falarmos destes acontecimentos pessoalmente ao Grande Rei. Embora não me pareça que Ele se sinta constrangido, incomodado ou atingido por eles. Está acima e além de tudo isto – concluiu Mago Natu. — O Grande Rei não recrimina atitudes, não discrimina comportamentos ou interfere no que acontece entre as pessoas. Tem uma visão superior, porque conhece o coração e a mente de todos. Sabe tudo quanto fazemos no presente, fizemos no passado e faremos no futuro! – conformou-se o Imperador Médium. — A realidade é esta, apenas esta. Mas vamos ter com Ele – encorajou-o Mago Natu. Ao encontrarem o Grande Rei na Câmara do GRAU, perceberam que já se preparava para a grande viagem de volta ao seu reinado, nas longínquas terras do outro lado do Oceano, no Reino da Perfeição. O Imperador Médium, visivelmente aflito, perguntou-lhe: — Grande Rei, estais a organizar Vosso regresso? — Certamente, respondeu. Iremos ao amanhecer. Zarparemos com as três naus. Já ordenei as providências. As embarcações encontram-se prontas, munidas das provisões a bordo, aguardando o momento de voltarmos. — Grande Rei, disponha da quantidade de ouro que almejais. Assim como da madeira que precisais... Que levem os vossos navios tudo quanto pudermos vos ofertar como prova de gratidão à Vossa tão excelsa presença – disse o imperador. — Poderei acompanhar-vos de volta, Grande Rei? – pediu Mago Natu. — Certamente, sempre haverá lugar reservado para vós em nossas embarcações. — E quando retornareis? – quis logo saber o imperador. — Quando vossos príncipes nascerem. Estarei de volta para celebrarmos o nascimento de Urucumacuã e Kurokuru – assegurou Mago Natu. O Imperador Médium sentiu uma profunda tristeza, como se fosse uma saudade antecipada. Não conseguiu disfarçar os olhos lacrimosos, porque além do regresso do Grande Rei, também sentia pelo Mago Natu anunciando a intenção de se ausentar por algum tempo. A presença do Grande Rei por aqueles dias no Palácio Fortaleza, no Reino do Elo Dourado, exercera sobre ele um fascínio indescritível. Os incomparáveis eflúvios daquela presença semelhavam-se à inefável suprema felicidade, talvez se comparassem mesmo à presença de um deus. Tudo nele era perfeito. Seus gestos, movimentos, olhares, palavras, atitudes. Emanava uma vibração tão amorosa, benéfica, pacífica, sábia e poderosa que transpunha os limites da realidade circunstante, arrebatando de sublime afabilidade os que estavam em sua presença. A admirável tonalidade de sua voz, a 225H. H. Entringer Pereira majestosa humildade, o semblante sereno e a radiosa fisionomia eram marcas inquestionáveis de sua extraordinária sabedoria. Extremamente grato e feliz por tão excelsa companhia, solicitou: — Grande Rei, venha também para festejar o nascimento dos meus filhos! — Não estarei pessoalmente, mas ainda que não me vejam, saberão da minha presença – garantiu. — Mago Natu – quis saber o imperador – como ficarei sem vossa presença no Elo Dourado, durante este tempo? — Não se inquiete vosso coração pelos acontecimentos passados, nem tampouco pelos vindouros. Confie na excelência da Imperatriz. Ela bem o auxiliará. Aos que precisarem, ordene ver Gônia! Se não quiserem, mande-os ver Neno! Ouvistes o Grande Rei: “não queira mudar o jeito das coisas acontecerem”. Deixe que os rios escavem e desenhem seus próprios cursos, até chegarem ao grande rio e deste ao Oceano. Aos dias de alegria sucederão as aflições e, assim, alternativamente pelos séculos dos séculos... — Mais aflições do que já presenciamos? – interrompeu, cético, o Imperador Médium. — Sim, confirmou. Torno a vos dizer: nada jamais aconteceu nem acontecerá por obra do acaso. Há e haverá sempre uma razão para tudo. Para o sábio, o caminho da vida é para cima, onde nenhum caminho parece aberto, mas por ele mesmo assim o descobre. É preciso um ciclo encerrado para que se comece outro. Deixe que as coisas hão de acontecer como é preciso. Com o dedo indicador desenhou no ar algumas letras no formato maiúsculo e disse, enquanto sinalizava os monogramas: — Obedecer. Lembre-se sempre. O Imperador Médium entendeu ao que se referia o Mago Natu e, antes que os deixasse a sós, fez outra pergunta: — Mago Natu, o que me aconselhas a fazer com o Bruxo Neno? Aprovas o resultado de suas embaraçosas e disparatadas ações? — Deixem-no partir. Antes de viajar, eu mesmo cuidarei disso. Está quase pronto para se mudar para o Reinado de Trindade. Deseja ser vassalo do Rei Mor. A mãe dele, a Sacerdotisa das Sombras, já habita aquelas terras, desde que a Rainha Alzira começou a reinar em Avilhanas e a expulsou, logo depois que o Rei Albe, o Rico, enforcou-se. Os dois, mãe e filho, reunirão forças, em princípio para satisfação do próprio Rei Mor, depois, tentarão destruí-lo. Por fim, destruirão a si mesmos. O Imperador Médium, interessado na revelação, quis outras informações e indagou: — Como destruirão a si mesmos? — De tantas demonstrações, acabarão se transformando em monstros. Mago Natu não acrescentou detalhes, mas antecipou a resposta a uma futura pergunta: — O Príncipe Urucumacuã, vosso anunciado filho, no tempo certo, haverá de dominá-los. Porém, outros monstros surgirão, da mesma forma que surgiu a Mula Sem Cabeça. 226H. H. Entringer Pereira O Imperador Médium ficou muito sério, calou-se por um instante e acrescentou um pedido: — Peço a vós e ao Grande Rei que volteis ao Reino do Elo Dourado, antes do nascimento de Urucumacuã e Kurokuru, daqui a três anos, para que festejemos com uma grande celebração. O Grande Rei abraçou-o amistosamente, assegurando-lhe: — Não virei pessoalmente, mas sentireis minha presença. Darei sinais de que estarei por aqui. Mago Natu, sentindo o Imperador Médium aflito ainda com os extravagantes acontecimentos registrados naquele dia, tranquilizou-o, dizendo que ainda tinham tempo para resolver alguns problemas: — Não vos preocupeis com o que se há de fazer, nem desfazer. O que está feito, está feito. Vou simplesmente advertir o Bruxo Neno para que não cometa outras insanidades, mas tampouco tentarei impedi-lo. É bom que ele se mude deste reinado. No entanto, não o proíbam de vir aqui, quando quiser... ou precisar. — Mago Natu, se ele voltar aqui, é provável que abuse novamente de suas bizarrices. Suscetível também utilizar-se de recursos piores para nos afrontar ou simplesmente provocar. Devo permitir que venha à festa de nascimento dos meus filhos? — Se ele quiser, não atalhe seu destino, nem se contraponha à sua vontade – pediu Mago Natu. – Deixe-o livre para decidir. É necessário que alguns acontecimentos mantenham seus fluxos, sem interrupção. Prepare-se. Muitas outras coisas fantásticas surgirão no decurso do tempo... Não se desespere, nem se julgue culpado. Lembre-se: tudo está como se escrito nas estrelas. Quando Mago Natu concluiu seu diálogo com o Imperador Médium, o Grande Rei pegou um recipiente de prata sobre um móvel de marfim ao lado de sua cama, recomendando: — Ao Mago Natu, presenteei com as três mandrágoras. Ao Imperador Médium, entrego estas sementes. Plante-as, pois algo darão. Se preferir, reparta-as com o Marquês de Corumbi, para que também as cultive. Diga-lhe que deverá plantá-las por toda a extensão de suas terras. No lugar onde o Marquês de Corumbi ara. O Imperador Médium discretamente avisou ao Grande Rei que um banquete suntuoso os aguardava dali a uma hora, na Praia da Lua Clara. Tanto os hóspedes reais quanto os demais súditos convidados teriam, assim, oportunidade de mais uma vez desfrutar da nobre e excelsa companhia, além de poderem despedir-se pessoalmente do Grande Rei. Deixando-o a sós, desceu os trinta e três degraus da escadaria da Câmara do GRAU, pensando como haveria de ser excepcional a viagem que Mago Natu empreenderia ao Reino da Perfeição com o Grande Rei. Desejou por alguns instantes a liberdade de Mago Natu, que podia ir e vir sem compromissos que o impedissem de realizar sua própria vontade. Conformando-se, no entanto, com sua condição de imperador e homem recém-casado, o Imperador Médium sorriu para o Mago Natu. Antes que falasse o que pretendia, Mago Natu leu seu pensamento, dizendo-lhe: “É melhor ser amigo do rei do que ser o próprio rei, meu caro amigo imperador ”. 227H. H. Entringer Pereira Ambos sorriram. Rei Médium pediu licença e saiu: — Vou chamar Gônia e Alimpa. Creio que Araci já terminou de lhes contar toda a história do tio Albe, o Rico. — E eu vou investigar o Bruxo Neno – despediu-se Mago Natu, também se retirando. Mago Natu precisava ouvir o Bruxo Neno a respeito de seus planos, tanto mais para adverti-lo dos seus nefastos e indesejáveis procedimentos. Acertara com o Imperador Médium que aconselharia o bruxo a se mudar, trocando os domínios do Elo Dourado pelo Reinado de Trindade, do Rei Mor, uma vez que suas atitudes feriam princípios de honra e ética necessários aos praticantes das magias e das ciências ocultas. Trouxera constrangimentos para Mago Natu, aflição para o Imperador Médium e a Imperatriz Gônia e grande sofrimento para os convidados atingidos direta e indiretamente pelos efeitos de sua magia transformista. Pensando na maneira de como fazer ao Bruxo Neno as advertências e recomendações que prometera ao imperador, Mago Natu defrontou-se com ele, enquanto conversava animadamente com o Rei Mor. Ao se aproximar, percebeu que mudaram rapidamente o tom da prosa. Mago Natu sabia exatamente do que tratavam: “Tanto melhor que ele esteja combinando com o Rei Mor sua mudança de reinado, uma vez que sua mãe, a Feiticeira Zuzu, já está morando naquelas plagas”, pensou Mago Natu. “Estaremos livres de alguns embaraços futuros. Melhor Bruxo Neno ir para as terras do Rei Mor do que a Sacerdotisa das Sombras vir para o Império do Elo Dourado.” Disfarçando o que havia sondado sobre as intenções do Bruxo Neno, Mago Natu inquiriu: — O senhor pode, por obséquio, dizer-me onde colocou a joia de camafeus da Tia Ara? Aquela mesma que pertence à Imperatriz Gônia e que, por caprichos de tuas amarrações, desencadeou tantas excentricidades? — Dizer eu não preciso, porque sei que o Magnético sabe de tudo. Com certeza, logo, logo, vai encontrar, está lembrado? Se é que ainda não a achou. Procure-a lá pelas bandas de cima do rio, no mesmo lugar onde minha querida Quelônia foi enfeitiçada naquele bicho asqueroso – respondeu, zombeteiro. Mago Natu sentiu que Bruxo Neno agira motivado por vingança. Indiferente, alheio a todas as aflições que provocara, utilizou-se dos seus poderes malignos para desencadear fenômenos irreversíveis de transformações, retaliando o castigo aplicado a sua companheira, Taruga Quelônia, a Tal Taruga. — Obrigado. Já sei onde ela está, Bruxo Neno. Vejo a peça da Tia Ara colocada num galho de árvore seca. Ainda hoje irei buscá-la. Obrigado, passem bem! — Quando a encontrar – desafiou-o Bruxo Neno – duvido que consigas desencantar a joia da Tia Ara! – arrematou, escarnecendo-se do Mago Natu. – A tiara vai ficar enfeitiçada enquanto eu quiser. Com um aceno de cabeça, Mago Natu não contra-argumentou e gentilmente se despediu. Deixou-os, planejando ir ao Santuário Natu Reza, para estar de volta antes do anoitecer. Precisava retornar com a joia de camafeus da Imperatriz Gônia. Já havia se distanciado do Bruxo Neno e do Rei Mor quando uma ideia lhe ocorreu: Bruxo Neno e 228H. H. Entringer Pereira o Rei Mor combinavam alguma coisa sigilosamente. Ouviu chamarem seu nome. Volvendo-se, avistou o bruxo que lhe acenava com a mão: — Mago Natu, Magnético, volte aqui... quero lhe contar uma novidade! — Não é preciso – retrucou Mago Natu, à distância – já sei que estás planejando mudança do Elo Dourado para o Reinado de Trindade, onde está tua mãe, a Feiticeira Zuzu. Boa sorte ao Bruxo Neno, vida longa ao Rei Mor e a toda sua Corte! Intrigado com a antecipada revelação do Mago Natu, a despeito da inveja que lhe devotava, sem querer expor nem demonstrar a extensão de sua incontida rivalidade, Bruxo Neno cochichou nos ouvidos do Rei Mor: — Esse Mago Natu pensa que sabe de tudo. O Senhor, Rei Mor, já viu do que eu sou capaz, o que ainda não pode dizer dele. Não lhe mostrou nada que comprove ser melhor do que eu, tanto nas ciências ocultas como nas artes da magia, além de umas poucas coisinhas que fala aqui e acolá, está lembrado? Que mais ele fez? Nada. Não sei por que o Rei Médium, agora que é imperador, dá tanto crédito a esse mago, ao ponto de permitir que entre lá naqueles aposentos secretos, onde só ele e o Grande Rei deveriam entrar. Percebendo que o Rei Mor não estava interessado em ouvir suas lamentações desrespeitosas e descabidas sobre a pessoa irrepreensível do Mago Natu, Bruxo Neno voltou ao assunto que interessava ao rei: — Continuo prometendo... Vossa Rainha terá o filho, ou a filha, que deseja e vosso reinado vai ser muito, muito mais... maior e melhor do que esse imperiozinho de beira de rio — acrescentou, com indisfarçado sarcasmo. E prometeu mais: — Qualquer um que tentar vos atrapalhar, eu transformo em bicho, dou sumiço e ponto, resolvo o caso. Rei Mor, inflado de orgulho, inchado de soberba com a lisonjeira bajulação com que Bruxo Neno gratuitamente o agraciava, prometeu-lhe sob juramento: 328 — Palavra do Rei Mor: se fizeres mesmo a Rainha Sissu me dar um herdeiro ou herdeiros, ou os dois de uma vez, minhas minas de ouro e prata, dobrarem de produção, como dizes; minhas éguas de corrida aumentarem a fertilidade; sem vos esquecer de fazer progredir também a minha criação de catetos (Tayassu tajacu); concederei a mão da minha jovem e mais bela criada, a Murmur, para que a desposes, além de facultar-vos outros favores que haverão de ser bem convenientes. Mas, lembrai-vos, deverás me prometer lealdade e fidelidade até a própria morte, prestando-me submissão e vassalagem, evidentemente. — Assim será – jurou-lhe Bruxo Neno. Imediatamente ajoelhou-se diante do Rei Mor, ferindo a ponta de seu dedo indicador esquerdo com a afiada lâmina de sua adaga de prata. Juntando algumas gotas de seu sangue, permitiu que pingassem aos pés do Rei Mor, comprometendo-se: — Prometo-vos, por este juramento pactuado de sangue, dar minha própria vida em defesa da vossa e do Reinado de Trindade, se assim for preciso. Encostou a testa aos pés do Rei Mor e beijou-os, selando, com aquele gesto, o pacto de lealdade. Querendo imitar o Mago Natu, que prestava reverência ao Grande 229H. H. Entringer Pereira Rei pronunciando uma sequência enigmática de letras cujo significado só ele e o Grande Rei conheciam, pronunciou em voz alta e solene: — R.M.:T.U.V.X.Z.! Rei Mor, pego de surpresa, não conseguiu decifrar o que a secreta proclamação simbolizava, porque nada entendia de signos, emblemas e enigmas. Não querendo demonstrar sua ignorância, nem se humilhar perante o Bruxo, perguntando o que este queria dizer com a sequência alfabética, respondeu disparatado, dando a entender que decifrara o segredo: — B.N.:T.U.V.X.Z.! O Bruxo Neno, também surpreso com a resposta, pensou: “Será que o Rei Mor adivinhou o que acabei de inventar agora para significar essas letras? Tenho que ser rápido. Se me perguntar, vou dizer que meu enigma é: R.ei M.or: T.erás U.m V.aloroso X.amã Z.oólogo! E se ele quiser que eu decifre o enigma dele, o que vou dizer?” Continuou pensando e imaginando, ao mesmo tempo em que o Rei Mor também procurava dar significado correspondente às letras do enigma que propusera. Refletiu, conjeturou até que lhe ocorreu a seguinte combinação: “B.ruxo N.eno: T.erei U.m V.assalo X.amã Z.eloso ”. Receando ambos que pudessem expor suas deficiências e ignorâncias, por não conhecerem em profundidade o que significavam os respectivos enigmas, Rei Mor ordenou que o Bruxo Neno se levantasse e concluiu: — Aceito vosso juramento. Pertenceis agora ao Reino de Trindade, assim como já pertence aos meus domínios a Feiticeira Zureta. Tempos desses, tua mãe, a Sacerdotisa das Sombras, Feiticeira Zuzu, veio morar no Reino de Trindade. Ela também me jurou lealdade e já lhe devo alguns excelentes favores! Ao ouvir sobre os préstimos de sua mãe, Bruxo Neno interessou-se por descobrir que favores ou que trabalhos seriam aqueles mencionados pelo Rei Mor e de quais instrumentos mágicos a Feiticeira Zuzu andava se utilizando. Sucintamente, o rei descreveu um ritual de magia, numa noite de lua cheia, celebrado no Bosque da Solidão, para lhe devolver a virilidade, perdida desde os tempos em que a Rainha Olinda, mulher do Rei Pay, morrera, grávida de sete meses; e Bruxo Neno se lembrou do episódio por ter sido ele mesmo quem fez o encantamento com ovos de lagartixa, para que a rainha perdesse o filho e morresse. Desde então, o Rei Mor não conseguira ereção para acasalar-se com sua mulher, a Rainha Sissu: — Fizeste o feitiço para Rainha Olinda, mas o efeito contrário também me atingiu. Desde aquele tempo, não consigo nem tentar engravidar minha mulher. É certo que até hoje a Rainha Sissu não engravidou, mas a Feiticeira Zuzu me garantiu que, quando ela e seu próprio filho, que és tu, estivessem morando sob os domínios de um mesmo Senhor, que sou eu, minha descendência estaria assegurada! Ah, agora as coisas se encaixam... É isso que ela queria dizer... Tereis mesmo que se mudar para o Reinado de Trindade a fim de que se cumpra o augúrio de tua mãe e a Rainha Sissu me dê herdeiros... — Perguntei-vos, Senhor meu Rei, que instrumentos minha mãe usou? Não vos recordais? 230H. H. Entringer Pereira — Re-cordo. Corda. Bem, não propriamente uma corda. Parecia um bridão. Isto, um bridão de fios reluzentes! – confidenciou o Rei Mor no ouvido do Bruxo Neno. — Conheço a história desse bridão poderoso! Ele faz e acontece! Agora é todo nosso. Poderemos encantar gente em bicho, bicho em gente e encontrar tesouros! – exclamou, presunçoso, tomado de ambição. — Encontrar tesouros? – interessou-se Rei Mor. “Esta parte muito me interessa”, Rei Mor pensou sem dizer... — Posso conseguir tudo isto. Só preciso que o Senhor Rei cumpra com o prometido. Dê-me a mão da bela Murmur em casamento. — Palavra de rei é palavra de rei, Bruxo Neno. Cumpra com tua parte, então. Não vos esqueçais: ou fazeis por onde, ou mandarei cortar-vos o pescoço! — Não carecerá, Senhor Rei. Bruxo Neno fala... Bruxo Neno faz
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