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OCA TERRAVILA GLOCAL - Ocupação Cocriativa ArtFloresta

Sitio Bom Jesus - Rua Quilombo LT 56 - PA Quilombo - Lago do Manso - Chapada dos Guimarães-MT Brasil
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Categorias
Associação, Centro Cultural, DAO
Actividades
Acomodação, Agrofloresta, Aromáticas, Compostagem, Frutas, Grãos, Medicinais, Mudas, Orgânico, PANCs, Permacultura, Pesquisa, Preservação, Reciclagem, Sementes Crioulas, Voluntariado
Fone: +5569999556403
Facebook: brazdyvinnuh
Twitter: @Brazdv
Sobre
OCA - Terravila Glocal             "Alegria, fruto da Liberdade c/ Confiança!" OCUPAÇÃO COCRIATIVA ARTFLORESTA >>Manter um Polo Produtivo utilizando o conceito Agroecológico e da permacultura. Horta c/ alimentos convencionais; cultivo de ervas aromáticas, medicinais, fitoterápicas e PANCs-(Plantas Alimentícias não Convencionais); meliponicultura; manejo extrativista; canteiro de mudas de espécies nativas e/ou  ornamentais para reflorestamento local; Artfloresta (Arte como ferramenta pedagógica); turismo rural; resgate cultural; artesanato e artes em geral. >>Criar um ambiente de convivência e experimentação laboral que dialogue com liberdade a respeito de planejamento consciente e inteligente de geração de riquezas para a sustentação do Polo, com vistas para a regeneração do homem, a fim de dar visibilidade à regeneração do ambiente integral; onde o bem comum (terra, água, ar, fauna e flora) esteja além da geração de conteúdos que estimule a troca de saberes. >>TEATRO CIRCULAR REGENERATIVISTA URUCUMACUÃ - será uma edificação para marcar a presença da OCA OCUPAÇÃO COCRIATIVA ARTFLORESTA neste ambiente como inspiração ao Grande Público (Local e visitante). >>Longe do estereótipo de ações com viés de “cuidados ambientais”, o projeto recebe colaboradores para alavancar esse processo imediato, onde é oferecida hospedagem e alimentação para participação no projeto pelo período acordado entre o interessado e o projeto. O candidato oferece 4(quaro) horas de mão-de-obra diárias por semana, com dois dias de folga.  O tempo restante os colaboradores são incentivados a produzirem para conquista de seus retornos fiduciários. >>Esse sistema de “Terravila” Glocal é um conceito que vem dando certo, por oferecer aos experimentadores a liberdade de produzir o seu próprio sustento. Sem ter um mandatário centralizador. Os modelos comuns existentes, deixam um hiato que não pode ser preenchido. A proposta apresentada é de acesso e não de posse. Os colaboradores podem ser transitórios , temporários e "permanentes" pois é fato a transitoriedade da vida.  Com o processo em andamento para os trabalhos, vem ficando mais clara a proposta de uma “rede de ocupação produtiva e não de um grupo. >>A proposta “Terravila” Glocal existe em três dimensões, LOCAL, com os  colaboradores que a partir do pertencimento, se tornam moradores, por sua vez, locais; VIVENCIAIS são os colaboradores que fazem uma imersão local, por um período de tempo; GLOCAIS são os colaboradores que conhecem a proposta e participam de qualquer lugar do mundo, inclusive localmente. >>Nesta “Terravila” Glocal OCA os trabalhos de infraestrutura estão sendo inicializados. Os colaboradores dessa primeira fase terão a oportunidade de  conhecer de perto o mecanismo de se criar recursos para gerir uma ocupação que vai além da moradia e da propriedade para o plantio, onde se busca a regeneração do ser humano para que ele compreenda e se torne regenerador de sua própria natureza. Em uma rede que vem se espalhando pelo mundo, agregando pessoas que se identificam, principalmente deixando clara a importância da Alegria, Liberdade e da Confiança. Juntos somos mais fortes sem perdermos nossa pessoalidade.  § - O Projeto OCA terravila Glocal - Ocupação Cocriativa Artfloresta está sendo reconfigurado quanto ao formato das atividades locais, para deixar fluir com mais vigor tudo que vier para fortalecer nossa Ocupação. NOVA FASE. <<O que faria a equipe do Projeto OCA TERRAVILA GLOCAL, estar na plataforma?>> època de chuva - Forestando <<<A PRÓXIMA ETAPA É VIABILIZAR RECURSOS PARA FAZER CAPTAÇÃO DE ÁGUA POR GRAVIDADE PARA IRRIGAÇÃO DE BERÇÁRIO DE PLANTAS>>> <<<A OUTRA AÇÃO PARA MELHORIAS É A IMPANTAÇÃO DO BERÇÁRIO DE PLANTAS +++ PARA ATENDER AO VIVEIRO DE MUDAS>>> Confirmada a proposta de multiplicação do VETIVER para substituição do capim Brachiara, em toda pastagem do sitio Marcada a iniciação da poda do VETIVER - na próxima 4a feira dia 29 de janeiro de 2025 O Projeto OCA Terravila Glocal, firma parceria com a Associação do PA Quilombo, no Lago do Manso para desenvolvimento de novas propostas. Tendência a se tornar o carro chefe das ações da OCA para suprir o campo. ***210 mudas de vetiver replantadas e o Campo de Vetiver Regenerativo começa a crescer. Será dada continuidade ao projeto do Campo em junho, quando as matrizes completam um(1) ano. Hoje 245 mudas de vetiver. O Campo terá inicialmente 10 linhas com 100 mudas. Trabalho prazeroso. Em breve nova demanda será apresentada para o deleite de todos que defendem a regeneração. O planejamento para breve é de 500 mudas de Vetiver, até o final do ano. No máximo inicio do ano que vêm. Terra pronta para começar a Agroflorest(inh)a. Importante registrar que está florestando a OCA LAB 2 - Exatamente onde surgiu a presente Ocupação. Brevemente mais notícias. Viva!
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Teria um? Ou seriam todos eles? Fugir às convenções, pode nos levar além!
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Se para alguns é, ou ao menos parece irrelevante, sinto muito em dizer que não. Já quebrei cabo de enxada, martelo, machado, foice? Aproveitar o momento e deleitar-se com o imprevisto. Sem como improvisar. Não tem outra foice. Agora eu entendi...
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URUCUMACUÃ By H.H.Entringer Pereira Livro 3 CAP. 65
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O DILEMA DO BRIDÃO No Reinado de Trindade, a notícia das bodas do Bruxo Neno com a serva Murmur espalhou-se rapidamente, transformando-se em assunto de todas as conversas. A exclusividade dos convites para aquele casamento estendia-se aos reis, rainhas, príncipes, princesas e outros nobres, como se o Bruxo Neno fizesse parte da realeza como legítimo fidalgo da Corte do Rei Mor. O empenho do rei em proporcionar ao bruxo e a sua serva cerimônia nupcial com a presença de tão grande número de convidados ilustres não só realçou a soberba do bruxo, como contribuiu para aumentar o prestígio que já conquistara entre os palacianos. A empáfia característica dos oportunistas guindou-o à condição, sem paralelos, de primeiro colocado na lista dos aduladores, baba-ovos, cheira-cheiras, escova-botas, lambe-cus, lambe-esporas, louvaminheiros, puxa-sacos, sabujos e xeleléus do Rei Mor. Com livre acesso a todos os salões e alas do Palácio de Trindade, Bruxo Neno circulava impávido, impressionando a criadagem com seus cabelos totalmente raspados e modos esdrúxulos, desfilando vestes exageradamente ornamentadas, mas de corte vulgar, arremedos de mau gosto, copiados à maneira dos trajes do Rei Mor – tentativa invejosa de apresentar-se semelhantemente ao soberano, favorecido que era pela aparência física de ambos. Para ostentar prestígio, angariar fama e forçar o reconhecimento de sua superioridade e poder pessoais, baseado no bom êxito de seu desempenho nas práticas de magias e feitiços, Bruxo Neno não poupava inventar novos rituais e celebrações extravagantes com o propósito de ser admitido e admirado não apenas como bruxo, mas como honorável cortesão do Rei Mor. Tornou-se uma eminência parda, obrigatoriamente requisitado para emitir pareceres que abrangiam desde assuntos financeiros aos sentimentais dos palacianos. A maior parte do tempo posava ao lado do Rei Mor, suscitando ciumeiras que facilmente descambavam em obscuras disputas no espaço das considerações reais. Rei Mor não escondia nem disfarçava a precedência do bruxo sobre os demais súditos, distribuindo simpatias e favores à custa da inimizade e do despeito provocados nos desafetos. Corria à boca miúda que o Rei Mor planejava uma festa como nunca vista no Palácio de Trindade, para celebrar as bodas do Bruxo Neno com sua bela e cândida serva, Murmur. Além de bela, Murmur era trabalhadeira, dedicada e fiel, empenhada nos afazeres que garantiam comodidades não só ao rei como à sua intratável e insatisfeita mulher, a Rainha Sissu. Murmur era uma donzela órfã desde criança, pudica e inefável, diferente de todas as outras servas, amas e mucamas pelos modos gentis, comportamento recatado e submissão total às ordens das governantas, da Rainha Sissu e do Rei Mor. Quando o burburinho do cogitado casamento se alastrou pelo Palácio de Trindade, as colegas de Murmur, invejosas da posição a que ela ascenderia no alto escalão da nobreza, inventaram incontáveis lorotas, na tentativa de impedir a consumação daquelas núpcias. Mesmo atacada em sua honra pelas mais torpes e abjetas críticas, a indefesa Murmur se calava diante dos insidiosos comentários, porque no 262H. H. Entringer Pereira íntimo, não sentia pelo Bruxo Neno qualquer admiração que lhe motivasse querê-lo por marido. Tampouco lhe agradava o costume imposto pelo Rei Mor, o jus primae noctis, consistente no direito de o rei se deitar na primeira noite das núpcias junto à jovem esposa, se ainda virgem, enquanto o marido se mantivesse ausente, ocupando-se de permanecer oculto até a meia-noite, proibido, sob pena de morte, de se aproximar de seu próprio leito nupcial até que se esgotasse o derradeiro minuto do dia do casamento. O tradicional costume do jus primae noctis vigorava apenas no Reinado de Trindade, invenção ímpar de Rei Mor. Não havia se alastrado pelos reinados vizinhos porque a liberalidade imposta sofreu críticas contundentes dos outros soberanos. Havia um perigo iminente de gerar filhos ilegítimos naquelas relações espúrias e licenciosas, cuja ameaça aos direitos sucessórios dos herdeiros reais os deixava vulneráveis a revoltas e rebeliões dos bastardos. Além do que, configurava-se professo sacrilégio ao ritual da fidelidade sagrada no matrimônio. Reticentes, as esposas pouco se manifestavam a respeito da despudorada libertinagem do Rei Mor, atribuindo como resultado daquela prática abusiva e repugnante o castigo da sua esterilidade crônica. Aproximando-se a fase da lua propícia à realização de casamentos, Rei Mor tencionava cumprir, de uma vez por todas, o pacto celebrado com o Bruxo Neno, entregando-lhe por esposa a meiga e bela Murmur, para que o encantamento da tiara, pactuado desde o casamento do Rei Médium com a Rainha Gônia, finalmente se concretizasse, resultando na ansiada gravidez da Rainha Sissu. Convocando o Bruxo Neno em audiência, Rei Mor o informaria de suas intenções. Ao adentrar o Salão do Rei, encenou sua cordial saudação, diferenciada dos outros vassalos, que ajoelhados, tocavam com as mãos postas os joelhos do rei. Bruxo Neno preferia tocar-lhe diretamente nos testículos, pelo que lhe valeu o cognome de Bruxo Neno, o Puxa-Saco. Rei Mor cultivava a esperança, acreditando que os resultados dos feitiços encadeados pelo bruxo estariam prestes a acontecer. Reforçado pela confiança depositada nos poderes extraordinários do bridão encantado, também utilizado nos rituais orquestrados pela Feiticeira Zureta, mãe do Bruxo Neno, moradora do Reinado de Trindade há algum tempo, desta vez, acreditava o Rei Mor, o feitiço haveria de funcionar: conseguiria finalmente engravidar a Rainha Sissu. À época em que a Feiticeira Zuzu, a Sacerdotisa das Sombras, colocou-se à disposição do Rei Mor para formalizar o encantamento que propiciaria a gravidez da Rainha Sissu, concluindo o ritual, ela vaticinou: “Assim que mãe e filho habitarem num só Reino, duas crianças nascerão. Uma será concebida com fausto e riqueza, no leito da rainha. A outra, em modesto leito de servos. A beleza, a bondade e a formosura apenas a uma delas assistirá. A maldade, a pestilência e a feiura da outra em serpente se converterá e, antes que se casem, ambas se precipitarão ao encontro de um grande amor, uma na água e outra no fogo.” A derradeira parte daquele presságio deixou Rei Mor confuso, atordoado. Pediu que a Feiticeira Zuzu lhe explicasse o significado daquele presságio. Todavia, encerrado o ritual, a Sacerdotisa das Sombras não lembrava uma palavra sequer do que havia dito, tampouco saberia decifrar suas próprias previsões. A necessidade de compreender o enigmático vaticínio motivou Rei Mor requisitar Bruxo Neno em 263H. H. Entringer Pereira audiência especial para que traduzisse aquela sentença. Era conveniente também aproveitar a oportunidade para cientificá-lo dos costumes vigentes naquele reinado, quanto ao direito personalizado pelo soberano de dormir a primeira noite com a nubente de qualquer um dos seus súditos, principalmente sendo o noivo viúvo e a noiva virgem. Tão logo notificado da convocação do Rei Mor, o bruxo prontificou-se, adentrando o salão de audiências. Prostrou-se em reverência, conforme seu costumeiro modo, tocando-o nas intimidades e saudando-o, à semelhança do Mago Natu, quando se dirigia ao Grande Rei: — T.U.V.X.Z.! Respondendo à saudação, Rei Mor também repetia a sequência de letras, ainda que não soubesse o que elas significavam para o bruxo, nem o bruxo soubesse o que elas significavam para o rei. Indo diretamente à parte que lhe interessava, Rei Mor indagou: — Bruxo Neno, já aprendeste sobre as tradições do Reino de Trindade quanto ao direito de o rei deitar-se a primeira noite com as virgens casadouras? — Ora, ora, Senhor Rei. Não só aprendi como estou de acordo e considero muito justo. Vossa realeza bem sabe o que faz. Em vosso lugar, faria o mesmo. Rei Mor não manifestou muito interesse pela opinião do Bruxo Neno, esmiuçando a explicação sobre o costume para que ele não incorresse em engano, alegando insatisfação ou contrariedade com a determinação: — No entardecer do dia da próxima lua nova, tua mãe, a Sacerdotisa das Sombras, estará no Palácio de Trindade para celebrar teu casamento com minha serva Murmur. — Pelo que muito vos honro e agradeço, obsequiado e submisso à vossa real magnanimidade! — Hum, vamos ao que nos interessa: após a cerimônia, é prudente que desapareças, sumas do Palácio, porque meus guardas vão se pôr a procurar-te. São oito procuradores que usam na cabeça um capacete de chifres e, por isso, conhecidos como os Caçadores de Cornos. Saem aos pares, nas quatro direções do Palácio. Oculte-se muito bem, para que não o encontrem. No teu caso, não será difícil, pois conheces, pelo que me dizes, a arte de ficar invisível. Ainda assim, certifique-se antes de que tens mesmo esse poder. Caso os guardas te encontrem ou descubram onde te metestes, serás passado a fio de espada. Cuide afastar-se para um local onde meus Caçadores de Cornos nem sintam teu cheiro. Para que tua esposa não amargue o infortúnio nem lamente ser abandonada, sentindo a solidão da primeira noite de núpcias. Fique sossegado, pois terá ao seu lado a honrosa companhia de ninguém menos que o próprio Rei de Trindade, mas só, o que é uma pena, até a meia-noite... Depois disso, poderás voltar ao teu leito. Assim reza o nosso costume. — Assim será, amado Rei Mor. — Bruxo Neno, melhor que sejas conformado. Já que quanto a isto estamos concordes, há uma questão da qual necessito ouvir teu entendimento e pedir-lhe um palpite: decifra-me o enigma proposto pela Sacerdotisa das Sombras, tua mãe, quando celebrou aquele ritual para engravidar a Rainha Sissu, que já te relatei. 264H. H. Entringer Pereira — Repita-me as palavras que ela pronunciou, magnificente e justíssimo Rei Mor. — Já te disse, não lembras? — Sim, sim, meu Rei. Apenas desejaria ouvi-las de vossa real boca... — Diga-me o que significa aquela parte do presságio “A beleza, a bondade e a formosura apenas uma assistirá. A maldade, a pestilência e a feiura da outra em serpente se converterá, e antes que se casem, ambas se precipitarão ao encontro de um grande amor, uma na água e outra no fogo”. — Meu Rei, muito fácil entender o que determina este enigma. Diz que vossa filha será a mais bela e formosa dentre todas as mulheres. A outra criança será gerada na cama de servos, então só pode que seja diferente da que vai nascer na cama da rainha; ambas, ambas... bem... hum... hum... Ambas... O que será mesmo ambas? Deixe-me ver. Rei Mor, ansioso para ouvir o restante da explicação, julgou que o Bruxo Neno tencionava esconder-lhe o verdadeiro sentido da predição. — Não me poupes a verdade. Ambas quer dizer as duas... — Ah, sim, sim, as duas... bem... devem ser ambas... — Vamos, fale de uma vez, o que acontecerá com ambas? — A que não é a vossa filha se transformará numa grande serpente e se precipitará nas águas e vossa filha se jogará no fogo... sim é isso! — Não, não é isso! Não pode ser isso! Como condenaria eu minha própria filha à fogueira? Como poderia a filha de um rei desejar se queimar? Também tu tampouco soubestes decifrar este enigma. — Que vos parece, então, Senhor Rei Mor, esta predição? Julgas que a Sacerdotisa das Sombras mentiu? — Não, não. Isto é que me intriga. Algo que eu não consigo compreender; no fundo, no meu íntimo, parece-me lógico, muito lógico... Sinto que serei enganado pelo meu próprio engano. — Não vos incomodeis, Senhor Rei. Poderei modificar esta predição, com melhor resultado. Se vossa realeza bem recorda, o encantamento que fiz naquela joia da mãe do “Y” há de vos trazer um filho homem em breve, eis que vossa rainha logo, logo se encontrará grávida. — Assim espero, Bruxo Neno. Então, era isso. Prepare-se para desposar Murmur. Terás uma esposa terna, amorosa, fiel, obediente e devotada ao lar. Em troca, já sabes os favores que me deves... Lembre-se: não revele a Murmur vossas feitiçarias. É mais seguro que ela nem desconfie das tuas proezas. — Senhor Rei Mor, não sou apenas um bruxo. Entendo também das artes do amor. Já fiz para Murmur belos poemas. Ela nem desconfia que no meu peito de feiticeiro bate acelerado e inteiro um coração apaixonado e verdadeiro. — Sabes fazer poemas? — Dos mais belos que Vossa realeza imaginar. Não sei escrever, mas sei declamar! — Verdade? Então recita-me um deles, para ver se és talentoso, como dizes, nesta arte. 265H. H. Entringer Pereira Bruxo Neno sentiu-se por demais lisonjeado, estufou o peito e para impressionar, como se dirigisse a uma grande plateia, recitou: “Bela Murmur, Dos segredos de minh ’alma, guardo apenas um na vida: Ardente paixão, amor sem fim, que num momento em mim nasceu. Mal sem cura, dor escondida. E quem me enfeitiçou, nem sabe o que sou eu. A seu lado sou um nada, sombra perdida Pobre homem que nem eu reconheci, pois esse amor hei de tratar como ferida, Sabedor que tudo dei e nada recebi. Essa deusa tão pura, terna e distante, que passa por mim é Murmur, a flor da fonte do amor que é meu, a acompanhar-lhe constante. À natureza que a fez assim serena e bela, Pergunto: Por que a quero, se nem a mim percebe? Meu coração é quem responde: ame-a apenas e será bastante.” Rei Mor, impressionado com a declamação, não conseguia crer no que ouvira. Bruxo Neno não parecia possuir talento, nem instrução suficiente para ser autor daquela composição. Menos ainda porque o próprio rei havia escrito alguns sonetos inspirados na beleza singela de Murmur, e havia um com aquele título que era semelhante ao que o bruxo declamara. Desconfiou de que ele havia mexido nos seus secretíssimos guardados e... copiado exatamente aquele dentre os papiros que escondia no escritório. Contudo, até onde conhecia de suas habilidades, Bruxo Neno não aprendera a ler, nem a escrever. Convencendo-se de que qualquer coração apaixonado seria capaz de semelhante inspiração romântica, sugeriu ao Bruxo Neno, para disfarçar o ciúme que sentira, que o declamasse a Murmur como confissão de amor, quando terminasse o cerimonial de suas núpcias. O bruxo, com uma pitada de ironia, contra-argumentou, ressentido: — Não poderei recitá-lo, porque sois vós quem tereis o direito de ser o primeiro a se deitar com Murmur... — É verdade, é verdade... terás tempo de sobra para lhe dizer quantos poemas quiseres depois... depois, Bruxo Neno. A inflexibilidade do Rei Mor e sua resoluta firmeza quanto ao cumprimento do costume que havia imposto – o jus primae noctis – deixara o bruxo profundamente insatisfeito, desgostoso e aborrecido. Não podia manifestar seu descontentamento diante do que considerava o maior abuso do poder do rei, nem poderia reclamar para que Rei Mor revogasse a norma, porque ouvira claramente o tipo de punição impiedosa reservada aos insatisfeitos. Era melhor fazer de conta que se sentia honrado com a participação do soberano na sua noite nupcial. No entendimento do bruxo, a paixão avassaladora que sentira por Murmur, seu devotado e secreto romantismo, poderiam ser levados em consideração, abrindo-se exceção ao costume. Todavia, julgando pelas assertivas do rei, nenhum arrazoado poético, nenhuma paixão febril explícita, seriam capazes de demovê-lo da ideia para 266H. H. Entringer Pereira revogar a imposição, principalmente porque Murmur além de bela, era casta, obediente e submissa. Uma gigantesca onda de ciúme brotou no coração do Bruxo Neno e turvou-lhe a razão. Tal como furacão de rancores, planejou sua vindita arquitetando, com velocidade de corisco, sua maligna trama: enquanto o rei estivesse na cama com Murmur, iria, em contrapartida, dar um jeito de meter-se sob os lençóis do próprio rei, na cama da Rainha Sissu. Não poderia se vingar de modo melhor. Enquanto o rei desfrutasse as primícias com Murmur, ele iria se ocultar dos Caçadores de Cornos nos lençóis macios e cheirosos da Rainha. Não sentia por ela o mesmo desejo que sentia por Murmur, porque era feia e tinha olhos vesgos, mas àquela ocasião não haveria, por certo, local mais seguro a salvo dos sanguinários guardas mascarados com capacetes de chifres. Feliz com a ideia que lhe ocorreu, evitou transparecer ao Rei Mor seu bem planejado contra-ataque. Uma derradeira coisa, entretanto, sentiu vontade de perguntar ao Rei Mor, antes de sair da audiência: — Bondoso e magnificente Rei Mor, qual foi o derradeiro casamento que vossa realeza celebrou no Reinado de Trindade? — Por que perguntas? Acaso já soubestes do que aconteceu a Chupinguaia? — Sim, majestoso rei. Perguntei porque ouvi vossa realeza dizer que, se for encontrado pelos Caçadores de Cornos, serei passado a fio de espada, não é isto? — Perfeitamente. — Mas, me desculpando o atrevimento, não foi este o castigo que destes ao derradeiro marido encontrado pelos caçadores de cornos? — Refere-te ao que se precipitou na cachoeira? — Esse mesmo. Mudais a sentença de morte conforme vossa volúpia? — Cabe somente ao rei, Bruxo Neno, decidir o que fazer com o marido apanhado pelos Caçadores de Cornos. No caso que mencionaste, o infeliz Chupinguaia escondeu-se no alto da Cachoeira dos Namorados. Encontrado pelos guardas, antes que o agarrassem, preferiu ele mesmo sentenciar-se à morte, jogando-se penhasco abaixo. Certamente queres chegar no nome que colocaram naquele lugar, depois do lamentável episódio. — Por causa daquele acontecimento é que deram nome ao local de Chupinguaia? — Exatamente, Bruxo Neno. O idiota do Chupinguaia se matou, ao se jogar sobre as pedras, espatifando-se. Tingiu de sangue, então, as águas daquele rio. Por isso é que Chupinguaia virou sinônimo de rio de sangue. Também denominaram a Cachoeira dos Namorados de Rio de Chupinguaia... A propósito, estás planejando te meteres lá para as bandas da Cachoeira de Chupinguaia? O Bruxo Neno deu um sorrisinho irônico e respondeu sarcástico: — Não, majestoso Rei Mor. Não vou me enfiar em maus lençóis. Tenho lugar melhor pra me meter! — Sorte tua, Bruxo Neno. Sorte tua e azar o meu se não te pegarem! — T.U.V.X.Z.! – exclamou o Bruxo, ensaiando uma reverência. Bruxo Neno saudou-o cortesmente a sua maneira, achando engraçado que na saudação enigmática ao 267H. H. Entringer Pereira Rei Mor, ele gostaria mesmo de ter dito: “T.erás U.m V.ingador, X.avecado Z.umbaieiro”. Rei Mor respondeu à saudação com trejeitos de desprezo: — T.U.V.X.Z.! Também o Rei Mor gostaria de ter dito ao Bruxo Neno: “T.ua U.biquidade V.ai X.aropar Z.ureta”, porque já se arrependera do que havia pactuado com o bruxo, meses antes, lá no Império do Elo Dourado. Além de estupidamente vaidoso, gabola, prepotente e invejoso, a mania do bruxo, desde que chegara ao Reinado de Trindade, de imitá-lo no jeito de se trajar, no modo de andar, de falar e de usar a cabeça raspada, que a nenhum outro vassalo o rei permitia, desagradava-o sobremodo, e tanto pior: em qualquer lugar do Palácio de Trindade a que o Rei Mor se dirigia, à exceção de seus próprios aposentos, encontrava sempre o Bruxo Neno fazendo firulas com os subalternos. Parecia que o bruxo estava em todos os lugares ao mesmo tempo. O rei sentia invadida sua privacidade, como se estivesse constantemente vigiado e perseguido pelo bruxo. Rei Mor estava prestes a arranjar boas desculpas para convencê-lo a se mudar depois do casamento com Murmur para as proximidades do local onde morava a mãe dele, a Feiticeira Zureta. Precisava de muito tato e uma boa quantidade de paciência, porque indispor-se àquela altura contra a pessoa do Bruxo Neno, era cutucar, sem dúvidas, o diabo com vara curta. Pela demonstração de poderes que Rei Mor já havia presenciado e pelas abomináveis proezas que o bruxo realizara, era imprudência sem conserto colocar-se no raio da mira de sua vingança maligna. Rei Mor conformando-se, cumprimentou-o respondendo secamente a sua saudação e ponderou sua precedência sobre o presunçoso bruxo, regozijando-se intimamente, pela primeira noite de núpcias que logo, logo haveria de desfrutar com a futura mulher, a bela esposa do inconveniente bruxo!
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Resistindo a escassez de água, a terra e seu milagre a olho nu. Agora é continuar a fazer a cobertura do solo, matéria orgânica disponível.
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Quando criança, minha mãe fazia polvilho de araruta. Com este, bolinhos maravilhosos. Me lembro também, que meu pai ia para a roça e voltava com um balaio de Jacatupé. Uma trepadeira da familia dos feijões, mas, segundo informações, não se utiliza as sementes como alimento. Apenas para propagação. Jacatupe - o feijão que se come a batata - Lembra a batata Yacon. Ganhei do Senhor Mario Fernandes Magalhães de Ubá - MG.
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URUCUMACUÃ By H.H.Entringer Pereira - LIVRO 3 - CAP. 64
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DEPOIS DO CASAMENTO DO REI Professora Plínia prosseguia suas narrativas, aguçando a curiosidade do Príncipe Urucumacuã, que se mostrava cada vez mais interessado que ela contasse logo, não deixando para depois, o que havia acontecido nos dias da festa de seu nascimento e de seu irmão, Príncipe Kurokuru. Com muito tato e paciência, ela explicara que todas aquelas narrativas, ainda que paralelas aos acontecimentos durante e depois do casamento do Imperador, Rei Médium, com a Imperatriz Rainha Gônia, eram importantes. Precisava conhecer não só o que se passara no reinado de seu pai, como também nos reinados vizinhos. — Um dia, haverás de exercer também teu direito ao Trono e à Coroa deste fabuloso império. Príncipe Urucumacuã ouviu quieto, mas de vez em quando interrompia as narrativas, perguntando sobre alguns personagens que já conhecia e por outros cujas histórias despertavam-lhe especial interesse. Queria saber tudo sobre Rainha Alzira, Rei Naldo, Conde Rasku e, principalmente, Rei Mor e Bruxo Neno. — Calma, Urucum. Temos muita coisa para lhe revelar. Vou primeiro, falar tudo sobre o que aconteceu antes que tu nascentes... porque sobre o que aconteceu nos primeiros tempos de teu nascimento, saberás mesmo, quando regressares do Santuário do Mago Natu, após as quatro estações de tua iniciação. — Quanto tempo terei de ficar com o Mago Natu? — Exatamente quatro estações: um outono, um inverno, uma primavera e um verão. — Por que meu irmão não irá comigo? — Por que vossos caminhos são diferentes. Um andará pelo Caminho do Fogo e o outro pelo Caminho da Água. Ainda sem entender o que aquela profecia significava, o Príncipe Urucumacuã pediu à Professora Plínia: — Podes me contar a história do encantamento da Marquesa de Sonça na Onça Pintada? — Primeiramente, vamos concluir alguns acontecimentos de quando nasceu o Príncipe Gesu Aldo, este que deverá se casar com a tua irmã, esta que nasceu na semana passada; depois saberás do casamento do Bruxo Neno com a serva do Rei Mor, a bela Murmur e vamos concluir então com o que estás me pedindo. A história do teu nascimento contarei quando voltares do Santuário do Mago. No Palácio das Esmeraldas, a Rainha Alzira aguardava, ansiosa, a chegada do filho Calico e da nora, Rainha Araci, para se inteirar das novidades registradas no casamento do Rei Médium com Rainha Gônia, agora Imperador e Imperatriz. Um sonho na noite anterior muito a inquietara. Acordou chorando, porque vira participando de uma outra festa de casamento seu outro filho, o Conde Rasku, e sua odiosa rival, a viúva Pan Thera, Marquesa de Sonça, vizinha das terras do Condado de Rasku, dançando numa frenética orgia ritual, celebrada por sua arqui-inimiga, a Feiticeira das Sombras. A viúva Pan Thera, subitamente, por artes de encantamentos que a Rainha Alzira sabia como funcionavam, transformava-se numa fera ao mesmo tempo terrível e 252H. H. Entringer Pereira encantadora, ameaçando devorá-la. As imagens muito vívidas daquele sonho deixaram Rainha Alzira apreensiva, já que detestava a Marquesa de Sonça com todas as forças do seu coração, porque em épocas passadas, durante uma festa no solar da marquesa, esta lhe servira intragável bebida que lhe causou grande mal-estar e quase a matara. Julgou que fora vítima de tentativa de envenenamento porque a marquesa não disfarçava sua desmedida cobiça pelas famosas e perfeitas esmeraldas que lhe pertenciam. Muito mais lhe odiava ainda porque soube pelo honrado Intendente das Finanças e Justiça, o Marquês de Contagem, que o pai fora aprisionado porque se escusara de obedecer ordem do Rei Albe, o Rico, para levar um mimo à marquesa, Senhorita Pan Thera, consistente numa caixa de prata cheia de esmeraldas, tão logo Rainha Alzira se ausentara numa demorada viagem em visita a sua já falecida prima, a Rainha Olinda, mãe do Rei Médium. Rainha Alzira também sabia que, antes de a Feiticeira Zuzu, a Sacerdotisa das Sombras, se mudar para o Reinado de Trindade, negociara por alto preço com a Marquesa de Sonça o maldito bridão encantado, que ela mesma ordenara entregar à feiticeira, logo depois da tragédia que culminou no enforcamento de seu marido, o Rei Albe, o Rico. Conde Rasku, desde a época do casamento e da coroação do irmão Calico como Rei de Avilhanas, mudou-se para as terras que ganhara de sua mãe, a Rainha Alzira, num jogo de dados, denominando-as de Condado de Rasku, e não mais a visitara. Quase três anos se passaram sem que o Conde Rasku viesse ao Palácio das Esmeraldas. Rainha Alzira sabia notícias esparsas de seu filho porque, além de ser o homem mais belo entre todos os nobres que circulavam por aquelas regiões, tinha fama inigualável de perverso, cruel e sedutor incorrigível. As notícias do filho, geralmente ligadas a acontecimentos pouco edificantes e honrosos, traziam mais desgosto do que alegria à rainha. Para distrair-se e espairecer suas angústias, Rainha Alzira subiu à galeria onde pintava seus quadros — as calic’aturas. Ficou olhando e apreciando-os, admirada de como sua coleção aumentara: havia acrescido algumas outras, além de seus antepassados: o Louco, o Mago Natu, o Imperador Médium, a Imperatriz Gônia e o rei enforcado. Do sonho que tivera, sentindo-se saudosa e aflita pelo filho desnaturado, que não via desde o casamento de Calico, pôs-se a pintá-lo, retratando-o como sonhara: vacilante entre a pretensa noiva e ela própria, sua mãe, alvo certeiro da flechada do implacável Cupido. Deu ao quadro o nome O Enamorado. Nas derradeiras pinceladas em recente obra de arte, ouviu o troar da trombeta do Arauto Real. Pelo tropel da Guarda palaciana, deduziu que a comitiva do Rei Naldo chegara. Guardou rapidamente todo o material espalhado sobre mesas e cavaletes, descendo as escadarias com o coração mais tranquilo. Para sua surpresa, não só a carruagem do Rei Naldo com a Rainha Araci adentrava o pátio do Palácio das Esmeraldas como também o garboso alazão negro do filho temperamental e intratável, mas impressionantemente belo, o Conde Rasku. O primeiro a abraçá-la, desculpando-se pelo longo tempo de ausência, Conde Rasku, de coruscantes olhos azuis, barba crescida e cabeleira selvagemente desalinhada, podia não ser o melhor dos filhos, de caráter dócil e amável igual ao irmão, mas 253H. H. Entringer Pereira inegavelmente era o homem mais belo que já existira, o mais bonito de todos os outros príncipes daquela época. Esquecendo-se das amarguras e sofrimentos que o belo filho, ao longo da infância até a juventude lhe proporcionara, em razão de seus comportamentos cruéis com os animais, temperamentos irascíveis com os serviçais e atitudes odiosas para com seu único irmão, Rainha Alzira o abraçou ternamente, emocionou-se ao ouvir-lhe as batidas do coração e, num relâmpago de lembranças, o pensamento lhe trouxe à memória o mágico momento e a dramática situação em que ele havia sido concebido. Rasku percebeu a fragilidade emocional de sua mãe, fitando-lhe friamente o rosto já sulcado pelo tempo, mas ainda belo, indagando-lhe: — Já sabes que estou noivo e pretendo me casar? — Como saberia, se a notícia ainda não chegou por aqui? – respondeu-lhe a mãe, acrescentando – Mas não me custa adivinhar com quem... — Ah, duvido que acertarias – interrompeu-a. — Antes que me possas revelar, asseguro-te que não faço gosto, tampouco teu irmão aprovará – disse, com firmeza, Rainha Alzira. – Conversaremos depois. Preciso abraçar Calico e Araci. Vamos, entre! À hora do jantar, sob a luz bruxuleante dos archotes e dos castiçais sobre a mesa, o lugar costumeiro da Rainha Araci permaneceu vazio. Rei Naldo justificara a ausência dela alegando excessivo cansaço pela longa e penosa viagem, agravado pela adiantada gravidez. Conde Rasku, sentado à frente de sua mãe, desdenhou da forma como Calico expressara suas desculpas pela ausência da Rainha Araci e provocou: — Diga a tua maravilhosa e barriguda rainha que não precisa mais ter medo de mim. Agora sou um homem comprometido. Além do mais, as unhas da marquesa são bem mais afiadas que as dela. — Rasku, por favor – interrompeu Rainha Alzira – respeite a mulher do seu irmão e não se esqueça de que estás diante do Rei de Avilhanas! O menino Mulato, filho que Calico teve na sua adolescência com a moça Alba, também se sentava à mesa, ao lado de Rainha Alzira. Ainda que não falasse, Mulato sentia pela expressão do rosto que o conde não lhe dirigia olhares de simpatia, porém, na qualidade de mudo que era, apenas observava o clima de animosidade transparente entre os dois irmãos. Fitando Mulato com severidade e desprezo, Rasku prosseguiu em tom provocativo: — Mudemos de assunto. Rei Naldo, como permitis que o bastardinho mudo coma a tua mesa? Não seria o estábulo o lugar mais adequado a ele? Antes que Rei Naldo abrisse a boca para responder ao insulto, Rainha Alzira adiantou-se e, no rompante, posicionou-se em defesa do neto, a quem muito amava: — Conde Rasku, um bastardo a mais ou a menos nesta mesa, não fará diferença ... Também tu poderias ser tratado como tal, não fosse a benevolência do teu irmão Calico. Houve silêncio. O Senhor Louco, que resolvera morar definitivamente no Palácio das Esmeraldas a convite da Rainha Alzira, desde os tempos da tragédia do enforcamento do Rei Albe, o Rico, distante da cabeceira da mesa onde Rei Naldo e Conde Rasku estavam, até então não prestara atenção no que conversavam porque não 254H. H. Entringer Pereira ouvia os diálogos, dada a extensão da mesa e a conversa animada dos outros cortesãos. Percebendo que o clima entre eles modificara e a descontração inicial daquele jantar não era a mesma, adiantou-se, levantando-se como de costume, e iniciou um número na tentativa de distrai-los até a hora da sobremesa. Usando um jogo de palavras que lembrava uma brincadeira de crianças, o Louco cumpriu sua tarefa, começando pelo nobre visitante Conde Rasku: — Meu nobre, o que és? És conde? Onde escondes? Escondes o Conde? Ou és Conde que esconde? Se escondes, não és Conde! Então, nobre Conde, escondes... Se és Conde, não escondes! A maioria dos comensais se divertia. Conde Rasku apenas esboçou um sorriso pouco à vontade, tentando disfarçar o estranho sentimento que brotara pelas palavras de sua mãe. Rainha Alzira pouco se importou com a falta de educação e o sarcasmo do filho, gargalhando com a engenhosidade e a malícia interpretada nos trocadilhos do Louco. — Amigos – dirigiu-se a Rainha Alzira aos cortesãos – poucos dentre vós sabeis o que o Conde Rasku tem para anunciar. Diga, formoso Conde, qual é a novidade que nos trazes? Aparentemente desconcertado com a brincadeira do Louco e pensativo sobre o que ouvira de sua própria mãe, para não perder a pose, Conde Rasku manifestou-se arrogantemente: — Senhoras, senhores, bem sabeis que também tenho um coração, ainda que minha fama de desalmado percorra o mundo. Quero anunciar-vos que pretendo me casar com a Marquesa de Sonça, aqui mesmo, no Palácio das Esmeraldas, ou no Solar da Marquesa. Daqui a sete luas cheias, irei ao casamento do Bruxo Neno, no Palácio de Trindade, e quando voltar, direi a todos qual a data marcada para as minhas bodas. Aguardem, portanto, meu regresso e preparem-se para a maior e melhor festa de casamento de todos os tempos. — És tu, então, nobre Rasku, quem usará o bridão encantado? – perguntou o Louco, em tom de zombaria. — Já passas de insolente, amigo Louco. Vou me casar porque estou apaixonado. – justificou-se. — Contenha-se, Rasku. Ele está apenas brincando. No mais, a história daquele bridão já causou sofrimento bastante a todos nós – ponderou Rainha Alzira. – A mim, custa admitir que alguém tenha interesse na posse de um objeto que serviu de instrumento à morte do próprio pai. O clima do jantar não se apresentara propriamente festivo pela chegada do Rei Naldo e da Rainha Araci, pois o contraponto do aparecimento do Conde Rasku inquietara a todos, principalmente aos pais das donzelas de Avilhanas. A beleza sedutora de Rasku era perigosamente temperada por suas práticas pervertidas e comportamentos abertamente depravados. Ainda que estivesse comprometido a se casar, era pouco confiável e ardiloso por excelência para seduzir e desonrar mulheres jovens ou matronas, casadas, solteiras ou viúvas. 255H. H. Entringer Pereira Causara surpresa o anúncio do casamento do Conde Rasku com a Marquesa de Sonsa porque, embora apetrechada de grande beleza e sensualidade, era o dobro da idade mais velha do que o noivo, e circulavam rumores de que o primeiro marido da marquesa teria morrido com menos de um ano de casado, por esgotamento físico, face às incontroláveis exigências e ao insaciável apetite de alcova da mulher. Nas conversas entre servos e plebeus, o comportamento indomável da Marquesa de Sonça era assunto pontual. Dizia-se que entre suas predileções sexuais, além de homens jovens e bonitos, também se incluíam algumas belas jovens, e não eram incomuns reuniões em que as orgias duravam dias seguidos, quando a marquesa achava por bem festejar suas datas de aniversário. O próprio Conde Rasku frequentara vez por outra o mal afamado Solar da Marquesa e se jactava de já ter passado por lá semanas na esbórnia, entre efebos e belezuras que se davam aos prazeres sensuais, sem limites e sem censuras. Rainha Alzira sabia de alguns dos desregramentos do filho, mas cultivou por algum tempo a esperança de que Conde Rasku viesse a se casar com uma nobre dama, de fino trato, pudica e prendada para compensar e equilibrar-lhe o temperamento cruel e libertino. Ainda que seu caráter se lhe afigurasse, às vezes, tão sórdido, a beleza do rosto e do corpo eram predicativos que, certamente, serviriam como recompensa ao resgate de alguma nobre virtude que nele ainda estaria incógnita – o que uma mulher verdadeiramente amorosa, virtuosa, fiel e paciente poderia tornar à superfície. De outra parte, Rainha Alzira reconhecia no caráter do filho o temperamento sagaz e impetuoso, concordando que fosse ele o marido ideal, talhado sob medida, para impingir toda sorte de sofrimentos e provações à despudorada, astuta, ambiciosa e depravada, mas certamente apaixonada Marquesa de Sonça. Haveriam de formar um belo par. Ele, belo, sórdido e cruel. Ela, linda, sensual e pervertida. A despeito das insanáveis destemperanças de ambos, ele era o que de melhor poderia ocorrer para transformar a vida da marquesa num inimaginável e prolongado martírio. E ela, astuta e libertina o suficiente para fazê-lo viver um constante inferno. Algo, no entanto, ocupava mais o pensamento da mãe do que as vicissitudes pessoais do filho e da Marquesa de Sonça naquele momento. Chegara a hora de revelar o segredo ao Conde Rasku de sua misteriosa paternidade. Somente a Rainha Alzira e o Mago Natu compartilhavam tal segredo a todos ocultado: o menino Rasku não era filho legítimo do Rei Albe, o Rico. Era filho de Adul Thero, conhecido por toda a Corte pelo apelido de Senhor Dugo — o dileto e fiel feitor da Rainha Alzira, assassinado pelo Rei Albe, o Rico, sem motivos aparentes, dadas às circunstâncias misteriosas em que foi encontrado, na mesma noite em que o rei também se suicidara. A dessemelhança entre o Conde Rasku e seu meio-irmão, Rei Naldo, dizia mais respeito ao temperamento do que ao porte físico. Ambos eram notáveis cavaleiros, belos e saudáveis. Rei Naldo, mais introspectivo e sério, pouco conversava, mas, amiúde, dava provas de sua bondade, nobreza e equidade. A beleza do Conde Rasku, todavia, se notabilizava, pois além dos coruscantes olhos azuis e dos anelados cabelos castanho-dourado, seu sorriso perfeito, seduzia e, ao mesmo tempo, ocultava o que possuía de pior no seu caráter: era malicioso e cruel, além de pérfido e egoísta. 256H. H. Entringer Pereira Não havia mais razões, porém, para postergar a revelação de sua origem ao Conde Rasku. O Reinado de Avilhanas já tinha seu rei e prosperava em paz. E o anunciado casamento conferia ao conde o direito de conhecer toda sua estirpe, para que pudesse construir a própria árvore genealógica, inaugurando por conseguinte nova linhagem. Face à maneira sempre correta com que se conduzira e sua devotada fidelidade à memória do marido falecido, Rainha Alzira não dava margem às especulações nem aos mexericos a respeito de sua última gravidez. Pela contagem do tempo, desde que Rei Albe, o Rico, fora encontrado enforcado até o nascimento do menino Rasku, passaram-se exatamente as nove luas cheias: para todos os efeitos, a última coisa que Rei Albe, o Rico, teria feito por derradeiro na sua vida, antes do suicídio, fora um filho. E este filho era Rasku. Disposta a enfrentar o gênio indômito, arrebatado e irascível de Conde Rasku, procurou apoio no filho Calico, o Rei Naldo, de ânimo mais generoso e pacífico, solicitando-lhe o conselho que até então evitara pedir por lhe faltar coragem de compartilhar com ele sua própria infâmia e ignomínia. Não havia alternativas. Chegara a hora, afinal. A sós com Rei Naldo, Rainha Alzira abriu o coração: — Calico, meu filho, não imaginas quanto me custa confessar-te, neste momento, o segredo mais bem guardado de toda a minha vida. — Se vais me contar que Rasku não é meu irmão por parte de pai, não te aflijas. Desde que nos disseste sobre o feitiço da besteira e da aparição da Mula Sem Cabeça, já o imaginava. — E teu irmão, também desconfia? – indagou-lhe preocupada. — Não que eu saiba. Afinal, somos fisicamente muito parecidos. Nossas principais diferenças residem tão somente no caráter. — Tanto melhor. Achas que Rasku já pode saber que não é filho do teu pai? — Minha mãe, ainda que estejas confirmando que Rasku é meio-irmão meu, não revelastes quem é seu pai verdadeiro. Permite-me o atrevimento? — Evidente. Queres que eu mesma diga ou preferes me dizer? — Se eu não acertar, confias em me dizer? — Sim. Quem tu achas que pode ser o pai de Rasku? — O Senhor Dugo, certamente. E, talvez por isso, meu pai o tenha assassinado. Rainha Alzira começou a chorar. Abraçou-se ao filho, balbuciando, entre soluços, a pergunta cuja resposta precisava ouvir do Rei de Avilhanas: — Tu me perdoas? — Ora, minha mãe. Quem sou eu para vos repreender? Nada sinto contra vós e bem compreendo os motivos que vos levaram a tão grave despautério, àquela asneira desmedida. — Quanto a Rasku, não posso mais ocultar-lhe a verdade, mesmo temendo sua odiosa fúria... Pelo que o conheço, será capaz de matar-me ou me odiar, desejando vingar-se pelo resto dos meus dias. — Poupe-se, então. Melhor que não saiba. Nem a Araci vou revelar o que a mim confiastes. Guardarei vosso segredo. 257H. H. Entringer Pereira — Seria mais confortável... Mas não conseguirei ocultar de Rasku a realidade, porque no dia de seu casamento terei de lhe entregar a arma paterna, o sabre de Adul Thero. — Nesse caso, todos ficarão sabendo quem é o pai do Conde Rasku – contrapôs o Rei Naldo. — Ele vai me odiar. Tenho receio de sua impetuosidade. Conheço suas inclinações para a vingança – conjeturou Rainha Alzira. – Achas que Rasku seria capaz de odiar ao ponto de querer me matar? — Que ele vos odiará, não duvido. Mas não vos mataria antes que descobrisse onde estão os vossos 144 quilos das esmeraldas que meu pai ocultou, enterrando em algum lugar. É melhor que não procureis, nem mesmo encontreis este tesouro... se quereis viver depois de contar a Rasku quem é seu pai – falou Rei Naldo, em tom de brincadeira. — Estou pensando: Rasku jamais conhecerá seu pai, tampouco a Adul Thero foi dado o direito de conhecer o filho... Estranhas armadilhas do destino. Sinceramente, ainda não decidi. Pensando melhor, já nem sei se devo revelar... Se Mago Natu estivesse aqui, pediria a ele para que contasse. — Mãe, vós me pedistes um conselho. Na cerimônia, quando Rasku se casar, entregue-lhe o sabre do Senhor Dugo, sem alardes, nem muito palavreado. Simplesmente como tributo póstumo e devida homenagem à memória daquele que foi seu fiel servo. Assim como o Rei Albe, o Rico, morreu levando consigo o segredo de onde enterrou vosso grande e precioso tesouro, assim também morreu com o Senhor Dugo o segredo de Adul Thero, pai do Conde Rasku. — Faremos então um pacto: quando eu descobrir onde estão minhas esmeraldas, direi ao Conde Rasku de quem ele é filho. Rainha Alzira saiu do Salão do Trono e, ao abrir a porta, deparou-se com Conde Rasku. Surpresa com a presença do filho naquela hora, passou-lhe pela cabeça a possibilidade de que já estivesse ali há alguns minutos, ouvindo certamente seu diálogo com o Rei Naldo, atrás da porta. Todavia, não percebeu mudanças no seu semblante, e pela forma com que a abraçou, saudando-a, certificou-se de que ele havia chegado naquele momento. — Salve, salve, Mãe Rainha. Viestes confabular com Calico sobre o meu casamento? — Não exatamente, meu filho! Conversávamos sobre as minhas esmeraldas que o Rei Albe escondeu... Tens algum palpite a respeito? — Por que não mandas cavar no local onde ele se enforcou? — Já o fiz. No exato lugar onde havia sinais de terra revolvida, acharam enterradas as cabeças do Senhor Dugo e da Mula Tá. Ah, e antes de encontrarem as duas cabeças, retiraram da cova um sabre com o nome de Adul Thero gravado na lâmina. Queres portar aquela arma no dia do teu casamento e com ela permanecer, como homenagem ao mais fiel de todos os servos reais? — É da forja de Kalibur? — Certamente. Pela têmpera e beleza, não poderia ter sido de outro artífice. — Então considere-a minha. E do meu pai, o que dar-me-ás? 258H. H. Entringer Pereira — A porção de terras que pertenceu ao Senhor Dugo, contíguas às do teu Condado, para que acrescenteis ainda mais às tuas posses algo do teu pai. Conde Rasku não compreendeu que a porção de terras a que sua mãe se referia, que acrescentaria àquelas que já possuía, era, de fato, a herdade de seu legítimo pai. Naturalmente satisfeito pelo quinhão prometido, imaginou que talvez pudesse estar escondido naquelas plagas do reinado o tão cobiçado e precioso tesouro da Rainha Alzira: as maravilhosas e valiosíssimas pedras verdes. Adentrando sem cerimônia o Salão do Trono, Conde Rasku negou-se observar o protocolo para falar com o Rei de Avilhanas. Enquanto Rei Naldo anotava em finas lâminas de ouro mensagens para convidar os reis vizinhos, seus filhos e outros amigos nobres para festejarem o nascimento de seu primogênito, o príncipe herdeiro, prestes a acontecer, o irmão o interceptou com uma saudação que usavam desde os tempos de adolescentes. Levantando os olhos das folhas de ouro, sem interromper seu trabalho, respondeu à saudação do irmão, perguntando: — O que desejas, Conde Rasku? – voltando os olhos ao que fazia, continuando a tarefa. — Vim saudá-lo, primeiramente, majestoso Rei Naldo, Senhor de Avilhanas. Na qualidade de vosso irmão, penso que agradaria muito à nossa mãe que tivéssemos um relacionamento mais cordial e amigável. — Nunca fui teu inimigo, em princípio... — Mas ainda não me perdoastes pela infelicidade do flagrante na cama com Alba. — Coisas passadas, meu caro irmão... O amor do meu filho Mulato, hoje me recompensa da vergonha que me fizestes sofrer; e pela verdadeira paixão de Alba por mim. Não fosse o trágico final que resultou no sutil encantamento dela naquele pássaro, a Albatroz, teria me casado com ela e não com Araci, arcando com o castigo de perder o direito ao trono deste Reinado. — Neste caso, seria eu o rei de Avilhanas? — Serias. O que farias, fosses tu rei de Avilhanas? Porventura encontrarias o tesouro escondido pelo Rei Albe, o Rico? — Certamente. Não dormiria até descobri-lo. Onde achas que estão as misteriosas pedras verdes? Não tens gana de possuí-las? — Conde Rasku... como és ingênuo, apesar da tua insidiosa malícia... — Por que assim me julgas, Rei Naldo? Achas incorreto alguém pretender o que lhe é de direito? — Nem tanto. Parece-me incorreto, meu nobre irmão, pleitear o que por direito não lhe é pertinente. — Reputa-me indigno do meu quinhão? — Em absoluto. Discordo da irrefletida ânsia e desta aflição desvelada por te assenhorear daquele tesouro, cismando em fazer-te rico. Não te esqueças de que antes de nós dois, as preciosas pedras verdes pertencem de fato à nossa mãe, cabendo a ela querer ou não as encontrar. 259H. H. Entringer Pereira — Calico, nossa mãe já desistiu de seus sonhos. Mesmo porque nada lhe interessa mais, nem se ocupa atualmente de outra coisa que não pintar quadros de mau gosto e tocar cavaquinho. — Rasku, Rainha Alzira é a mulher mais inteligente que conheço. Lutou e continua pelejando com forças potencialmente misteriosas, sem temer nem se dominar pelo medo. Desafia poderes ocultos inferiores, não por abuso, mas por sua superioridade, benevolência e equidade. Nossa mãe fez por merecer seu cognome de soberana RARA, tanto por mérito quanto por honradez. — Vejo que meu irmão é um ardoroso defensor dos afetos filiais... com justa razão. Afinal, da Rainha Alzira recebeste o glorioso trono de um reinado rico e pujante apenas por seres primogênito e beijar-lhe as mãos, submisso e dócil... Quanto a mim, não me aquinhoou o destino com tanta candura e sujeição. Não me deu a natureza ânimo de afetada humildade e servil rebaixamento. — Conde Rasku, insinuas que recebi o trono de Avilhanas de mão beijada? Ofende-me tua insolência e irreconhecida ingratidão. Não somente és ingrato à Rainha Alzira, que te aquinhoou com as belas terras do teu Condado, como o sois à figura da nossa venerada mãe, que desacatais na minha pessoa. — Desculpe-me, Senhor Rei Naldo, se vos ofendo. Apenas manifesto com sinceridade meu sentimento de que na balança do coração da Rainha Alzira um prato é teu, o outro da Rainha Araci. Sinto que me excluem e que me ocultam alguma verdade inconveniente. — E tu também nos oculta algo que teu coração sonega? Por acaso pretendes casar-vos com uma mulher tão mais velha, ainda que bonita, só por amor? A pergunta deixou Conde Rasku encabulado. Era preciso sair do assunto, sem transparecer que havia algo oculto no interesse repentino do Conde Rasku pela Marquesa de Sonça, a Senhora Pan Thera. — Rei Naldo, Senhor de Avilhanas, ocupo-me agora exclusivamente do meu casamento. Vou preveni-lo de que, até antes de casar-me, escavarei por todos os locais que suspeito ocultar o tesouro do Rei Albe, o Rico, quer dizer... da Rainha Alzira, a Soberana RARA. Até mais vê-lo. Salve, salve. — Escave à vontade, Conde Rasku. Dentro dos limites do teu território. Se o fizerdes onde não vos pertence, tenho autoridade o bastante para mandar matar-vos. Dando de ombros, como se não tivesse ouvido a advertência do Rei Naldo, deixando o Salão do Trono, o belo Conde Rasku, antes de bater a porta atrás de si, ainda falou a ele: — Estou me preparando para viajar ao Reinado de Trindade. Vou ao casamento do Bruxo Neno. Não irás? — Estou aguardando o nascimento do meu filho. Aproveite e leve à Corte do Rei Mor o convite para a festa do nascimento de Gesu Aldo. Creio que as datas vão coincidir: a da festa de nascimento com a data do casamento. Apresente minhas desculpas. Conde Rasku bateu a porta meio irritado, enquanto o rei prosseguiu gravando suas placas de ouro, formulando o restante dos convites para a festa da natividade do esperado Príncipe Gesu Aldo. 260H. H. Entringer Pereira Pensando sobre o comportamento astucioso de seu meio-irmão, o rei de Avilhanas concluiu que, por direito, era também honesto revelar a Rasku sua filiação, porém não era prudente intentá-lo naquele momento. A vingança e o ódio de Rasku seriam implacáveis. Não obstante o provável revide, não descartava a possibilidade de ele, por vingança e revolta, tramar a morte não só da rainha-mãe como de sua mulher, Rainha Araci, ou dos filhos que porventura viessem ter. Que Rasku era perigoso e pérfido não havia dúvidas. Era preciso vigiar-lhe os passos, mantê-lo sob controle e, na medida do possível, evitar contrariá-lo. O arauto real anunciou com sua trombeta a chegada de um visitante. Rainha Alzira abriu a janela de seus confortáveis aposentos e viu a caravana se aproximando. Além dos fornecedores de provisões para o Palácio das Esmeraldas, junto dos mercadores, uma mulher com suas damas de companhia e servos desceram das carruagens. Facilmente identificou a primeira delas: era Professora Plínia. Em meio a uma festiva algazarra, viu também descarregar dos animais uma canastra de cobre e madeira marchetada, com o desenho de um pássaro, trazendo ao bico um bebê: era a bagagem da Senhora Natividade da Luz, a parteira das rainhas. O coração da Rainha Alzira acelerou-se e ela, por breves instantes, lembrou-se das duas últimas vezes em que a parteira veio ao palácio: por ocasião do nascimento do menino Mulato e, anteriormente, no nascimento de seu filho Rasku. Lembranças que lhe traziam secretos sofrimentos, pois evocavam recordações que Rainha Alzira preferia não trazer ao presente. Arrumou-se, penteou sua longa cabeleira já agrisalhada, desceu as escadarias e veio ao pórtico principal receber suas nobres e queridas visitantes. Rainha Araci também estava na recepção, segurando carinhosamente sua barriga com muita expectativa, feliz por saber que teria a assistência da competente profissional, Senhora Natividade da Luz, além da assessoria impecável da Professora Plínia, que entendia como ninguém de todas as arrumações necessárias para uma grande e inesquecível comemoração. Rei Naldo não economizou gentilezas, providenciando as melhores acomodações, os mais saborosos acepipes, engalanando o Palácio das Esmeraldas com os adornos e emblemas próprios daquela Casa Real, exibidos pela derradeira vez na festa de sua coroação como Soberano de Avilhanas e casamento com a Rainha Araci
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Parece muito simples, salvar uma planta. Uma árvore, que por algum motivo, venha sofrer qualquer tipo de dano. Mas, na prática, não é bem assim. Principalmente quando se trata de um calouro. Todo estreante treme nas bases. Quem teve o privilégio de se relacionar cotidianamente com a lida da vida rural, "talvez" perceba o que eu estou dizendo. Também não basta a boa vontade, romper com tantos paradigmas às vezes parece um soco no estômago. Um aprendiz não anda municiado para qualquer eventualidade. Meu pé de graviola quebrou uma galhada. Faltam alguns ajustes neste trabalho para ficar bom. Mas, salvei a mamãe, "gravioleira".
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URUCUMACUÃ By H.H.Entringer Pereira - Livro 3 - Cap. 63
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DEPOIS DO CASAMENTO DO REI Professora Plínia prosseguia suas narrativas, aguçando a curiosidade do Príncipe Urucumacuã, que se mostrava cada vez mais interessado que ela contasse logo, não deixando para depois, o que havia acontecido nos dias da festa de seu nascimento e de seu irmão, Príncipe Kurokuru. Com muito tato e paciência, ela explicara que todas aquelas narrativas, ainda que paralelas aos acontecimentos durante e depois do casamento do Imperador, Rei Médium, com a Imperatriz Rainha Gônia, eram importantes. Precisava conhecer não só o que se passara no reinado de seu pai, como também nos reinados vizinhos. — Um dia, haverás de exercer também teu direito ao Trono e à Coroa deste fabuloso império. Príncipe Urucumacuã ouviu quieto, mas de vez em quando interrompia as narrativas, perguntando sobre alguns personagens que já conhecia e por outros cujas histórias despertavam-lhe especial interesse. Queria saber tudo sobre Rainha Alzira, Rei Naldo, Conde Rasku e, principalmente, Rei Mor e Bruxo Neno. — Calma, Urucum. Temos muita coisa para lhe revelar. Vou primeiro, falar tudo sobre o que aconteceu antes que tu nascentes... porque sobre o que aconteceu nos primeiros tempos de teu nascimento, saberás mesmo, quando regressares do Santuário do Mago Natu, após as quatro estações de tua iniciação. — Quanto tempo terei de ficar com o Mago Natu? — Exatamente quatro estações: um outono, um inverno, uma primavera e um verão. — Por que meu irmão não irá comigo? — Por que vossos caminhos são diferentes. Um andará pelo Caminho do Fogo e o outro pelo Caminho da Água. Ainda sem entender o que aquela profecia significava, o Príncipe Urucumacuã pediu à Professora Plínia: — Podes me contar a história do encantamento da Marquesa de Sonça na Onça Pintada? — Primeiramente, vamos concluir alguns acontecimentos de quando nasceu o Príncipe Gesu Aldo, este que deverá se casar com a tua irmã, esta que nasceu na semana passada; depois saberás do casamento do Bruxo Neno com a serva do Rei Mor, a bela Murmur e vamos concluir então com o que estás me pedindo. A história do teu nascimento contarei quando voltares do Santuário do Mago. No Palácio das Esmeraldas, a Rainha Alzira aguardava, ansiosa, a chegada do filho Calico e da nora, Rainha Araci, para se inteirar das novidades registradas no casamento do Rei Médium com Rainha Gônia, agora Imperador e Imperatriz. Um sonho na noite anterior muito a inquietara. Acordou chorando, porque vira participando de uma outra festa de casamento seu outro filho, o Conde Rasku, e sua odiosa rival, a viúva Pan Thera, Marquesa de Sonça, vizinha das terras do Condado de Rasku, dançando numa frenética orgia ritual, celebrada por sua arqui-inimiga, a Feiticeira das Sombras. A viúva Pan Thera, subitamente, por artes de encantamentos que a Rainha Alzira sabia como funcionavam, transformava-se numa fera ao mesmo tempo terrível e 252H. H. Entringer Pereira encantadora, ameaçando devorá-la. As imagens muito vívidas daquele sonho deixaram Rainha Alzira apreensiva, já que detestava a Marquesa de Sonça com todas as forças do seu coração, porque em épocas passadas, durante uma festa no solar da marquesa, esta lhe servira intragável bebida que lhe causou grande mal-estar e quase a matara. Julgou que fora vítima de tentativa de envenenamento porque a marquesa não disfarçava sua desmedida cobiça pelas famosas e perfeitas esmeraldas que lhe pertenciam. Muito mais lhe odiava ainda porque soube pelo honrado Intendente das Finanças e Justiça, o Marquês de Contagem, que o pai fora aprisionado porque se escusara de obedecer ordem do Rei Albe, o Rico, para levar um mimo à marquesa, Senhorita Pan Thera, consistente numa caixa de prata cheia de esmeraldas, tão logo Rainha Alzira se ausentara numa demorada viagem em visita a sua já falecida prima, a Rainha Olinda, mãe do Rei Médium. Rainha Alzira também sabia que, antes de a Feiticeira Zuzu, a Sacerdotisa das Sombras, se mudar para o Reinado de Trindade, negociara por alto preço com a Marquesa de Sonça o maldito bridão encantado, que ela mesma ordenara entregar à feiticeira, logo depois da tragédia que culminou no enforcamento de seu marido, o Rei Albe, o Rico. Conde Rasku, desde a época do casamento e da coroação do irmão Calico como Rei de Avilhanas, mudou-se para as terras que ganhara de sua mãe, a Rainha Alzira, num jogo de dados, denominando-as de Condado de Rasku, e não mais a visitara. Quase três anos se passaram sem que o Conde Rasku viesse ao Palácio das Esmeraldas. Rainha Alzira sabia notícias esparsas de seu filho porque, além de ser o homem mais belo entre todos os nobres que circulavam por aquelas regiões, tinha fama inigualável de perverso, cruel e sedutor incorrigível. As notícias do filho, geralmente ligadas a acontecimentos pouco edificantes e honrosos, traziam mais desgosto do que alegria à rainha. Para distrair-se e espairecer suas angústias, Rainha Alzira subiu à galeria onde pintava seus quadros — as calic’aturas. Ficou olhando e apreciando-os, admirada de como sua coleção aumentara: havia acrescido algumas outras, além de seus antepassados: o Louco, o Mago Natu, o Imperador Médium, a Imperatriz Gônia e o rei enforcado. Do sonho que tivera, sentindo-se saudosa e aflita pelo filho desnaturado, que não via desde o casamento de Calico, pôs-se a pintá-lo, retratando-o como sonhara: vacilante entre a pretensa noiva e ela própria, sua mãe, alvo certeiro da flechada do implacável Cupido. Deu ao quadro o nome O Enamorado. Nas derradeiras pinceladas em recente obra de arte, ouviu o troar da trombeta do Arauto Real. Pelo tropel da Guarda palaciana, deduziu que a comitiva do Rei Naldo chegara. Guardou rapidamente todo o material espalhado sobre mesas e cavaletes, descendo as escadarias com o coração mais tranquilo. Para sua surpresa, não só a carruagem do Rei Naldo com a Rainha Araci adentrava o pátio do Palácio das Esmeraldas como também o garboso alazão negro do filho temperamental e intratável, mas impressionantemente belo, o Conde Rasku. O primeiro a abraçá-la, desculpando-se pelo longo tempo de ausência, Conde Rasku, de coruscantes olhos azuis, barba crescida e cabeleira selvagemente desalinhada, podia não ser o melhor dos filhos, de caráter dócil e amável igual ao irmão, mas 253H. H. Entringer Pereira inegavelmente era o homem mais belo que já existira, o mais bonito de todos os outros príncipes daquela época. Esquecendo-se das amarguras e sofrimentos que o belo filho, ao longo da infância até a juventude lhe proporcionara, em razão de seus comportamentos cruéis com os animais, temperamentos irascíveis com os serviçais e atitudes odiosas para com seu único irmão, Rainha Alzira o abraçou ternamente, emocionou-se ao ouvir-lhe as batidas do coração e, num relâmpago de lembranças, o pensamento lhe trouxe à memória o mágico momento e a dramática situação em que ele havia sido concebido. Rasku percebeu a fragilidade emocional de sua mãe, fitando-lhe friamente o rosto já sulcado pelo tempo, mas ainda belo, indagando-lhe: — Já sabes que estou noivo e pretendo me casar? — Como saberia, se a notícia ainda não chegou por aqui? – respondeu-lhe a mãe, acrescentando – Mas não me custa adivinhar com quem... — Ah, duvido que acertarias – interrompeu-a. — Antes que me possas revelar, asseguro-te que não faço gosto, tampouco teu irmão aprovará – disse, com firmeza, Rainha Alzira. – Conversaremos depois. Preciso abraçar Calico e Araci. Vamos, entre! À hora do jantar, sob a luz bruxuleante dos archotes e dos castiçais sobre a mesa, o lugar costumeiro da Rainha Araci permaneceu vazio. Rei Naldo justificara a ausência dela alegando excessivo cansaço pela longa e penosa viagem, agravado pela adiantada gravidez. Conde Rasku, sentado à frente de sua mãe, desdenhou da forma como Calico expressara suas desculpas pela ausência da Rainha Araci e provocou: — Diga a tua maravilhosa e barriguda rainha que não precisa mais ter medo de mim. Agora sou um homem comprometido. Além do mais, as unhas da marquesa são bem mais afiadas que as dela. — Rasku, por favor – interrompeu Rainha Alzira – respeite a mulher do seu irmão e não se esqueça de que estás diante do Rei de Avilhanas! O menino Mulato, filho que Calico teve na sua adolescência com a moça Alba, também se sentava à mesa, ao lado de Rainha Alzira. Ainda que não falasse, Mulato sentia pela expressão do rosto que o conde não lhe dirigia olhares de simpatia, porém, na qualidade de mudo que era, apenas observava o clima de animosidade transparente entre os dois irmãos. Fitando Mulato com severidade e desprezo, Rasku prosseguiu em tom provocativo: — Mudemos de assunto. Rei Naldo, como permitis que o bastardinho mudo coma a tua mesa? Não seria o estábulo o lugar mais adequado a ele? Antes que Rei Naldo abrisse a boca para responder ao insulto, Rainha Alzira adiantou-se e, no rompante, posicionou-se em defesa do neto, a quem muito amava: — Conde Rasku, um bastardo a mais ou a menos nesta mesa, não fará diferença ... Também tu poderias ser tratado como tal, não fosse a benevolência do teu irmão Calico. Houve silêncio. O Senhor Louco, que resolvera morar definitivamente no Palácio das Esmeraldas a convite da Rainha Alzira, desde os tempos da tragédia do enforcamento do Rei Albe, o Rico, distante da cabeceira da mesa onde Rei Naldo e Conde Rasku estavam, até então não prestara atenção no que conversavam porque não 254H. H. Entringer Pereira ouvia os diálogos, dada a extensão da mesa e a conversa animada dos outros cortesãos. Percebendo que o clima entre eles modificara e a descontração inicial daquele jantar não era a mesma, adiantou-se, levantando-se como de costume, e iniciou um número na tentativa de distrai-los até a hora da sobremesa. Usando um jogo de palavras que lembrava uma brincadeira de crianças, o Louco cumpriu sua tarefa, começando pelo nobre visitante Conde Rasku: — Meu nobre, o que és? És conde? Onde escondes? Escondes o Conde? Ou és Conde que esconde? Se escondes, não és Conde! Então, nobre Conde, escondes... Se és Conde, não escondes! A maioria dos comensais se divertia. Conde Rasku apenas esboçou um sorriso pouco à vontade, tentando disfarçar o estranho sentimento que brotara pelas palavras de sua mãe. Rainha Alzira pouco se importou com a falta de educação e o sarcasmo do filho, gargalhando com a engenhosidade e a malícia interpretada nos trocadilhos do Louco. — Amigos – dirigiu-se a Rainha Alzira aos cortesãos – poucos dentre vós sabeis o que o Conde Rasku tem para anunciar. Diga, formoso Conde, qual é a novidade que nos trazes? Aparentemente desconcertado com a brincadeira do Louco e pensativo sobre o que ouvira de sua própria mãe, para não perder a pose, Conde Rasku manifestou-se arrogantemente: — Senhoras, senhores, bem sabeis que também tenho um coração, ainda que minha fama de desalmado percorra o mundo. Quero anunciar-vos que pretendo me casar com a Marquesa de Sonça, aqui mesmo, no Palácio das Esmeraldas, ou no Solar da Marquesa. Daqui a sete luas cheias, irei ao casamento do Bruxo Neno, no Palácio de Trindade, e quando voltar, direi a todos qual a data marcada para as minhas bodas. Aguardem, portanto, meu regresso e preparem-se para a maior e melhor festa de casamento de todos os tempos. — És tu, então, nobre Rasku, quem usará o bridão encantado? – perguntou o Louco, em tom de zombaria. — Já passas de insolente, amigo Louco. Vou me casar porque estou apaixonado. – justificou-se. — Contenha-se, Rasku. Ele está apenas brincando. No mais, a história daquele bridão já causou sofrimento bastante a todos nós – ponderou Rainha Alzira. – A mim, custa admitir que alguém tenha interesse na posse de um objeto que serviu de instrumento à morte do próprio pai. O clima do jantar não se apresentara propriamente festivo pela chegada do Rei Naldo e da Rainha Araci, pois o contraponto do aparecimento do Conde Rasku inquietara a todos, principalmente aos pais das donzelas de Avilhanas. A beleza sedutora de Rasku era perigosamente temperada por suas práticas pervertidas e comportamentos abertamente depravados. Ainda que estivesse comprometido a se casar, era pouco confiável e ardiloso por excelência para seduzir e desonrar mulheres jovens ou matronas, casadas, solteiras ou viúvas. 255H. H. Entringer Pereira Causara surpresa o anúncio do casamento do Conde Rasku com a Marquesa de Sonsa porque, embora apetrechada de grande beleza e sensualidade, era o dobro da idade mais velha do que o noivo, e circulavam rumores de que o primeiro marido da marquesa teria morrido com menos de um ano de casado, por esgotamento físico, face às incontroláveis exigências e ao insaciável apetite de alcova da mulher. Nas conversas entre servos e plebeus, o comportamento indomável da Marquesa de Sonça era assunto pontual. Dizia-se que entre suas predileções sexuais, além de homens jovens e bonitos, também se incluíam algumas belas jovens, e não eram incomuns reuniões em que as orgias duravam dias seguidos, quando a marquesa achava por bem festejar suas datas de aniversário. O próprio Conde Rasku frequentara vez por outra o mal afamado Solar da Marquesa e se jactava de já ter passado por lá semanas na esbórnia, entre efebos e belezuras que se davam aos prazeres sensuais, sem limites e sem censuras. Rainha Alzira sabia de alguns dos desregramentos do filho, mas cultivou por algum tempo a esperança de que Conde Rasku viesse a se casar com uma nobre dama, de fino trato, pudica e prendada para compensar e equilibrar-lhe o temperamento cruel e libertino. Ainda que seu caráter se lhe afigurasse, às vezes, tão sórdido, a beleza do rosto e do corpo eram predicativos que, certamente, serviriam como recompensa ao resgate de alguma nobre virtude que nele ainda estaria incógnita – o que uma mulher verdadeiramente amorosa, virtuosa, fiel e paciente poderia tornar à superfície. De outra parte, Rainha Alzira reconhecia no caráter do filho o temperamento sagaz e impetuoso, concordando que fosse ele o marido ideal, talhado sob medida, para impingir toda sorte de sofrimentos e provações à despudorada, astuta, ambiciosa e depravada, mas certamente apaixonada Marquesa de Sonça. Haveriam de formar um belo par. Ele, belo, sórdido e cruel. Ela, linda, sensual e pervertida. A despeito das insanáveis destemperanças de ambos, ele era o que de melhor poderia ocorrer para transformar a vida da marquesa num inimaginável e prolongado martírio. E ela, astuta e libertina o suficiente para fazê-lo viver um constante inferno. Algo, no entanto, ocupava mais o pensamento da mãe do que as vicissitudes pessoais do filho e da Marquesa de Sonça naquele momento. Chegara a hora de revelar o segredo ao Conde Rasku de sua misteriosa paternidade. Somente a Rainha Alzira e o Mago Natu compartilhavam tal segredo a todos ocultado: o menino Rasku não era filho legítimo do Rei Albe, o Rico. Era filho de Adul Thero, conhecido por toda a Corte pelo apelido de Senhor Dugo — o dileto e fiel feitor da Rainha Alzira, assassinado pelo Rei Albe, o Rico, sem motivos aparentes, dadas às circunstâncias misteriosas em que foi encontrado, na mesma noite em que o rei também se suicidara. A dessemelhança entre o Conde Rasku e seu meio-irmão, Rei Naldo, dizia mais respeito ao temperamento do que ao porte físico. Ambos eram notáveis cavaleiros, belos e saudáveis. Rei Naldo, mais introspectivo e sério, pouco conversava, mas, amiúde, dava provas de sua bondade, nobreza e equidade. A beleza do Conde Rasku, todavia, se notabilizava, pois além dos coruscantes olhos azuis e dos anelados cabelos castanho-dourado, seu sorriso perfeito, seduzia e, ao mesmo tempo, ocultava o que possuía de pior no seu caráter: era malicioso e cruel, além de pérfido e egoísta. 256H. H. Entringer Pereira Não havia mais razões, porém, para postergar a revelação de sua origem ao Conde Rasku. O Reinado de Avilhanas já tinha seu rei e prosperava em paz. E o anunciado casamento conferia ao conde o direito de conhecer toda sua estirpe, para que pudesse construir a própria árvore genealógica, inaugurando por conseguinte nova linhagem. Face à maneira sempre correta com que se conduzira e sua devotada fidelidade à memória do marido falecido, Rainha Alzira não dava margem às especulações nem aos mexericos a respeito de sua última gravidez. Pela contagem do tempo, desde que Rei Albe, o Rico, fora encontrado enforcado até o nascimento do menino Rasku, passaram-se exatamente as nove luas cheias: para todos os efeitos, a última coisa que Rei Albe, o Rico, teria feito por derradeiro na sua vida, antes do suicídio, fora um filho. E este filho era Rasku. Disposta a enfrentar o gênio indômito, arrebatado e irascível de Conde Rasku, procurou apoio no filho Calico, o Rei Naldo, de ânimo mais generoso e pacífico, solicitando-lhe o conselho que até então evitara pedir por lhe faltar coragem de compartilhar com ele sua própria infâmia e ignomínia. Não havia alternativas. Chegara a hora, afinal. A sós com Rei Naldo, Rainha Alzira abriu o coração: — Calico, meu filho, não imaginas quanto me custa confessar-te, neste momento, o segredo mais bem guardado de toda a minha vida. — Se vais me contar que Rasku não é meu irmão por parte de pai, não te aflijas. Desde que nos disseste sobre o feitiço da besteira e da aparição da Mula Sem Cabeça, já o imaginava. — E teu irmão, também desconfia? – indagou-lhe preocupada. — Não que eu saiba. Afinal, somos fisicamente muito parecidos. Nossas principais diferenças residem tão somente no caráter. — Tanto melhor. Achas que Rasku já pode saber que não é filho do teu pai? — Minha mãe, ainda que estejas confirmando que Rasku é meio-irmão meu, não revelastes quem é seu pai verdadeiro. Permite-me o atrevimento? — Evidente. Queres que eu mesma diga ou preferes me dizer? — Se eu não acertar, confias em me dizer? — Sim. Quem tu achas que pode ser o pai de Rasku? — O Senhor Dugo, certamente. E, talvez por isso, meu pai o tenha assassinado. Rainha Alzira começou a chorar. Abraçou-se ao filho, balbuciando, entre soluços, a pergunta cuja resposta precisava ouvir do Rei de Avilhanas: — Tu me perdoas? — Ora, minha mãe. Quem sou eu para vos repreender? Nada sinto contra vós e bem compreendo os motivos que vos levaram a tão grave despautério, àquela asneira desmedida. — Quanto a Rasku, não posso mais ocultar-lhe a verdade, mesmo temendo sua odiosa fúria... Pelo que o conheço, será capaz de matar-me ou me odiar, desejando vingar-se pelo resto dos meus dias. — Poupe-se, então. Melhor que não saiba. Nem a Araci vou revelar o que a mim confiastes. Guardarei vosso segredo. 257H. H. Entringer Pereira — Seria mais confortável... Mas não conseguirei ocultar de Rasku a realidade, porque no dia de seu casamento terei de lhe entregar a arma paterna, o sabre de Adul Thero. — Nesse caso, todos ficarão sabendo quem é o pai do Conde Rasku – contrapôs o Rei Naldo. — Ele vai me odiar. Tenho receio de sua impetuosidade. Conheço suas inclinações para a vingança – conjeturou Rainha Alzira. – Achas que Rasku seria capaz de odiar ao ponto de querer me matar? — Que ele vos odiará, não duvido. Mas não vos mataria antes que descobrisse onde estão os vossos 144 quilos das esmeraldas que meu pai ocultou, enterrando em algum lugar. É melhor que não procureis, nem mesmo encontreis este tesouro... se quereis viver depois de contar a Rasku quem é seu pai – falou Rei Naldo, em tom de brincadeira. — Estou pensando: Rasku jamais conhecerá seu pai, tampouco a Adul Thero foi dado o direito de conhecer o filho... Estranhas armadilhas do destino. Sinceramente, ainda não decidi. Pensando melhor, já nem sei se devo revelar... Se Mago Natu estivesse aqui, pediria a ele para que contasse. — Mãe, vós me pedistes um conselho. Na cerimônia, quando Rasku se casar, entregue-lhe o sabre do Senhor Dugo, sem alardes, nem muito palavreado. Simplesmente como tributo póstumo e devida homenagem à memória daquele que foi seu fiel servo. Assim como o Rei Albe, o Rico, morreu levando consigo o segredo de onde enterrou vosso grande e precioso tesouro, assim também morreu com o Senhor Dugo o segredo de Adul Thero, pai do Conde Rasku. — Faremos então um pacto: quando eu descobrir onde estão minhas esmeraldas, direi ao Conde Rasku de quem ele é filho. Rainha Alzira saiu do Salão do Trono e, ao abrir a porta, deparou-se com Conde Rasku. Surpresa com a presença do filho naquela hora, passou-lhe pela cabeça a possibilidade de que já estivesse ali há alguns minutos, ouvindo certamente seu diálogo com o Rei Naldo, atrás da porta. Todavia, não percebeu mudanças no seu semblante, e pela forma com que a abraçou, saudando-a, certificou-se de que ele havia chegado naquele momento. — Salve, salve, Mãe Rainha. Viestes confabular com Calico sobre o meu casamento? — Não exatamente, meu filho! Conversávamos sobre as minhas esmeraldas que o Rei Albe escondeu... Tens algum palpite a respeito? — Por que não mandas cavar no local onde ele se enforcou? — Já o fiz. No exato lugar onde havia sinais de terra revolvida, acharam enterradas as cabeças do Senhor Dugo e da Mula Tá. Ah, e antes de encontrarem as duas cabeças, retiraram da cova um sabre com o nome de Adul Thero gravado na lâmina. Queres portar aquela arma no dia do teu casamento e com ela permanecer, como homenagem ao mais fiel de todos os servos reais? — É da forja de Kalibur? — Certamente. Pela têmpera e beleza, não poderia ter sido de outro artífice. — Então considere-a minha. E do meu pai, o que dar-me-ás? 258H. H. Entringer Pereira — A porção de terras que pertenceu ao Senhor Dugo, contíguas às do teu Condado, para que acrescenteis ainda mais às tuas posses algo do teu pai. Conde Rasku não compreendeu que a porção de terras a que sua mãe se referia, que acrescentaria àquelas que já possuía, era, de fato, a herdade de seu legítimo pai. Naturalmente satisfeito pelo quinhão prometido, imaginou que talvez pudesse estar escondido naquelas plagas do reinado o tão cobiçado e precioso tesouro da Rainha Alzira: as maravilhosas e valiosíssimas pedras verdes. Adentrando sem cerimônia o Salão do Trono, Conde Rasku negou-se observar o protocolo para falar com o Rei de Avilhanas. Enquanto Rei Naldo anotava em finas lâminas de ouro mensagens para convidar os reis vizinhos, seus filhos e outros amigos nobres para festejarem o nascimento de seu primogênito, o príncipe herdeiro, prestes a acontecer, o irmão o interceptou com uma saudação que usavam desde os tempos de adolescentes. Levantando os olhos das folhas de ouro, sem interromper seu trabalho, respondeu à saudação do irmão, perguntando: — O que desejas, Conde Rasku? – voltando os olhos ao que fazia, continuando a tarefa. — Vim saudá-lo, primeiramente, majestoso Rei Naldo, Senhor de Avilhanas. Na qualidade de vosso irmão, penso que agradaria muito à nossa mãe que tivéssemos um relacionamento mais cordial e amigável. — Nunca fui teu inimigo, em princípio... — Mas ainda não me perdoastes pela infelicidade do flagrante na cama com Alba. — Coisas passadas, meu caro irmão... O amor do meu filho Mulato, hoje me recompensa da vergonha que me fizestes sofrer; e pela verdadeira paixão de Alba por mim. Não fosse o trágico final que resultou no sutil encantamento dela naquele pássaro, a Albatroz, teria me casado com ela e não com Araci, arcando com o castigo de perder o direito ao trono deste Reinado. — Neste caso, seria eu o rei de Avilhanas? — Serias. O que farias, fosses tu rei de Avilhanas? Porventura encontrarias o tesouro escondido pelo Rei Albe, o Rico? — Certamente. Não dormiria até descobri-lo. Onde achas que estão as misteriosas pedras verdes? Não tens gana de possuí-las? — Conde Rasku... como és ingênuo, apesar da tua insidiosa malícia... — Por que assim me julgas, Rei Naldo? Achas incorreto alguém pretender o que lhe é de direito? — Nem tanto. Parece-me incorreto, meu nobre irmão, pleitear o que por direito não lhe é pertinente. — Reputa-me indigno do meu quinhão? — Em absoluto. Discordo da irrefletida ânsia e desta aflição desvelada por te assenhorear daquele tesouro, cismando em fazer-te rico. Não te esqueças de que antes de nós dois, as preciosas pedras verdes pertencem de fato à nossa mãe, cabendo a ela querer ou não as encontrar. 259H. H. Entringer Pereira — Calico, nossa mãe já desistiu de seus sonhos. Mesmo porque nada lhe interessa mais, nem se ocupa atualmente de outra coisa que não pintar quadros de mau gosto e tocar cavaquinho. — Rasku, Rainha Alzira é a mulher mais inteligente que conheço. Lutou e continua pelejando com forças potencialmente misteriosas, sem temer nem se dominar pelo medo. Desafia poderes ocultos inferiores, não por abuso, mas por sua superioridade, benevolência e equidade. Nossa mãe fez por merecer seu cognome de soberana RARA, tanto por mérito quanto por honradez. — Vejo que meu irmão é um ardoroso defensor dos afetos filiais... com justa razão. Afinal, da Rainha Alzira recebeste o glorioso trono de um reinado rico e pujante apenas por seres primogênito e beijar-lhe as mãos, submisso e dócil... Quanto a mim, não me aquinhoou o destino com tanta candura e sujeição. Não me deu a natureza ânimo de afetada humildade e servil rebaixamento. — Conde Rasku, insinuas que recebi o trono de Avilhanas de mão beijada? Ofende-me tua insolência e irreconhecida ingratidão. Não somente és ingrato à Rainha Alzira, que te aquinhoou com as belas terras do teu Condado, como o sois à figura da nossa venerada mãe, que desacatais na minha pessoa. — Desculpe-me, Senhor Rei Naldo, se vos ofendo. Apenas manifesto com sinceridade meu sentimento de que na balança do coração da Rainha Alzira um prato é teu, o outro da Rainha Araci. Sinto que me excluem e que me ocultam alguma verdade inconveniente. — E tu também nos oculta algo que teu coração sonega? Por acaso pretendes casar-vos com uma mulher tão mais velha, ainda que bonita, só por amor? A pergunta deixou Conde Rasku encabulado. Era preciso sair do assunto, sem transparecer que havia algo oculto no interesse repentino do Conde Rasku pela Marquesa de Sonça, a Senhora Pan Thera. — Rei Naldo, Senhor de Avilhanas, ocupo-me agora exclusivamente do meu casamento. Vou preveni-lo de que, até antes de casar-me, escavarei por todos os locais que suspeito ocultar o tesouro do Rei Albe, o Rico, quer dizer... da Rainha Alzira, a Soberana RARA. Até mais vê-lo. Salve, salve. — Escave à vontade, Conde Rasku. Dentro dos limites do teu território. Se o fizerdes onde não vos pertence, tenho autoridade o bastante para mandar matar-vos. Dando de ombros, como se não tivesse ouvido a advertência do Rei Naldo, deixando o Salão do Trono, o belo Conde Rasku, antes de bater a porta atrás de si, ainda falou a ele: — Estou me preparando para viajar ao Reinado de Trindade. Vou ao casamento do Bruxo Neno. Não irás? — Estou aguardando o nascimento do meu filho. Aproveite e leve à Corte do Rei Mor o convite para a festa do nascimento de Gesu Aldo. Creio que as datas vão coincidir: a da festa de nascimento com a data do casamento. Apresente minhas desculpas. Conde Rasku bateu a porta meio irritado, enquanto o rei prosseguiu gravando suas placas de ouro, formulando o restante dos convites para a festa da natividade do esperado Príncipe Gesu Aldo. 260H. H. Entringer Pereira Pensando sobre o comportamento astucioso de seu meio-irmão, o rei de Avilhanas concluiu que, por direito, era também honesto revelar a Rasku sua filiação, porém não era prudente intentá-lo naquele momento. A vingança e o ódio de Rasku seriam implacáveis. Não obstante o provável revide, não descartava a possibilidade de ele, por vingança e revolta, tramar a morte não só da rainha-mãe como de sua mulher, Rainha Araci, ou dos filhos que porventura viessem ter. Que Rasku era perigoso e pérfido não havia dúvidas. Era preciso vigiar-lhe os passos, mantê-lo sob controle e, na medida do possível, evitar contrariá-lo. O arauto real anunciou com sua trombeta a chegada de um visitante. Rainha Alzira abriu a janela de seus confortáveis aposentos e viu a caravana se aproximando. Além dos fornecedores de provisões para o Palácio das Esmeraldas, junto dos mercadores, uma mulher com suas damas de companhia e servos desceram das carruagens. Facilmente identificou a primeira delas: era Professora Plínia. Em meio a uma festiva algazarra, viu também descarregar dos animais uma canastra de cobre e madeira marchetada, com o desenho de um pássaro, trazendo ao bico um bebê: era a bagagem da Senhora Natividade da Luz, a parteira das rainhas. O coração da Rainha Alzira acelerou-se e ela, por breves instantes, lembrou-se das duas últimas vezes em que a parteira veio ao palácio: por ocasião do nascimento do menino Mulato e, anteriormente, no nascimento de seu filho Rasku. Lembranças que lhe traziam secretos sofrimentos, pois evocavam recordações que Rainha Alzira preferia não trazer ao presente. Arrumou-se, penteou sua longa cabeleira já agrisalhada, desceu as escadarias e veio ao pórtico principal receber suas nobres e queridas visitantes. Rainha Araci também estava na recepção, segurando carinhosamente sua barriga com muita expectativa, feliz por saber que teria a assistência da competente profissional, Senhora Natividade da Luz, além da assessoria impecável da Professora Plínia, que entendia como ninguém de todas as arrumações necessárias para uma grande e inesquecível comemoração. Rei Naldo não economizou gentilezas, providenciando as melhores acomodações, os mais saborosos acepipes, engalanando o Palácio das Esmeraldas com os adornos e emblemas próprios daquela Casa Real, exibidos pela derradeira vez na festa de sua coroação como Soberano de Avilhanas e casamento com a Rainha AraciH. H. Entringer Pereira encantadora, ameaçando devorá-la. As imagens muito vívidas daquele sonho deixaram Rainha Alzira apreensiva, já que detestava a Marquesa de Sonça com todas as forças do seu coração, porque em épocas passadas, durante uma festa no solar da marquesa, esta lhe servira intragável bebida que lhe causou grande mal-estar e quase a matara. Julgou que fora vítima de tentativa de envenenamento porque a marquesa não disfarçava sua desmedida cobiça pelas famosas e perfeitas esmeraldas que lhe pertenciam. Muito mais lhe odiava ainda porque soube pelo honrado Intendente das Finanças e Justiça, o Marquês de Contagem, que o pai fora aprisionado porque se escusara de obedecer ordem do Rei Albe, o Rico, para levar um mimo à marquesa, Senhorita Pan Thera, consistente numa caixa de prata cheia de esmeraldas, tão logo Rainha Alzira se ausentara numa demorada viagem em visita a sua já falecida prima, a Rainha Olinda, mãe do Rei Médium. Rainha Alzira também sabia que, antes de a Feiticeira Zuzu, a Sacerdotisa das Sombras, se mudar para o Reinado de Trindade, negociara por alto preço com a Marquesa de Sonça o maldito bridão encantado, que ela mesma ordenara entregar à feiticeira, logo depois da tragédia que culminou no enforcamento de seu marido, o Rei Albe, o Rico. Conde Rasku, desde a época do casamento e da coroação do irmão Calico como Rei de Avilhanas, mudou-se para as terras que ganhara de sua mãe, a Rainha Alzira, num jogo de dados, denominando-as de Condado de Rasku, e não mais a visitara. Quase três anos se passaram sem que o Conde Rasku viesse ao Palácio das Esmeraldas. Rainha Alzira sabia notícias esparsas de seu filho porque, além de ser o homem mais belo entre todos os nobres que circulavam por aquelas regiões, tinha fama inigualável de perverso, cruel e sedutor incorrigível. As notícias do filho, geralmente ligadas a acontecimentos pouco edificantes e honrosos, traziam mais desgosto do que alegria à rainha. Para distrair-se e espairecer suas angústias, Rainha Alzira subiu à galeria onde pintava seus quadros — as calic’aturas. Ficou olhando e apreciando-os, admirada de como sua coleção aumentara: havia acrescido algumas outras, além de seus antepassados: o Louco, o Mago Natu, o Imperador Médium, a Imperatriz Gônia e o rei enforcado. Do sonho que tivera, sentindo-se saudosa e aflita pelo filho desnaturado, que não via desde o casamento de Calico, pôs-se a pintá-lo, retratando-o como sonhara: vacilante entre a pretensa noiva e ela própria, sua mãe, alvo certeiro da flechada do implacável Cupido. Deu ao quadro o nome O Enamorado. Nas derradeiras pinceladas em recente obra de arte, ouviu o troar da trombeta do Arauto Real. Pelo tropel da Guarda palaciana, deduziu que a comitiva do Rei Naldo chegara. Guardou rapidamente todo o material espalhado sobre mesas e cavaletes, descendo as escadarias com o coração mais tranquilo. Para sua surpresa, não só a carruagem do Rei Naldo com a Rainha Araci adentrava o pátio do Palácio das Esmeraldas como também o garboso alazão negro do filho temperamental e intratável, mas impressionantemente belo, o Conde Rasku. O primeiro a abraçá-la, desculpando-se pelo longo tempo de ausência, Conde Rasku, de coruscantes olhos azuis, barba crescida e cabeleira selvagemente desalinhada, podia não ser o melhor dos filhos, de caráter dócil e amável igual ao irmão, mas 253H. H. Entringer Pereira inegavelmente era o homem mais belo que já existira, o mais bonito de todos os outros príncipes daquela época. Esquecendo-se das amarguras e sofrimentos que o belo filho, ao longo da infância até a juventude lhe proporcionara, em razão de seus comportamentos cruéis com os animais, temperamentos irascíveis com os serviçais e atitudes odiosas para com seu único irmão, Rainha Alzira o abraçou ternamente, emocionou-se ao ouvir-lhe as batidas do coração e, num relâmpago de lembranças, o pensamento lhe trouxe à memória o mágico momento e a dramática situação em que ele havia sido concebido. Rasku percebeu a fragilidade emocional de sua mãe, fitando-lhe friamente o rosto já sulcado pelo tempo, mas ainda belo, indagando-lhe: — Já sabes que estou noivo e pretendo me casar? — Como saberia, se a notícia ainda não chegou por aqui? – respondeu-lhe a mãe, acrescentando – Mas não me custa adivinhar com quem... — Ah, duvido que acertarias – interrompeu-a. — Antes que me possas revelar, asseguro-te que não faço gosto, tampouco teu irmão aprovará – disse, com firmeza, Rainha Alzira. – Conversaremos depois. Preciso abraçar Calico e Araci. Vamos, entre! À hora do jantar, sob a luz bruxuleante dos archotes e dos castiçais sobre a mesa, o lugar costumeiro da Rainha Araci permaneceu vazio. Rei Naldo justificara a ausência dela alegando excessivo cansaço pela longa e penosa viagem, agravado pela adiantada gravidez. Conde Rasku, sentado à frente de sua mãe, desdenhou da forma como Calico expressara suas desculpas pela ausência da Rainha Araci e provocou: — Diga a tua maravilhosa e barriguda rainha que não precisa mais ter medo de mim. Agora sou um homem comprometido. Além do mais, as unhas da marquesa são bem mais afiadas que as dela. — Rasku, por favor – interrompeu Rainha Alzira – respeite a mulher do seu irmão e não se esqueça de que estás diante do Rei de Avilhanas! O menino Mulato, filho que Calico teve na sua adolescência com a moça Alba, também se sentava à mesa, ao lado de Rainha Alzira. Ainda que não falasse, Mulato sentia pela expressão do rosto que o conde não lhe dirigia olhares de simpatia, porém, na qualidade de mudo que era, apenas observava o clima de animosidade transparente entre os dois irmãos. Fitando Mulato com severidade e desprezo, Rasku prosseguiu em tom provocativo: — Mudemos de assunto. Rei Naldo, como permitis que o bastardinho mudo coma a tua mesa? Não seria o estábulo o lugar mais adequado a ele? Antes que Rei Naldo abrisse a boca para responder ao insulto, Rainha Alzira adiantou-se e, no rompante, posicionou-se em defesa do neto, a quem muito amava: — Conde Rasku, um bastardo a mais ou a menos nesta mesa, não fará diferença ... Também tu poderias ser tratado como tal, não fosse a benevolência do teu irmão Calico. Houve silêncio. O Senhor Louco, que resolvera morar definitivamente no Palácio das Esmeraldas a convite da Rainha Alzira, desde os tempos da tragédia do enforcamento do Rei Albe, o Rico, distante da cabeceira da mesa onde Rei Naldo e Conde Rasku estavam, até então não prestara atenção no que conversavam porque não 254H. H. Entringer Pereira ouvia os diálogos, dada a extensão da mesa e a conversa animada dos outros cortesãos. Percebendo que o clima entre eles modificara e a descontração inicial daquele jantar não era a mesma, adiantou-se, levantando-se como de costume, e iniciou um número na tentativa de distrai-los até a hora da sobremesa. Usando um jogo de palavras que lembrava uma brincadeira de crianças, o Louco cumpriu sua tarefa, começando pelo nobre visitante Conde Rasku: — Meu nobre, o que és? És conde? Onde escondes? Escondes o Conde? Ou és Conde que esconde? Se escondes, não és Conde! Então, nobre Conde, escondes... Se és Conde, não escondes! A maioria dos comensais se divertia. Conde Rasku apenas esboçou um sorriso pouco à vontade, tentando disfarçar o estranho sentimento que brotara pelas palavras de sua mãe. Rainha Alzira pouco se importou com a falta de educação e o sarcasmo do filho, gargalhando com a engenhosidade e a malícia interpretada nos trocadilhos do Louco. — Amigos – dirigiu-se a Rainha Alzira aos cortesãos – poucos dentre vós sabeis o que o Conde Rasku tem para anunciar. Diga, formoso Conde, qual é a novidade que nos trazes? Aparentemente desconcertado com a brincadeira do Louco e pensativo sobre o que ouvira de sua própria mãe, para não perder a pose, Conde Rasku manifestou-se arrogantemente: — Senhoras, senhores, bem sabeis que também tenho um coração, ainda que minha fama de desalmado percorra o mundo. Quero anunciar-vos que pretendo me casar com a Marquesa de Sonça, aqui mesmo, no Palácio das Esmeraldas, ou no Solar da Marquesa. Daqui a sete luas cheias, irei ao casamento do Bruxo Neno, no Palácio de Trindade, e quando voltar, direi a todos qual a data marcada para as minhas bodas. Aguardem, portanto, meu regresso e preparem-se para a maior e melhor festa de casamento de todos os tempos. — És tu, então, nobre Rasku, quem usará o bridão encantado? – perguntou o Louco, em tom de zombaria. — Já passas de insolente, amigo Louco. Vou me casar porque estou apaixonado. – justificou-se. — Contenha-se, Rasku. Ele está apenas brincando. No mais, a história daquele bridão já causou sofrimento bastante a todos nós – ponderou Rainha Alzira. – A mim, custa admitir que alguém tenha interesse na posse de um objeto que serviu de instrumento à morte do próprio pai. O clima do jantar não se apresentara propriamente festivo pela chegada do Rei Naldo e da Rainha Araci, pois o contraponto do aparecimento do Conde Rasku inquietara a todos, principalmente aos pais das donzelas de Avilhanas. A beleza sedutora de Rasku era perigosamente temperada por suas práticas pervertidas e comportamentos abertamente depravados. Ainda que estivesse comprometido a se casar, era pouco confiável e ardiloso por excelência para seduzir e desonrar mulheres jovens ou matronas, casadas, solteiras ou viúvas. 255H. H. Entringer Pereira Causara surpresa o anúncio do casamento do Conde Rasku com a Marquesa de Sonsa porque, embora apetrechada de grande beleza e sensualidade, era o dobro da idade mais velha do que o noivo, e circulavam rumores de que o primeiro marido da marquesa teria morrido com menos de um ano de casado, por esgotamento físico, face às incontroláveis exigências e ao insaciável apetite de alcova da mulher. Nas conversas entre servos e plebeus, o comportamento indomável da Marquesa de Sonça era assunto pontual. Dizia-se que entre suas predileções sexuais, além de homens jovens e bonitos, também se incluíam algumas belas jovens, e não eram incomuns reuniões em que as orgias duravam dias seguidos, quando a marquesa achava por bem festejar suas datas de aniversário. O próprio Conde Rasku frequentara vez por outra o mal afamado Solar da Marquesa e se jactava de já ter passado por lá semanas na esbórnia, entre efebos e belezuras que se davam aos prazeres sensuais, sem limites e sem censuras. Rainha Alzira sabia de alguns dos desregramentos do filho, mas cultivou por algum tempo a esperança de que Conde Rasku viesse a se casar com uma nobre dama, de fino trato, pudica e prendada para compensar e equilibrar-lhe o temperamento cruel e libertino. Ainda que seu caráter se lhe afigurasse, às vezes, tão sórdido, a beleza do rosto e do corpo eram predicativos que, certamente, serviriam como recompensa ao resgate de alguma nobre virtude que nele ainda estaria incógnita – o que uma mulher verdadeiramente amorosa, virtuosa, fiel e paciente poderia tornar à superfície. De outra parte, Rainha Alzira reconhecia no caráter do filho o temperamento sagaz e impetuoso, concordando que fosse ele o marido ideal, talhado sob medida, para impingir toda sorte de sofrimentos e provações à despudorada, astuta, ambiciosa e depravada, mas certamente apaixonada Marquesa de Sonça. Haveriam de formar um belo par. Ele, belo, sórdido e cruel. Ela, linda, sensual e pervertida. A despeito das insanáveis destemperanças de ambos, ele era o que de melhor poderia ocorrer para transformar a vida da marquesa num inimaginável e prolongado martírio. E ela, astuta e libertina o suficiente para fazê-lo viver um constante inferno. Algo, no entanto, ocupava mais o pensamento da mãe do que as vicissitudes pessoais do filho e da Marquesa de Sonça naquele momento. Chegara a hora de revelar o segredo ao Conde Rasku de sua misteriosa paternidade. Somente a Rainha Alzira e o Mago Natu compartilhavam tal segredo a todos ocultado: o menino Rasku não era filho legítimo do Rei Albe, o Rico. Era filho de Adul Thero, conhecido por toda a Corte pelo apelido de Senhor Dugo — o dileto e fiel feitor da Rainha Alzira, assassinado pelo Rei Albe, o Rico, sem motivos aparentes, dadas às circunstâncias misteriosas em que foi encontrado, na mesma noite em que o rei também se suicidara. A dessemelhança entre o Conde Rasku e seu meio-irmão, Rei Naldo, dizia mais respeito ao temperamento do que ao porte físico. Ambos eram notáveis cavaleiros, belos e saudáveis. Rei Naldo, mais introspectivo e sério, pouco conversava, mas, amiúde, dava provas de sua bondade, nobreza e equidade. A beleza do Conde Rasku, todavia, se notabilizava, pois além dos coruscantes olhos azuis e dos anelados cabelos castanho-dourado, seu sorriso perfeito, seduzia e, ao mesmo tempo, ocultava o que possuía de pior no seu caráter: era malicioso e cruel, além de pérfido e egoísta. 256H. H. Entringer Pereira Não havia mais razões, porém, para postergar a revelação de sua origem ao Conde Rasku. O Reinado de Avilhanas já tinha seu rei e prosperava em paz. E o anunciado casamento conferia ao conde o direito de conhecer toda sua estirpe, para que pudesse construir a própria árvore genealógica, inaugurando por conseguinte nova linhagem. Face à maneira sempre correta com que se conduzira e sua devotada fidelidade à memória do marido falecido, Rainha Alzira não dava margem às especulações nem aos mexericos a respeito de sua última gravidez. Pela contagem do tempo, desde que Rei Albe, o Rico, fora encontrado enforcado até o nascimento do menino Rasku, passaram-se exatamente as nove luas cheias: para todos os efeitos, a última coisa que Rei Albe, o Rico, teria feito por derradeiro na sua vida, antes do suicídio, fora um filho. E este filho era Rasku. Disposta a enfrentar o gênio indômito, arrebatado e irascível de Conde Rasku, procurou apoio no filho Calico, o Rei Naldo, de ânimo mais generoso e pacífico, solicitando-lhe o conselho que até então evitara pedir por lhe faltar coragem de compartilhar com ele sua própria infâmia e ignomínia. Não havia alternativas. Chegara a hora, afinal. A sós com Rei Naldo, Rainha Alzira abriu o coração: — Calico, meu filho, não imaginas quanto me custa confessar-te, neste momento, o segredo mais bem guardado de toda a minha vida. — Se vais me contar que Rasku não é meu irmão por parte de pai, não te aflijas. Desde que nos disseste sobre o feitiço da besteira e da aparição da Mula Sem Cabeça, já o imaginava. — E teu irmão, também desconfia? – indagou-lhe preocupada. — Não que eu saiba. Afinal, somos fisicamente muito parecidos. Nossas principais diferenças residem tão somente no caráter. — Tanto melhor. Achas que Rasku já pode saber que não é filho do teu pai? — Minha mãe, ainda que estejas confirmando que Rasku é meio-irmão meu, não revelastes quem é seu pai verdadeiro. Permite-me o atrevimento? — Evidente. Queres que eu mesma diga ou preferes me dizer? — Se eu não acertar, confias em me dizer? — Sim. Quem tu achas que pode ser o pai de Rasku? — O Senhor Dugo, certamente. E, talvez por isso, meu pai o tenha assassinado. Rainha Alzira começou a chorar. Abraçou-se ao filho, balbuciando, entre soluços, a pergunta cuja resposta precisava ouvir do Rei de Avilhanas: — Tu me perdoas? — Ora, minha mãe. Quem sou eu para vos repreender? Nada sinto contra vós e bem compreendo os motivos que vos levaram a tão grave despautério, àquela asneira desmedida. — Quanto a Rasku, não posso mais ocultar-lhe a verdade, mesmo temendo sua odiosa fúria... Pelo que o conheço, será capaz de matar-me ou me odiar, desejando vingar-se pelo resto dos meus dias. — Poupe-se, então. Melhor que não saiba. Nem a Araci vou revelar o que a mim confiastes. Guardarei vosso segredo. 257H. H. Entringer Pereira — Seria mais confortável... Mas não conseguirei ocultar de Rasku a realidade, porque no dia de seu casamento terei de lhe entregar a arma paterna, o sabre de Adul Thero. — Nesse caso, todos ficarão sabendo quem é o pai do Conde Rasku – contrapôs o Rei Naldo. — Ele vai me odiar. Tenho receio de sua impetuosidade. Conheço suas inclinações para a vingança – conjeturou Rainha Alzira. – Achas que Rasku seria capaz de odiar ao ponto de querer me matar? — Que ele vos odiará, não duvido. Mas não vos mataria antes que descobrisse onde estão os vossos 144 quilos das esmeraldas que meu pai ocultou, enterrando em algum lugar. É melhor que não procureis, nem mesmo encontreis este tesouro... se quereis viver depois de contar a Rasku quem é seu pai – falou Rei Naldo, em tom de brincadeira. — Estou pensando: Rasku jamais conhecerá seu pai, tampouco a Adul Thero foi dado o direito de conhecer o filho... Estranhas armadilhas do destino. Sinceramente, ainda não decidi. Pensando melhor, já nem sei se devo revelar... Se Mago Natu estivesse aqui, pediria a ele para que contasse. — Mãe, vós me pedistes um conselho. Na cerimônia, quando Rasku se casar, entregue-lhe o sabre do Senhor Dugo, sem alardes, nem muito palavreado. Simplesmente como tributo póstumo e devida homenagem à memória daquele que foi seu fiel servo. Assim como o Rei Albe, o Rico, morreu levando consigo o segredo de onde enterrou vosso grande e precioso tesouro, assim também morreu com o Senhor Dugo o segredo de Adul Thero, pai do Conde Rasku. — Faremos então um pacto: quando eu descobrir onde estão minhas esmeraldas, direi ao Conde Rasku de quem ele é filho. Rainha Alzira saiu do Salão do Trono e, ao abrir a porta, deparou-se com Conde Rasku. Surpresa com a presença do filho naquela hora, passou-lhe pela cabeça a possibilidade de que já estivesse ali há alguns minutos, ouvindo certamente seu diálogo com o Rei Naldo, atrás da porta. Todavia, não percebeu mudanças no seu semblante, e pela forma com que a abraçou, saudando-a, certificou-se de que ele havia chegado naquele momento. — Salve, salve, Mãe Rainha. Viestes confabular com Calico sobre o meu casamento? — Não exatamente, meu filho! Conversávamos sobre as minhas esmeraldas que o Rei Albe escondeu... Tens algum palpite a respeito? — Por que não mandas cavar no local onde ele se enforcou? — Já o fiz. No exato lugar onde havia sinais de terra revolvida, acharam enterradas as cabeças do Senhor Dugo e da Mula Tá. Ah, e antes de encontrarem as duas cabeças, retiraram da cova um sabre com o nome de Adul Thero gravado na lâmina. Queres portar aquela arma no dia do teu casamento e com ela permanecer, como homenagem ao mais fiel de todos os servos reais? — É da forja de Kalibur? — Certamente. Pela têmpera e beleza, não poderia ter sido de outro artífice. — Então considere-a minha. E do meu pai, o que dar-me-ás? 258H. H. Entringer Pereira — A porção de terras que pertenceu ao Senhor Dugo, contíguas às do teu Condado, para que acrescenteis ainda mais às tuas posses algo do teu pai. Conde Rasku não compreendeu que a porção de terras a que sua mãe se referia, que acrescentaria àquelas que já possuía, era, de fato, a herdade de seu legítimo pai. Naturalmente satisfeito pelo quinhão prometido, imaginou que talvez pudesse estar escondido naquelas plagas do reinado o tão cobiçado e precioso tesouro da Rainha Alzira: as maravilhosas e valiosíssimas pedras verdes. Adentrando sem cerimônia o Salão do Trono, Conde Rasku negou-se observar o protocolo para falar com o Rei de Avilhanas. Enquanto Rei Naldo anotava em finas lâminas de ouro mensagens para convidar os reis vizinhos, seus filhos e outros amigos nobres para festejarem o nascimento de seu primogênito, o príncipe herdeiro, prestes a acontecer, o irmão o interceptou com uma saudação que usavam desde os tempos de adolescentes. Levantando os olhos das folhas de ouro, sem interromper seu trabalho, respondeu à saudação do irmão, perguntando: — O que desejas, Conde Rasku? – voltando os olhos ao que fazia, continuando a tarefa. — Vim saudá-lo, primeiramente, majestoso Rei Naldo, Senhor de Avilhanas. Na qualidade de vosso irmão, penso que agradaria muito à nossa mãe que tivéssemos um relacionamento mais cordial e amigável. — Nunca fui teu inimigo, em princípio... — Mas ainda não me perdoastes pela infelicidade do flagrante na cama com Alba. — Coisas passadas, meu caro irmão... O amor do meu filho Mulato, hoje me recompensa da vergonha que me fizestes sofrer; e pela verdadeira paixão de Alba por mim. Não fosse o trágico final que resultou no sutil encantamento dela naquele pássaro, a Albatroz, teria me casado com ela e não com Araci, arcando com o castigo de perder o direito ao trono deste Reinado. — Neste caso, seria eu o rei de Avilhanas? — Serias. O que farias, fosses tu rei de Avilhanas? Porventura encontrarias o tesouro escondido pelo Rei Albe, o Rico? — Certamente. Não dormiria até descobri-lo. Onde achas que estão as misteriosas pedras verdes? Não tens gana de possuí-las? — Conde Rasku... como és ingênuo, apesar da tua insidiosa malícia... — Por que assim me julgas, Rei Naldo? Achas incorreto alguém pretender o que lhe é de direito? — Nem tanto. Parece-me incorreto, meu nobre irmão, pleitear o que por direito não lhe é pertinente. — Reputa-me indigno do meu quinhão? — Em absoluto. Discordo da irrefletida ânsia e desta aflição desvelada por te assenhorear daquele tesouro, cismando em fazer-te rico. Não te esqueças de que antes de nós dois, as preciosas pedras verdes pertencem de fato à nossa mãe, cabendo a ela querer ou não as encontrar. 259H. H. Entringer Pereira — Calico, nossa mãe já desistiu de seus sonhos. Mesmo porque nada lhe interessa mais, nem se ocupa atualmente de outra coisa que não pintar quadros de mau gosto e tocar cavaquinho. — Rasku, Rainha Alzira é a mulher mais inteligente que conheço. Lutou e continua pelejando com forças potencialmente misteriosas, sem temer nem se dominar pelo medo. Desafia poderes ocultos inferiores, não por abuso, mas por sua superioridade, benevolência e equidade. Nossa mãe fez por merecer seu cognome de soberana RARA, tanto por mérito quanto por honradez. — Vejo que meu irmão é um ardoroso defensor dos afetos filiais... com justa razão. Afinal, da Rainha Alzira recebeste o glorioso trono de um reinado rico e pujante apenas por seres primogênito e beijar-lhe as mãos, submisso e dócil... Quanto a mim, não me aquinhoou o destino com tanta candura e sujeição. Não me deu a natureza ânimo de afetada humildade e servil rebaixamento. — Conde Rasku, insinuas que recebi o trono de Avilhanas de mão beijada? Ofende-me tua insolência e irreconhecida ingratidão. Não somente és ingrato à Rainha Alzira, que te aquinhoou com as belas terras do teu Condado, como o sois à figura da nossa venerada mãe, que desacatais na minha pessoa. — Desculpe-me, Senhor Rei Naldo, se vos ofendo. Apenas manifesto com sinceridade meu sentimento de que na balança do coração da Rainha Alzira um prato é teu, o outro da Rainha Araci. Sinto que me excluem e que me ocultam alguma verdade inconveniente. — E tu também nos oculta algo que teu coração sonega? Por acaso pretendes casar-vos com uma mulher tão mais velha, ainda que bonita, só por amor? A pergunta deixou Conde Rasku encabulado. Era preciso sair do assunto, sem transparecer que havia algo oculto no interesse repentino do Conde Rasku pela Marquesa de Sonça, a Senhora Pan Thera. — Rei Naldo, Senhor de Avilhanas, ocupo-me agora exclusivamente do meu casamento. Vou preveni-lo de que, até antes de casar-me, escavarei por todos os locais que suspeito ocultar o tesouro do Rei Albe, o Rico, quer dizer... da Rainha Alzira, a Soberana RARA. Até mais vê-lo. Salve, salve. — Escave à vontade, Conde Rasku. Dentro dos limites do teu território. Se o fizerdes onde não vos pertence, tenho autoridade o bastante para mandar matar-vos. Dando de ombros, como se não tivesse ouvido a advertência do Rei Naldo, deixando o Salão do Trono, o belo Conde Rasku, antes de bater a porta atrás de si, ainda falou a ele: — Estou me preparando para viajar ao Reinado de Trindade. Vou ao casamento do Bruxo Neno. Não irás? — Estou aguardando o nascimento do meu filho. Aproveite e leve à Corte do Rei Mor o convite para a festa do nascimento de Gesu Aldo. Creio que as datas vão coincidir: a da festa de nascimento com a data do casamento. Apresente minhas desculpas. Conde Rasku bateu a porta meio irritado, enquanto o rei prosseguiu gravando suas placas de ouro, formulando o restante dos convites para a festa da natividade do esperado Príncipe Gesu Aldo. 260H. H. Entringer Pereira Pensando sobre o comportamento astucioso de seu meio-irmão, o rei de Avilhanas concluiu que, por direito, era também honesto revelar a Rasku sua filiação, porém não era prudente intentá-lo naquele momento. A vingança e o ódio de Rasku seriam implacáveis. Não obstante o provável revide, não descartava a possibilidade de ele, por vingança e revolta, tramar a morte não só da rainha-mãe como de sua mulher, Rainha Araci, ou dos filhos que porventura viessem ter. Que Rasku era perigoso e pérfido não havia dúvidas. Era preciso vigiar-lhe os passos, mantê-lo sob controle e, na medida do possível, evitar contrariá-lo. O arauto real anunciou com sua trombeta a chegada de um visitante. Rainha Alzira abriu a janela de seus confortáveis aposentos e viu a caravana se aproximando. Além dos fornecedores de provisões para o Palácio das Esmeraldas, junto dos mercadores, uma mulher com suas damas de companhia e servos desceram das carruagens. Facilmente identificou a primeira delas: era Professora Plínia. Em meio a uma festiva algazarra, viu também descarregar dos animais uma canastra de cobre e madeira marchetada, com o desenho de um pássaro, trazendo ao bico um bebê: era a bagagem da Senhora Natividade da Luz, a parteira das rainhas. O coração da Rainha Alzira acelerou-se e ela, por breves instantes, lembrou-se das duas últimas vezes em que a parteira veio ao palácio: por ocasião do nascimento do menino Mulato e, anteriormente, no nascimento de seu filho Rasku. Lembranças que lhe traziam secretos sofrimentos, pois evocavam recordações que Rainha Alzira preferia não trazer ao presente. Arrumou-se, penteou sua longa cabeleira já agrisalhada, desceu as escadarias e veio ao pórtico principal receber suas nobres e queridas visitantes. Rainha Araci também estava na recepção, segurando carinhosamente sua barriga com muita expectativa, feliz por saber que teria a assistência da competente profissional, Senhora Natividade da Luz, além da assessoria impecável da Professora Plínia, que entendia como ninguém de todas as arrumações necessárias para uma grande e inesquecível comemoração. Rei Naldo não economizou gentilezas, providenciando as melhores acomodações, os mais saborosos acepipes, engalanando o Palácio das Esmeraldas com os adornos e emblemas próprios daquela Casa Real, exibidos pela derradeira vez na festa de sua coroação como Soberano de Avilhanas e casamento com a Rainha Araci
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URUCUMACUÃ BY H.H.ENTRINGER PEREIRA LIVRO 3 CAPITULO 62
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A GAIOLA Chegar com sua nova corte ao Reinado da Madeira foi umas das grandes alegrias que a Imperatriz Gônia compartilhou com o Imperador Médium, ainda que o motivo principal da viagem também lhes causasse mais preocupações que simplesmente deleite. O Palácio da Madeira, uma portentosa construção de pedras e madeira, rústico, mas luxuosamente confortável, não tinha o mesmo esplendor que o Palácio Fortaleza, no entanto seus bem cuidados jardins, artisticamente projetados, só rivalizavam com os do Palácio das Esmeraldas, cultivados com muito zelo pela própria soberana Rara, Rainha Alzira. Bem em frente ao palácio, um canteiro de rosadas flores exóticas, muito exuberantes, parecendo de porcelana, chamou atenção do Imperador Médium, que ainda não as conhecia. Encantado com sua beleza, perguntou à Imperatriz Gônia: — Que maravilhosas. Como se chamam? — Não têm nome ainda. Nasceram aqui desde que sepultamos o meu pavão cor-de-rosa e branco neste local. Para mim vão sempre lembrar meu pavão encantado. Dê-lhes o nome que quiser... — De agora em diante, serão conhecidas como Bastão do Imperador (Etlingera elater ), em minha homenagem! – disse, gracejando. A Imperatriz sorriu e concordou: — Assim seja! Reencontrando nobres amigos, vassalos e serviçais do Palácio da Madeira, atualizaram-se das notícias com os minuciosos relatórios sobre os acontecimentos desde a viagem da Rainha Gônia para o Reinado do Elo Dourado quando da celebração de suas núpcias. A Imperatriz e o Imperador, recebidos com honrarias e festas, sentiram a ausência do Arauto Real, o Senhor Gaio, que não veio saudá-los em cumprimento ao protocolo da recepção do casal imperial. Cumpridas as formalidades da chegada, logo a Imperatriz perguntou onde se encontrava o Senhor Gaio, considerado por ela seu segundo pai, a quem carinhosamente tratava de Papai Gaio, um nobre e honrado cortesão, arauto real do Palácio da Madeira desde tempos imemoriais. Senhor Gaio desfrutava de grande notoriedade. Informado e bem-falante, era quem se incumbia de levar à Rainha Gônia todas as novidades do reinado, além de dedicar-lhe especial apreço e paternal afeição, merecendo dela, em contrapartida, consideração e devotamento de filha. — Como está o meu Papai Gaio? – perguntou a sua afetuosa ama, Senhora Grã Dona. — Em situação bem delicada, Senhora. Assim que a Imperatriz viajou, entristeceu-se, calou-se e parece descontente de viver... — Preciso vê-lo agora mesmo. Pelo janelão dos aposentos do Senhor Gaio, entrava a luz da tarde. A brisa que vinha do rio da Madeira arejava todo o espaçoso cômodo. Ao anúncio da chegada da Imperatriz Gônia com o marido, o Imperador Médium, o Senhor Gaio postou-se de pé 250H. H. Entringer Pereira com dificuldade e, fraquejando, veio ao seu encontro, abraçando-os saudoso. O coração da Imperatriz encheu-se de tristeza, seus olhos marejaram lágrimas. Diferençava bastante no semblante de quando o vira pela derradeira vez, antes de viajar. Reunindo suas derradeiras forças, o Senhor Gaio correspondeu aos abraços da Imperatriz e balbuciou trêmulo, com a voz rouca e grave: — Minha filhinha querida, minha amada rainha... Gônia, minha rainha... Minha... rai... min... E prostrou-se, desmaiando aos pés da Imperatriz que, na tentativa de ampará-lo sustentou-o por debaixo dos braços, e subitamente desapareceu o peso do Senhor Gaio, desfez-se o formato de seu corpo e, ao olhar para suas mãos, a Imperatriz segurava um maravilhoso pássaro de penas verdes brilhantes, bico encurvado, lembrando o nariz adunco do Papai Gaio. Transformara-se numa ave diferente de todas as que ela conhecia. O Senhor Gaio havia se encantado. Surpresa e enternecida, murmurou: — Meu Papai Gaio, meu Papá Gaio, fique sempre comigo! A ave subiu-lhe aos ombros e continuou falando: — Gônia, oh Gônia!... Sou eu... seu papai Gaio... Sou seu papá, seu papagaio! Apenas o Imperador e a Imperatriz presenciaram o momento daquele encantamento. Dali por diante, a todos os lugares que se dirigiam, o Papagaio os acompanhava, despertando admiração pelo seu inusitado jeito de falar, cantando e alegrando o casal imperial, como se continuasse exercendo sua honrosa e vitalícia função de arauto real. A Imperatriz tratou de reservar como vivenda para sua encantadora e estimada ave verde uma grande jaula de ouro, residência antiga de uma outra ave que muito estimara: um raro pavão cor-de-rosa, cuja morte, há alguns anos, deixou-a entristecida e consternada. A jaula ornamentada de belas flores de prata, cravejadas de pedras preciosas, com poleiro de marfim, seria então a pousada noturna a sua encantadora e falante ave verde. Todos os dias, ao cair da noite, entregava a ave falante nas mãos do Imperador Médium, solicitando: — Por favor, leve meu Papai Gaio lá para dormir! Ao anoitecer, era o Imperador Médium quem carinhosamente cumpria aquele ritual, pegando a ave encantada de plumagem verde brilhante pelos pés, conduzindo-a dos arbustos e arvoredos dos jardins do Palácio, onde passava todo o dia, até a maravilhosa jaula, atendendo ao pedido da Imperatriz. Já habituada àquela rotina, a ave falante divertia o Imperador, conversando com ele durante o percurso do jardim até sua pousada, imitando a ordem da Imperatriz: — Médium, Médium, leve o papai Gaio lá... leve o papagaio lá! O hábito de levar o Papai Gaio lá, fez com que o Imperador denominasse aquela clausura de GAIO LÁ, Gaiola.
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URUCUMACUÃ H.H.ENTRINGER PERERIRA - LIVRO 3 CAPÍTULO 61
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O NASCIMENTO DE OUTROS PRÍNCIPES E PRINCESAS, INCLUINDO URUCUMACUÃ E KUROKURU Quando os derradeiros hóspedes do Palácio Fortaleza, remanescentes da festa de casamento, regressaram aos seus próprios reinados, o imperador, Rei Médium, e a Imperatriz, Rainha Gônia, se empenharam na administração dos interesses de seus vastos domínios, nomeando intendentes nas diversas áreas de interesse do Império do Elo Dourado. Convocaram tantos conselheiros reais quantos foram necessários, entre os que apresentavam melhor disposição de trabalho e competência para a gestão administrativa, visando restaurar a ordem e o equilíbrio, com a manutenção da paz e o contínuo progresso do colossal e recém-formado. Restabelecida a rotina no Palácio Fortaleza, o imperador, Rei Médium, pôde voltar as suas observações astrológicas, dando continuidade aos estudos e à prática dos rituais da alta Magia. Sempre que precisava se defender das incessantes interferências de bruxos e feiticeiros que agiam naqueles domínios atendendo desígnios de soberanos rivais, desdenhosos e invejosos da beleza, da exuberância e da incomparável riqueza da cidade do Elo Dourado, recorria à proficiência do Mago Natu. Devido à ausência deste, em viagem demorada para o Reino da Perfeição, interessara-se, ele mesmo, ainda mais, por desvendar os secretos e misteriosos efeitos da baixa magia manipulada pelo Bruxo Neno, que utilizara, sem qualquer escrúpulo, poderes ocultos na transformação de alguns de seus especiais convidados – um rei, duas rainhas, dois príncipes e uma princesa – em horrendas criaturas das águas: o Rei Negro Norato transformara-se na Cobra Grande (Cobra Norato); a Rainha Zomba, no peixe arara, a Pirarara; a Rainha Trapa, na Enguia (Poraquê ou Peixe-Elétrico); o Príncipe Pintado, no peixe Pintado; o Príncipe Ur, no peixe Surubim; e a Princesa Kachara, no peixe Cachara. Ainda que o objeto utilizado pelo Bruxo Neno para produzir aqueles encantamentos – a joia de camafeus da Tia Ara pertencente à Rainha Gônia – já estivesse neutralizado e desencantado, transformado pelo Mago Natu num inofensivo punhado de amendoins, preocupava-se o Imperador Médium com a possibilidade de vingança do Bruxo Neno. Ao se mudar para o reinado do Rei Mor, no Reino de Trindade, certamente ele acrescentaria outras forças ocultas aliando-se a sua mãe, a Feiticeira Zureta, apelidada de Zuzu, a Sacerdotisa das Sombras, igualmente moradora do Reinado de Trindade. Não descartaria a provável conjugação de esforços para desestabilizar a paz e a ordem do Império do Elo Dourado. O Imperador Médium, informado por seus vassalos das proezas mágicas da Sacerdotisa das Sombras, a Feiticeira Zuzu, temia suas invectivas contra seu império, porque não duvidava da probabilidade de a feiticeira lançar mão das poderosas forças magnetizadas com o encantamento do bridão de ouro que pertencera à Mula Tá do seu tio-avô, Rei Albe, o Rico. Depois dos testemunhos da Rainha Araci e do marido Rei Naldo, o Calico, do Reinado de Avilhanas, sobre os controvertidos acontecimentos decorrentes da utilização daquele bridão de fios de ouro, que se encontrava agora sob a posse da carocha, Rei Médium temia que a feiticeira continuasse usando a seu bel-prazer aquele instrumento 243H. H. Entringer Pereira para desencadear catástrofes, dizimar plantações, estragar colheitas, encantar pessoas em animais ou produzir outras feras e monstros. Havia, porém, entre as informações desencontradas, uma que carecia averiguar. Ao mesmo tempo em que circulavam comentários de que o bridão mágico permanecia sob poder e guarda da Feiticeira Zuzu, coisa que o Mago Natu confirmara e o próprio Rei Mor contara ao Bruxo Neno, também chegou-lhe aos ouvidos que o mesmo acessório encantado fora vendido pela feiticeira à Marquesa de Sonça, por boa quantidade de pedras preciosas, antes de se mudar para o Reinado de Trindade. A marquesa mantinha aquela valiosa peça mágica guardada sob chaves, no mais secreto dos secretos esconderijos de sua mansão. Segundo comentavam maliciosamente, essa seria a razão principal que levara o belíssimo e intrépido sedutor, Conde Rasku, irmão do Rei Naldo, a proclamar seu noivado durante a festa de casamento do Imperador, anunciando a intenção de esposar a não menos sedutora e voluptuosa Marquesa de Sonça, a Senhorita Pan Thera. “Haveria, então, dois bridões encantados? ”, inquietou-se Rei Médium. “Ou a Feiticeira Zuzu teria duplicado a peça, falsificando-a e vendendo a cópia? Ou teria ficado com a cópia e, inadvertidamente, vendido o original? Em que mãos estaria o objeto verdadeiro?” Esquecera-se de questionar sobre o tal dilema, assunto do qual o Mago Natu certamente lhe daria a resposta exata. Interrompendo os momentos de estudo e meditação do marido em seu claustro, Rainha Gônia adentrou a Câmara do GRAU. Afoita e um tanto ansiosa, desculpou-se pela interferência nos contatos do marido diante do Espelho Universal (EU), com quem ele se consultava sempre que algo o inquietava ou requeria solução urgente. A Imperatriz solicitou ao Imperador Rei Médium sua pedra redonda, o cabochão de diamante presenteado pelo Grande Rei. Explicou que precisava vê-lo. Antes de entregar-lhe o objeto, o marido, pegando na tal pedra de filosofar, a examinou atenciosamente, passando às mãos da mulher, observando: — Gônia, olhe bem dentro do cabochão. Consegues ver algo? — O que queres que eu veja diz respeito a mim ou a ti? — Parece com alguém que conheces? – perguntou, mostrando o semblante de uma pessoa que se apresentava no interior da cristalina pedra reluzente. Colocando o valioso cabochão brilhante na palma aberta da mão esquerda, a Imperatriz lembrou-se das recomendações do Grande Rei sobre os poderes mágicos especiais imantizados naquele coruscante diamante. Dirigiu o pensamento ao Grande Rei e viu quando se projetou no centro translúcido, em miniatura, uma pessoa acamada: — É Gaio, o meu segundo pai. Meu Papai Gaio. Parece-me que está de cama! — surpreendeu-se a Imperatriz. — Exatamente. Penso que deveremos nos ausentar do Palácio Fortaleza por uns tempos. É bom que visitemos o Palácio da Madeira. — Concordo. Estou mesmo precisando rever meu adorado palácio e sinto que meu Papai Gaio parece adoentado! A Imperatriz Gônia, saudosa de rever sua antiga Corte, manifestou ao marido o desejo de se ausentar do Palácio Fortaleza, ainda que por breve tempo. Dizendo-se, além de preocupada com o que vira no cabochão de diamante, muito saudosa de sua 244H. H. Entringer Pereira aprazível e antiga moradia, no Reinado da Madeira, lugar também encantador, onde nascera, crescera e reinara, desde a época do misterioso desaparecimento de seus pais, o Rei Ofin e a Rainha Tarope. Disposto a satisfazer-lhe os desejos para que nenhuma tristeza pudesse abatê-la, turvando-lhe a beleza, o Imperador Médium planejou de pronto a demorada viagem, reunindo e escolhendo dentre seus súditos os que iriam acompanhá-los, arrumando suprimentos nas embarcações, tudo quanto fosse necessário ao conforto e à sobrevivência da comitiva real, durante o extenso percurso pelas águas do plácido rio Aguaporé. Entre os mimos e objetos ganhados no seu casamento, um deles especialmente pelas características secretas, a Imperatriz Gônia resolvera não deixar exposto à curiosidade da criadagem: a grande caixa preta de madeira, que só o tempo haveria de abrir, quando nascessem os filhos gêmeos Urucumacuã e Kurokuru. Pediu ao Imperador que a guardasse na Câmara do GRAU, no compartimento onde a nenhum serviçal era permitido penetrar. O outro, pela afeição e ternura que lhe despertara, conseguiu que o marido providenciasse acomodação especial na embarcação para transportar: o filhote do animalzinho de pelagem branca, presenteado pelo Rei Kornio e pela Rainha Bisca: o fofo e adorável Unikórnio. Levaria consigo também seu cabochão de diamante. Antes de partirem para demorada jornada até ao Reinado da Madeira, o Imperador Médium se lembrou do pedido que lhe fizera o amigo Mago Natu: que encomendasse as duas espadas dos filhos gêmeos, cujo nascimento aconteceria dentro dos três anos. Era preciso tempo o bastante para que o habilidoso ourives e inigualável ferreiro Kalibur pudesse aprontá-las com indispensável esmero, requerido pelo Imperador Médium. Seus futuros donos e legítimos senhores, o Príncipe Urucumacuã e o Príncipe Kurokuru, certamente teriam não só as melhores, mas as mais belas espadas que o joalheiro, ourives e ferreiro já fabricara. Dirigindo-se às forjas de Kalibur, o Imperador levou uma preciosa quantidade de esmeraldas, rubis e brilhantes, além de ouro fino para modelar as empunhaduras das espadas. O metal das lâminas o próprio Kalibur providenciaria, pois a liga com que as preparava era o seu mais bem guardado e indevassável segredo. Imperador Médium detalhou sua encomenda, fazendo apenas uma recomendação: — Senhor Kalibur, deverás incrustar os rubis na espada do Príncipe Urucumacuã e as esmeraldas na do Príncipe Kurokuru. Os brilhantes nas duas, conforme teus próprios critérios, lembrando-te de que na espada do Príncipe Urucumacuã deverás insculpir o emblema do Império do Elo Dourado, acrescido de um pássaro adornado de rubis. Na espada do Príncipe Kurokuru, esse mesmo emblema, porém no lugar do pássaro, farás um sapo adornado com as esmeraldas. — De todas as encomendas que de vós recebi, Senhor Imperador, esta é a mais nobre e a mais honrosa. Permita-me, Senhor, fazer-vos um modesto e singelo comentário. Por que emblemas tão diferentes para uma e outra, se os príncipes serão gêmeos? — Senhor Kalibur, são mistérios que não nos cabe questionar. Estou vos transmitindo a ordem conforme recomendação do Mago Natu. Deste momento em 245H. H. Entringer Pereira diante, está dada a Ordem Imperial da Espada do Pássaro de Fogo e a Ordem Imperial da Espada do Sapo Verde, no Império do Elo Dourado. O Senhor Kalibur desculpou-se pela ousadia de questionar a imperial ordenação e timidamente pediu ao Imperador Médium: — Grande Imperador, Senhor do Elo Dourado, dá-me a ordem para fazer uma outra espada, para meu futuro filho? — Então também esperas por um filho? – surpreendeu-se o Imperador. — Sim – respondeu Kalibur – antes que o Mago Natu partisse, falou-me e à minha mulher que teremos um filho em breve. Seu nascimento antecederá o de vossos reais príncipes. Ele será chamado pelo nome de Guará. Será guardião e companheiro de vossos príncipes. — Tens, a partir de agora, minha autorização para confeccionar a espada. Já sabes o emblema que lhe convém? — Ainda não. Quero ouvir a ordem de Vossa Imperial vontade. — Faça-lhe a espada com o emblema de um lobo e incruste-lhe nos olhos rubis e brilhantes, com uma pedra ônix no centro. Pertencerá à Ordem Imperial da Espada do Lobo dos Olhos Vermelhos. — Assim farei, Senhor Imperador. Numa reverência respeitosa e amiga, saudou o Imperador, que também o abraçou antes de se despedir, avisando-o de que se ausentaria por algum tempo da cidade do Elo Dourado com a Imperatriz Gônia. Quando voltassem, provavelmente o menino Guará já haveria nascido. Das forjas do Senhor Kalibur, o Imperador Médium dirigiu-se às cavalariças. Levou consigo suas finas lâminas de ouro sobre pranchas de madeira e o pontiagudo estilete para anotações e o assentamento dos potros nascidos naquela semana. Inicialmente, foi à baia da égua Metida, registrando o potrinho negro já denominado Tição, registrado sob o número 171 de sua lista de corcéis nascidos naquele último ano. Conversou com o palafreneiro, que esfregava a almofaça num jovem e irrequieto corcel branco e perguntou: — Já iniciastes a doma deste corcel? — Não é tempo ainda, Senhor Imperador. Ele estará perfeito para montaria daqui uns três anos. Pretendeis que eu o faça logo? — Sim, iniciai este trabalho. Quero domados alguns dos meus melhores corcéis, para quando meus filhos puderem cavalgar, os dois melhores dentre os que já estiverem prontos serão reservados a eles. Quero também que deixes o Tição, aquele potrinho negro que nasceu na noite do meu casamento, adequadamente adestrado tão logo atinja a idade própria. Vou entregá-lo como prêmio ao vencedor da grande Corrida Numpessó, quando comemorarmos o nascimento dos príncipes Urucumacuã e Kurokuru. Recomendou ao cavalariço trato diferenciado ao único exemplar negro de sua criação de corcéis, o Tição, por isso, separado como prêmio ao ganhador da Corrida de Numpessó. Haveria ainda outras duas premiações que tencionava entregar ao primeiro e ao segundo corredores colocados. Voltou às forjas de Kalibur e fez a encomenda: 246H. H. Entringer Pereira — Senhor Kalibur, apronte-me outra encomenda. Faça-me a gentileza de forjar uma taça de ouro, cravejada de brilhantes, no formato deste copo. Assim também outro objeto, todo de prata, no formato desta bacia, só que mais funda, com uma alça em cada lado. Adorne-a com estas pequenas pérolas. Descreveu os tamanhos e os formatos dos objetos pretendidos e entregou ao Senhor Kalibur os materiais necessários para a confecção das duas peças com as quais honraria os dois melhores corredores de Numpessó, por ocasião do nascimento dos príncipes. De volta ao Palácio Fortaleza, no grande portal da ala Leste, reservada à entrada dos cavaleiros, o Imperador recebeu um aviso de seu emissário: — Saúdo-vos em Paz, Grande Imperador. Anuncio-vos uma visita que já vos aguarda no Salão de Audiências. — Quem é, dizei-me... — O Senhor Frutuoso. — Diga-lhe que não demoro a atendê-lo. Imperador Médium desmontou-se, entregou seu corcel para ser levado às baias e dirigiu-se até o salão onde o aguardava o Senhor Frutuoso. Ao ver o Imperador, o humilde súdito curvou-se e, sem direcionar os olhos ao soberano, saudou-o: — Grande Imperador Médium, Paz e Saúde vos abençoem! — Senhor Frutuoso, o que vos aflige? — Senhor Imperador, desculpe-me incomodar-vos com assunto de tão pequena importância... Mas, trata-se de algo que Vossa Realeza Imperial deve dizer-me como proceder. — Sim. Dizei-me do que se cuida. — Trago-vos este anel. Olhai-o e avaliai. Parece-vos uma joia de real valor ou apenas uma imitação de um adorno vulgar? Examinando cuidadosamente a peça, o Imperador Médium emitiu sem titubear sua avaliação: — Trata-se de finíssima e preciosa joia de grande valor. Ainda não vi brilhante mais raro e de tão avantajado quilate. De quem o adquiriste? — Senhor Imperador, esse é o meu grande dilema. Não descobri ainda de quem é, nem a quem pertence essa maravilhosa joia... — Isto quer dizer que a encontraste? — Exatamente, Senhor... — Dizei-me onde, como e quando? Senhor Frutuoso, nascido e criado na cidade do Elo Dourado, era descendente de uma tradicional família camponesa que sempre se dedicou exclusivamente a produzir variedades de frutas e verduras. Desde jovem, herdara dos pais o especial pendor para o cultivo de espécies diversas, algumas bem raras, mantendo na chácara em que morava uma extensa área plantada com fruteiras, recanto predileto dos pássaros, borboletas e abelhas. A propriedade do Senhor Frutuoso era uma espécie de paraíso particular de tão bem cuidada. Na cidade do Elo Dourado, numa singela e acolhedora construção de pedras, toda avarandada, comercializava seletas variedades do que cultivava e colhia. 247H. H. Entringer Pereira Senhor Frutuoso ficara viúvo há alguns anos, antes de ter tido filhos, na mesma época em que o pai do Rei Médium, Rei Pay, também enviuvara. Acostumara-se tão rápido à viuvez que não mais intencionara casar-se. Vivia exclusivamente dedicado à lida do pomar, na qualidade de homem simples, mas trabalhador, honrado e virtuoso, pelo que granjeava a distinta consideração de toda a nobreza e dos demais moradores do reinado. Por suas qualidades, tinha livre acesso ao Palácio Fortaleza, que mantinha sempre farto e bem provido de todas as delícias que cultivava. O Imperador, por isso, o tratava com requintes de fidalgo. Sua frutaria era frequentada pela alta corte do Elo Dourado e, amiúde, transformava-se em ponto de encontro não só dos nobres, mas também dos populares, que desfrutavam aprazíveis momentos, conversando e saboreando os frutos doces e suculentos dos cultivares do Senhor Frutuoso. À pergunta do Imperador, o Senhor Frutuoso respondeu: — Senhor Imperador, como sabeis, passam pelo meu comércio nobres e súditos não só deste como também de outros reinos que nos visitam. Recebo em estabelecimento desde a Vossa imperial pessoa até o vosso mais humilde serviçal. Logo após a festa de vosso casamento, que a nenhuma outra se poderá comparar, muitos de vossos convidados honraram-me com suas presenças. Depois que quase todos se foram, fiz uma grande conferência nas minhas bancas de frutas, para contar as unidades vendidas e as restantes nas cestas, para calcular meu lucro correspondente às moedas de ouro que recebi. Quando concluía o procedimento, limpando uma das bancas que praticamente estava com os cestos vazios, deparei-me com este precioso anel deixado no fundo de uma delas. Fiquei receoso de sair indagando diretamente aos vossos súditos, ou mesmo aos vossos nobres convidados, a quem deles pertenceria, porque receei que qualquer que não fosse o dono legítimo se passasse por tal, tentando enganar-me. — Estais certo, Senhor Frutuoso... É evidente que tão valiosa peça pertença a um rei, uma rainha ou algum fidalgo da Corte. — Decerto, Senhor Imperador. Este é o motivo que me traz até vós. Quero saber se algum dentre os vossos convidados notificou a perda desta preciosidade. E, também, solicito vossa orientação quanto ao que devo fazer com este valiosíssimo objeto. Tenho comigo que deverei entregá-lo a vós para que fique honrosamente depositado e em segurança, até que seu verdadeiro dono o reclame. — Senhor Frutuoso, muito me alegra vossa conduta fiel e honrada. Todavia, o mais digno depositário desta joia sois vós. Fique com ela e a guarde em sigilo para que malfeitores não venham saber que tens sob vosso poder objeto tão precioso. Espere até que seu dono o reclame. Dentro de algum tempo, haverá a festa de nascimento dos meus filhos e, certamente, os mesmos convidados estarão por aqui, novamente. Assim, poderás devolver o anel pessoalmente, ao legítimo proprietário. Não indagues a ninguém mais sobre este achado. Falastes com alguém mais a respeito deste anel? — Não propriamente, Senhor Imperador. Lembro-me, no entanto, de que no momento em que o resgatei dentre as frutas, havia um dos vossos convidados, um dos derradeiros a retirar-se naquela tarde da frutaria. Sinto que ele percebeu quando o peguei no fundo da cesta e o coloquei no cofre... 248H. H. Entringer Pereira — Tinha aquela pessoa aparência de nobre ou ares de fidalgo? Vós o conheceis? — Sim, estava ele momentos antes em companhia do Rei Mor, da Rainha Sissu e de um príncipe cujo nome não me lembro... Depois que os outros três saíram... o Bruxo Neno... sim, era ele mesmo, o Bruxo Neno, demorou-se mais um pouco, escolhendo algumas outras frutas para comê-las durante a viagem de mudança para o Reinado de Trindade, segundo me confidenciou... Não perguntei a ele se o anel lhe pertencia, porque não é o tipo de joia que um bruxo poderia ter, nem tampouco haveria de ser do Rei Mor, da Rainha Sissu ou do príncipe porque nenhum deles circulou nas proximidades da cesta em que o anel foi deixado. — Senhor Frutuoso, não temo que o Bruxo Neno seja motivado a molestá-lo para se apoderar do anel, mas receio que comente o acontecido com pessoas de seu relacionamento, pouco ou nada escrupulosas, na intenção de fazer-se de importante e conhecedor de segredos no intuito de angariar fama e credibilidade. Este me parece o verdadeiro perigo. — Neste caso, ficai com o anel, Senhor Imperador! É mais seguro para mim e estarei a salvo de quaisquer contratempos. — Parece-me razoável, Senhor Frutuoso, a vossa proposta. Mas estou para me ausentar por uma temporada da cidade do Elo Dourado. Estando o dono do anel ainda por aqui, certamente virá procurá-lo nos mesmos lugares por onde passeou. Ficará mais fácil reencontrá-lo se estiver convosco. Fique com a joia. Também estará segura sob sua guarda. Senhor Frutuoso, com a posse do magnífico anel de brilhante autorizada pelo Imperador, despediu-se respeitosa e reverentemente, augurando ao Imperador Médium feliz viagem em companhia de sua adorável Imperatriz Gônia. Entregou uma cesta repleta das mais saborosas ameixas e apetitosos pêssegos, preferências da Imperatriz, colhidos especialmente no alvorecer.
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URUCUMACUÃ BY H.H.ENTRINGER PEREIRA LIVRO 2 CAPÍTULO 60
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NASCIMENTO DA PRINCESA HÉVEA Exatamente quarenta e cinco dias haviam se passado, desde que a Professora Plínia iniciara as aulas de leitura de seus manuscritos sobre o casamento do Rei Médium e da Rainha Gônia e de alguns outros episódios envolvendo personagens do mundo em que viviam os dois príncipes gêmeos. Com muita paciência e zelo, explicara alguns trechos que exigiam mais atenção, com palavreado simples e resumindo outros; não ia além do que a compreensão do Príncipe Urucumacuã e do Príncipe Kurokuru suportava, embora os dois meninos possuíssem excepcional capacidade de entendimento. Nada ainda havia relatado com referência às efemérides do nascimento de Urucumacuã e Kurokuru. Quando Professora Plínia olhou para o céu, avistou um pássaro branco, identificado por Albatroz, cruzar num voo elegante, de Leste a Oeste e depois de Norte a Sul, sobre o pátio interno do Palácio Fortaleza. Imediatamente, se levantou, desculpando-se com os príncipes: — Queridos Urucumacuã e Kurokuru, hoje não teremos nem mais leitura, nem mais histórias. Preciso preparar o cerimonial para a recepção da Princesa Hévea, que deve estar nascendo. Ela chegou neste momento. — Princesa Hévea? Nossa irmã? – falaram juntos. — Sim. Ela mesma. Depois que a Senhora Natividade da Luz trouxer o bebê para mostrá-lo ao Sol, e a Rainha Alzira depositar o óleo de mirra e o sal cor-de-rosa atrás da porta nos aposentos de vossa mãe, podereis entrar para conhecer a princesinha e desejar-lhe boas-vindas! Fechou os manuscritos dentro de uma caixa dourada, concluindo: — Não haverá festa no Palácio Fortaleza desta vez, conforme houve quando vós nascestes, mas só voltaremos às nossas histórias de hoje em sete dias... — Professora Plínia, já entendi o que se passou até o casamento dos meus pais. Hoje está fazendo dez anos que eles se casaram e sete anos que nós nascemos... O Príncipe Kurokuru, menos paciente que o irmão, manifestou-se: — Por que não vai haver sete dias de festa, se hoje também estamos inteirando sete anos? — Querem que eu continue contando a história para entenderem por quê? – indagou Professora Plínia, brincando com os dois. — Por mim, a gente continua escutando as histórias, já que não teremos festa – opinou Urucumacuã. — Por mim, só daqui a sete dias mesmo. Estou com vontade de sair com meu pai, para catar folhas – preferiu o Príncipe Kurokuru. Então, continuaremos de hoje a sete dias. Passados os sete dias do nascimento da Princesa Hévea, a Professora Plínia, depois de cumpridos todos os rituais propiciatórios com os pais da recém-nascida e o Mago Natu, reiniciou a leitura de seus manuscritos aos dois príncipes, voltando à história, a partir da época em que os convidados da festa do casamento do Rei Médium com a Rainha Gônia voltaram para os seus reinados, já convidados para um outro casamento no Reino de Trindade – do Bruxo Neno com a serva Murmur – e para os cerimoniais de nascimento do Príncipe Gesu Aldo, filho do Rei Naldo com a Rainha Araci, no Reino de Avilhanas. Continuando, assim disse Plínia...
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URUCUMACUÃ BY H.H.ENTRINGER PEREIRA LIVRO 2 CAPÍTULO 59
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A DESPEDIDA Na Praia da Lua Clara, uma multidão de convidados ocupava seus lugares às mesas para o monumental banquete de despedida do casamento imperial. Não havia lugares desocupados, à exceção dos cinco assentos marcados com os nomes Rei Negro Norato, Rainha Zomba, Princesa Kachara, Príncipe Surubim e Príncipe Pintado. Nenhum dos convidados próximos daquelas cadeiras teve audácia suficiente para indagar ao Mago Natu porque ainda não havia desfeito o embaraçoso feitiço. Tampouco houve corajoso suficiente para exigir providências quanto à leviana e inconsequente atitude do Bruxo Neno. Os vizinhos das cadeiras vazias guardavam silêncio indicativo de que confiavam que algo ainda pudesse acontecer no sentido de reverter o encantamento dos cinco. Deslumbrante, vestida de prateado, com um arranjo de mimosas orquídeas lhe adornando os cabelos, na falta da joia da Tia Ara, a Imperatriz Gônia verteu para si todos os fascinados olhares quando chegou envolta numa nuvem de borboletinhas brancas, ao lado do Imperador Médium, não menos garboso, trajado de branco, sob uma casaca bordada de ouro. Não havia no local casal mais sobranceiro. O Grande Rei veio recebê-los; colocando-se entre os dois, conduzia a Imperatriz a sua esquerda e o imperador, a sua direita. Levou-os até o lugar reservado, preparado adequadamente e ornamentado para o trio mais importante e radioso do banquete, no meio de uma gigantesca mesa, em cujas cabeceiras nenhum convidado ousara se assentar, enquanto uma sinfonia celestial envolveu a todos com os mais harmoniosos e sublimes acordes. Mago Natu, um pouquinho atrasado, entrou discretamente pela ala lateral das mesas dos reis, rainhas e princesas e viu quando o Conde Rasku acintosamente cortejava a Marquesa de Sonsa, roçando-lhe a perna por debaixo da mesa. Não era preciso dizer nada: os dois estavam enamorados. Mago Natu apenas pensou: “Conde Rasku é mesmo incorrigível, e a Senhorita Pan Thera, Marquesa de Sonsa, nem faz ideia de que vai entrar numa enrascada. Era o que faltava: o belo e a fera! ”Fez um muxoxo descontraído, tomando assento ao lado de sua irmã, a Professora Plínia, que, disfarçadamente, secava algumas lágrimas, tão emocionada ficara pela inebriante beleza daquela comemoração. — Reparaste no Conde Rasku e na Marquesa de Sonsa? – perguntou à irmã, também percebendo que entre os dois havia mais que a afeição desinteressada ou simples sentimento amoroso. — Sim, visível que o Conde Rasku está interessado em algo mais... posso lhe adiantar, mas guarde em segredo... Ele já está sabendo que o bridão de fios de ouro da Mula Tá, aquela peça encantada pela Sacerdotisa das Sombras para o Rei Albe, o Rico, está com a Marquesa de Sonsa... Veremos em que bicho vai dar! — Por que não entregaste a tiara de Gônia? – perguntou Professora Plínia ao irmão, para disfarçar a comoção. — Porque resolvemos colocar um ponto final nesta história e presenteá-la de uma vez à Rainha Trapa, a mãe do “Y ” – confidenciou-lhe aos ouvidos. 236H. H. Entringer Pereira — Depois das artimanhas do Bruxo Neno e das trapalhadas por causa daquela joia, o melhor é livrarmos a Imperatriz dos riscos de ser atingida por semelhantes trapaças. — Daqui a pouco, vou entregá-la... Aguardemos o resultado! – disse, enigmático. — Mas quem está mesmo querendo usar a tiara é a Rainha Sissu. Foi por ela que... quando a Rainha Trapa ceava... — É – interrompeu a frase – mas quem planejou tudo foi o Bruxo Neno. Aproveitou-se do grande desejo da mãe do “Y” de ver sua irmã, Rainha Sissu, engravidar e também porque ela própria cobiçava aquela joia encantadora. Em meio à festa e à alegria geral, Mago Natu se levantou. Solicitou polidamente que fizessem silêncio. Precisava entregar um valioso objeto encantado a uma pessoa. Surpreendendo a todos, conclamou: — Bruxo Neno, por obséquio, venha cá! Senhora Rainha Trapa, aproxime-se também, até aqui. Rainha Trapa imediatamente levantou-se, ajeitando os babados e as dobras das mangas bufantes de seu esdrúxulo traje, de ninguém escondendo seu espalhafatoso temperamento para festejar o recebimento daquela panóplia. Bruxo Neno, ao contrário, esquivando-se entre os arranjos de bambus, relutava a atender ao chamado do Mago Natu. — Bruxo Neno, por gentileza. Ninguém mais indicado que vós para fazerdes a entrega solene deste objeto que, usando de vossos apropriados conhecimentos nas artes mágicas da feitiçaria, subjugastes aos vossos caprichos, convertendo-o num amuleto de poderes imperscrutáveis. Ouvindo tão lisonjeira convocação, mas sem compreender exatamente seu irônico significado, consultou-se com o Rei Mor, perguntando: — O que é impres.... impescruit... impercut... — Imperscrutável – disse-lhe Rei Mor, socorrendo-o. — Isso. É bom ou é ruim? — Depende de quem perscruta. Bruxo Neno, é só uma palavra... vá lá e mostre logo seu feitiço imperscrutável. Apresentando-se diante de Mago Natu, temeroso de que ele pudesse ter desfeito o encantamento da reluzente peça de camafeus com rubis da Tia Ara, indagou na intenção de gracejar: — Chamaste-me aqui só para pôr aquela coisa na tua cabeça, Magnânimo? – perguntou, apontando para a tiara, que estava dentro de uma caixa almofadada de seda preta sobre uma mesa próxima das águas correntes do rio Aguaporé. Uns riram, outros discretamente censuraram-lhe a insolência de escarnecer do Mago Natu, depois de ter causado tantos malefícios. Sem se abater nem fraquejar diante da provocação, Mago Natu rebateu: — Seria a mais completa estultícia não vos reconhecer os méritos e a excelência para encantar entes da terra em seres das águas. Ainda não fizestes tudo. Conclui o que começastes. A Imperatriz Gônia e o Imperador Médium vos concedem a 237H. H. Entringer Pereira grande honra de pôr aquela coisa sobre a cabeça da Rainha Trapa, de quem vos transforma em guia e, assim, tornar esta joia à mãe do “Y”. Houve aplausos, exclamações, interjeições, entre manifestações de surpresa, inveja, ciúme. Tomada de indizível euforia, Rainha Trapa de pronto curvou-se, postando-se ao lado do Bruxo Neno, que se dirigiu à mesa para pegar a enfeitiçada tiara. Ao tocar na deslumbrante e encantadora joia de camafeus e rubis, num gesto cerimonioso, elevou a tiara sobre a cabeça da Rainha Trapa, que tremia emocionada. Ao contato com a cabeça da rainha, uma forte descarga elétrica percorreu o corpo do Bruxo Neno, estremecendo-o e descarregando-se pelas suas mãos na tiara, eletrizando-a fulminantemente. O Bruxo soltou-a de imediato, transferindo para o corpo da rainha os inacreditáveis efeitos da energia magnetizante. O objeto faiscante e encantado ajustou-se à cabeça da Rainha, produzindo brutal impacto, jogando-a imediatamente ao chão. Sacudindo-se em convulsões frenéticas, diante dos olhares estupefatos da grande plateia, seu corpo eletrizado, saracoteando na areia, atirou-se dentro d’água. Tão miraculosamente quanto os outros cinco casos, em poucos segundos, a Rainha Trapa passa a ser uma grande e eletrizada criatura escorregadia, nadando vagarosamente, agitando suas longas nadadeiras sob o alongado corpo, como os babados e as dobras das mangas de seu esdrúxulo vestido acinzentado com manchas amareladas. Atônitos, os espectadores, observando a enorme criatura virada num peixe-elétrico, perguntavam: — Foi pôr aquela coisa na cabeça para quê? O Príncipe “Y”, tanto menos desesperado pela desventura que atingira sua mãe transformada no Poraquê, quanto mais desejoso de se apropriar da tiara, correu a pegar a joia de camafeus e rubis que reluzia na areia. Ao estender cobiçosamente a mão, diante de seus olhos, o objeto encantado afundou-se na areia. Atordoado, fascinado pela beleza da raridade, mais do que afoito, enfiou as duas mãos nas finas areias brancas na tentativa de agarrar a joia antes que afundasse, pois que não poderia desfazer-se assim, feito uma miragem. Ao encontrar e tocar concretamente algo sob as areias, sentiu encher-lhe as mãos uma coisa sólida, retirando-a fora. Outra grande surpresa e ainda maior decepção: olhou nas suas mãos o que não era mais a tiara. Apenas um punhado de bagas, pequenas vagens semelhantes a caixinhas cilíndricas, na mesma cor que o marfim dos camafeus. Sofregamente, apertou-as entre os dedos, e das cascas quebradiças e crocantes saltaram umas bolinhas vermelhas. No interior daquelas fantásticas caixinhas de marfim estavam bem dispostas algumas amêndoas, tais como caroços parecidos com os grandes e preciosos rubis que adornavam os camafeus de marfim da joia da Tia Ara. Boquiaberto, inconformado, com as mãos cheias daquelas bagas desprezíveis, ouvia as pessoas exclamarem admiradas e irônicas: — Vejam o que virou a joia da mãe do “Y”. Surgiu, assim, naquele instante, da “joia da Tia Ara”, o amendoim. O Bruxo Neno ficou incrédulo, exasperado diante daquele imprevisível desfecho, com o sumiço da tiara na areia, agachou-se, meteu as duas mãos no mesmo lugar de onde o Príncipe Andy havia retirado apenas um punhado de bagas com as amêndoas vermelhas, 238H. H. Entringer Pereira cobiçoso na tentativa de resgatar o objeto encantado e se apropriar dele definitivamente. Escavou mais profundamente ainda na areia, nada encontrando além das mesmas vagens cheias de caroços vermelhos. Olhou pro Mago Natu que, de pé, acompanhava tudo, se divertindo frente à inusitada cena. Fuzilando-o de raiva, disse: — Foi tu que fizeste isto, né Magnético? — Não, Bruxo Neno. Foi o imperscrutável! Diga ao teu Rei Mor que, para ele engravidar a Rainha Sissu, basta comer a joia d’a mãe do “Y ”. Tome, leve e plante essas sementes. Apenas isto! Volveu as costas, enquanto o banquete de despedida do casamento continuava com música, diversão e alegria. Esquecidas a turbulência e a agitação verificadas momentos antes com o desfecho do encantamento da tiara em amendoim, ouviu-se um pedido de silêncio. Sufocando as vozes dos convidados, Conde Rasku anunciou: — Com Vossa permissão e obséquio, Senhor Imperador, Senhora Imperatriz, anuncio-vos meu noivado com a Marquesa de Sonça, daqui a sete luas cheias. Estais convidados também para a festa de nosso casamento, mas ainda não marcamos a data... Tão logo decidirmos, Bruxo Neno, poderás nos honrar com a celebração da cerimônia? Sem titubear, Bruxo Neno quase pulou de contentamento. Aceitou de imediato, ainda que não soubesse a data. Era o que precisava. Viu ali a oportunidade de se apropriar do mágico bridão de fios de ouro, que sua mãe, a Feiticeira Zureta, por descuido e afobação passara às mãos da agora noiva do Conde Rasku, Senhorita Pan Thera, a Marquesa de Sonsa. — Dependo apenas de que o nobre Conde Rasku me diga em que lugar e quando será a festa. No vosso condado ou no Solar da Senhorita Pan Thera? — No Palácio das Esmeraldas, Bruxo Neno. Como convém a um nobre da minha estirpe. Daqui a algumas luas cheias... Faça seus cálculos astrológicos, quando encontrar a conjunção astral perfeita para um casamento bem-sucedido, avise-me. O restante, deixe por minha conta. — Fechado, Senhor Conde! Mago Natu olhou seriamente na direção do Imperador Médium e da Imperatriz Gônia. Saíram do local acompanhados pelo Grande Rei, que já pedira licença para se retirar. Despedira-se de todos, augurando-lhes ordem e progresso, prevenindo-os de que ao amanhecer zarparia com suas naus Patientia, Humilitas e Sapientia, de volta ao Reino da Perfeição com sua nobilíssima Corte e seu muito especial convidado e amigo: Mago Natu.
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Festa de Nossa Senhora de Santana
12/07/202512/07/2025
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Comunidade do PA Quilombo no Lago do Manso em Chapada dos Guimarães MT Brasil. Uma iniciativa que soma .
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Oficina de Sistema de Informação Geográfica (SIG) –
27/03/202527/03/2025
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A OCA Terravila Glocal tem a honra de informar, que vem aí a primeira Oficina de Sistema de Informação Geográfica (SIG) – Brigada Voluntária PA Quilombo 📅 Data: 01 e 02 de abril de 2025 📍 Local: Residência do Amorim - Comunidade PA Quilombo, Chapada dos Guimarães/MT 📌 Endereço: Rua Quilombo, Lote 36 - Zona Rural, Sítio Real Verde – CEP 78195-000 🛰 A comunidade está convidada a participar da Oficina de Sistema de Informações Geográficas (SIG), um componente do projeto Rede Floresta. Por meio do mapeamento participativo, monitoramento comunitário e vigilância remota, a oficina oferecerá treinamento teórico-prático para capacitar os participantes no uso de imagens de satélite e ferramentas SIG. 🌱 Junte-se a nós e aprenda como utilizar tecnologias para proteger nossas florestas, prevenir incêndios e promover o uso sustentável do solo e dos recursos naturais! 📌 Evento gratuito. Inscrições através do link: https://www.sympla.com.br/evento/oficina-de-sistema-de-informacao-georreferenciada-sig-brigada-voluntaria-gleba-quilombo/2879319?referrer=statics.teams.cdn.office.net&share_id=whatsapp
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ReRe conVERSA inLOCO c/ OCA TERRAVILA GLOCAL
30/11/202430/11/2024
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O Projeto OCA Terravila Glocal está recebendo a visita de Vinicius Braz e Vania Trindade, para falar da web3 e suas vantagens para a Agricultura Familiar. Os visitantes estarão dando uma prévia do que vem ser a CARAVANA 2025, pelos interiores mais distintos do Brasil
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OCA::ReRe CONversa IN LOCO no LAGO DO MANSO - MT
15/11/202415/11/2024
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OCA::ReRe CONversa IN LOCO no LAGO DO MANSO - Chapada dos Guimarães-MT No dia 06 de dezembro de 2024, o Projeto OCA TERRAVILA GLOCAL recebe a presença de Vinicius Braz e Vânia Trindade (Rio de Janeiro-RJ) em sua sede (PA Quilombo/Lago do Manso), para dialogar com a comunidade, sobre a importância da web3 nas comunidades mais remotas e que utilizam os métodos tradicionais em seus cultivos na agricultura familiar.
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